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TENSÃO SOCIAL
Entidades reprovam ortodoxia econômica do governo, que privilegiaria "poderes tradicionais" em vez dos pobres
Pastorais planejam intensificar protestos
GABRIELA ATHIAS
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Pastorais sociais ligadas à CNBB
(Conferência Nacional dos Bispos
do Brasil) e lideranças de movimentos querem intensificar os
protestos de rua no país, como
forma de chamar a atenção do Palácio do Planalto para o que consideram falta de atenção do governo para com área social. O presidente da CNBB, o moderado dom
Geraldo Majella Agnelo, defende
a idéia, desde que as manifestações sejam ordeiras.
O nó, para as pastorais, está na
orientação ortodoxa do governo
Luiz Inácio Lula da Silva na área
econômica, que tem como subproduto o aumento de problemas
como o desemprego, e a inação
até agora no setor social.
Além disso, as pastorais e os
movimentos esperavam uma atitude mais ""à esquerda" de Lula.
Essa é a opinião de vários integrantes da chamada ala progressista da Igreja Católica.
"O governo está sinalizando
mais para o lado dos poderes tradicionais do que para o lado dos
pobres", diz dom Franco Masserdotti, bispo de Balsas (MA). "A
pauta do governo está fora de foco", completa dom Demétrio Valentini, bispo de Jales (SP).
Fora de foco, para ele, quer dizer
que o governo está privilegiando
as elites e ainda não definiu um
modelo econômico capaz de reduzir desigualdades sociais. Para
d. Demétrio, a reforma da Previdência proposta pelo Executivo e
aprovada em primeiro turno pela
Câmara reforça essa idéia.
Durante a década de 90, d. Demétrio foi o bispo que coordenou
as pastorais, quando elas começaram a fazer interface com os movimentos sociais.
O poder de mobilização das
pastorais -associado ao dos movimentos sociais- pode ser medido pelas 10 milhões de pessoas
que votaram em todo o país em
um plebiscito organizado por eles
sobre a Alca (Área de Livre Comércio das Américas).
O padre Alfredo José Gonçalves
acompanha o setor de um ponto
privilegiado. Ele é o assessor da
CNBB responsável por todas as
pastorais. Fala diariamente ao telefone e troca e-mails com militantes de todo o país.
Gonçalves diz que só há pouco
mais de dois meses as lideranças
populares entenderam que apenas a chegada de Lula ao Planalto
não mudará a estrutura socioeconômica do país: "As dívidas do
país comprometem o Orçamento
e deixam uma margem pequena
para investir no social".
Além das restrições orçamentárias, Gonçalves afirma que o entendimento das pastorais é o de
que o governo não está priorizando os pobres porque sua base de
sustentação política no Congresso
é composta por parlamentares rotulados de conservadores.
"É hora de forçar o governo a
ser coerente com seu programa e
ouvir mais os setores populares
do que os banqueiros e o FMI
[Fundo Monetário Internacional]", afirma Gonçalves, ecoando
o pensamento das pastorais.
Presidente da CPT (Comissão
Pastoral da Terra), dom Tomás
Balduíno, participa tanto de reuniões do MST (Movimento dos
Trabalhadores Rurais Sem Terra)
quanto do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social do
governo, no qual divide assento
com megaempresários.
"Há uma decepção das pastorais e dos movimentos sociais em
relação ao ritmo do governo e à
forma como estão sendo feitas
mudanças", diz d. Tomás.
Marcha das Margaridas
A força dos movimentos, que
estão cada vez mais fazendo ações
conjuntas, vai começar a ser colocada à prova neste mês. No dia 26,
a Contag (Confederação Nacional
dos Trabalhadores na Agricultura) realiza a segunda Marcha das
Margaridas em Brasília.
A organização espera trazer à
capital federal 50 mil mulheres
que trabalham no campo. Até o
Conselho Pastoral dos Pescadores
vai convocar 2.000 mulheres de
Pernambuco para participar do
evento. Movimentos feministas
urbanos também se engajaram. A
última edição da marcha, em
2000, teve 20 mil trabalhadoras.
A integração é cada vez maior.
Antônia Carrara, da secretaria nacional da Pastoral Operária, passou a tarde de sexta-feira acompanhando os sem-teto que desocuparam o terreno da Volkswagen
em São Bernardo do Campo (SP).
Maria das Graças Xavier, da
União dos Movimentos de Moradia, o maior do país, informou
que as próximas ações em São
Paulo -sejam invasões de prédios públicos, passeatas ou acampamentos urbanos- contarão
com apoio de outros movimentos, como o MST.
Ari José Alberti, da coordenação do Grito dos Excluídos, que
ocorre anualmente em 7 de setembro, disse que, após a eleição
de Lula, chegou a duvidar de que
o evento fosse continuar a mobilizar os movimentos sociais. Afinal
de contas, em tese, o candidato
""deles" chegara lá.
No meio de junho, os pedidos
de material de divulgação feitos
pelos movimentos aumentaram
muito em relação ao ano passado.
Em 2002, foram distribuídos 30
mil cartazes e 90 mil jornais. Neste
ano, já saíram da gráfica 40 mil
cartazes e 150 mil exemplares da
primeira edição do jornal, a que
faz a convocação para o evento.
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