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Lula diz temer avião e admite crise aérea depois de 10 meses
Em cerimônia no Planalto, Nelson Jobim assume Defesa no lugar de Waldir Pires
Afirmações do presidente são feitas semanas após alguns de seus principais auxiliares, como Guido Mantega, negarem caos
PEDRO DIAS LEITE
EDUARDO SCOLESE
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Depois de dez meses de caos
aéreo e ao menos 353 mortos
em duas tragédias, o presidente
Luiz Inácio Lula da Silva trocou
ontem o ministro da Defesa,
admitiu abertamente que há
uma crise aérea no país e reafirmou que tem medo de avião.
"Toda vez que fecha a porta, entrego minha sorte a Deus", disse, no Palácio do Planalto, ao
empossar o novo ministro. Lula
demitiu Waldir Pires e colocou
em seu lugar o ex-presidente do
Supremo Tribunal Federal
Nelson Jobim (PMDB), como a
Folha antecipou.
"Não é segredo para nenhum
brasileiro que nós temos uma
crise no setor aéreo brasileiro,
uma combinação de várias coisas que vêm acontecendo ao
longo dos últimos dez meses",
disse o presidente, poucas semanas depois de o ministro
Guido Mantega (Fazenda) negar que houvesse caos aéreo.
Nesses dez meses que levou
para reconhecer a crise e fazer a
primeira mudança na cúpula
do setor, Lula sempre resistia
em admitir o caos aéreo. Na entrevista coletiva de maio, chamou a crise de "problemão" e
deu uma justificativa evasiva:
"Não vamos confundir o acidente do avião da Gol com o Legacy com um problema dos aeroportos, até porque eles se
chocaram no ar".
Ontem, Lula afirmou que
agora o governo dará todas as
condições para que não aconteça mais nenhuma tragédia aérea, mas foi cauteloso: "Deus
queira que não seja no Brasil
que aconteçam outros acidentes, mas podem acontecer".
"Não sei se aqui neste plenário [no Palácio do Planalto] tem
alguém que não tenha medo de
avião. Eu, particularmente, toda vez que o avião fecha a porta,
entrego a minha sorte a Deus,
porque estou na mão de um comandante, que é um ser humano, na mão de uma máquina ultramoderna, mas que é uma
máquina, na mão de um controlador que diz quando devo
parar ou não, e estou nas mãos
das intempéries, que nem sempre o ser humano consegue
controlar", disse. "Sou um medroso de andar de avião."
Autonomia
Ao menos 30 dos 37 ministros compareceram à posse de
Jobim, assim como os comandantes Aeronáutica, Marinha e
Exército. As maiores ausências
foram as dos dois principais
personagens da crise aérea: o
presidente da Anac (Agência
Nacional da Aviação Civil), Milton Zuanazzi, e o da Infraero,
brigadeiro José Carlos Pereira.
Lula prometeu a Jobim autonomia total para mudanças no
Ministério da Defesa e em todas as áreas ligadas ao setor aéreo, poder que nenhum de seus
antecessores teve.
"É esse ministério que você
vai assumir, com todas as forças para fazer todas as mudanças que precisar fazer, onde
precisar fazer", disse Lula, que
prometeu também verbas.
No discurso de posse, Lula
disse que "é preciso repensar o
Ministério da Defesa, porque
está aquém daquilo que é a exigência da sociedade brasileira".
Na entrevista que concedeu
depois da posse, Jobim tentou
passar a impressão sucedia um
ministro "fraco" e que, agora,
assumiu alguém que "manda".
Nesse quase um ano de crise,
tornaram-se comuns cenas de
filas imensas nos saguões dos
aeroportos, passageiros desesperados à espera de vôos e informações e, por duas vezes,
parentes inconsoláveis com as
mortes de pessoas queridas.
Enquanto isso, o governo
acumulava desgastes. A ministra Marta Suplicy (Turismo)
recomendou aos passageiros o
já clássico "relaxa e goza"; o assessor especial da Presidência
Marco Aurélio Garcia fez por
três vezes o gesto de bater uma
mão espalmada na outra, fechada - no movimento conhecido como "top, top, top" -
quando soube que havia um defeito no avião da TAM. Para
completar, a Aeronáutica condecorou, depois do segundo
acidente, os diretores e o presidente da Anac.
Agora, pela primeira vez, o
presidente Lula faz uma mudança no setor aéreo. Enquanto Lula discursava, Pires ficou
de expressão fechada, sem sorrir. Desde a semana passada
sua saída era tida como certa,
mas ele não entregava o cargo.
Com a troca, o PT passa a ter
15 dos 37 cargos de primeiro escalão, contra cinco do PMDB.
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