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CASO CC5
Vendedor de Araraquara perdeu documentos em SP e hoje aparece como remetente de dinheiro para o exterior
Antônio Gaudério-13.fev.04/Folha Imagem
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O vendedor de chaveiros Sebastião Gomes, que caiu na lista após ter os documentos roubados |
Terra da laranja alimenta fraude de R$ 4,7 mi
DA REPORTAGEM LOCAL
Conhecida como a terra da laranja por concentrar uma das
maiores áreas plantadas no país,
Araraquara (a 273 km de SP) tem
um "laranja vitaminado" nas
fraudes do Banestado, que perdeu
os documentos numa rua de São
Paulo e acabou vivendo um pesadelo que se arrasta até hoje.
"A minha identidade é minha e
de outros", resume o vendedor
Sebastião Maurício Gomes Moraes, 57, que nos registros do Banco Central aparece como remetente de R$ 4,7 milhões para uma
conta CC5 em Foz do Iguaçu. Dali, o dinheiro foi parar em contas
de uma casa de cambio de Ciudad
del Este, no Paraguai.
Moraes e sua mulher têm uma
renda mensal média de R$ 1.500,
vivem numa casa alugada há oito
anos, por R$ 300 mensais, têm
uma dívida bancária de cerca de
R$ 12 mil e um Escort ano 95.
Em 1993, Moraes perdeu os documentos numa padaria na rua
Voluntários da Pátria. Três anos
depois, alguém abriu uma conta
bancária em seu nome numa
agência do Banco BCN na Vila
Mariana, em São Paulo.
A foto da carteira de identidade
era de outra pessoa. A partir daí,
começaram as movimentações
milionárias. Mas disso ele só veio
a saber cinco anos mais tarde,
quando recebeu a visita de um auditor da Receita Federal em sua
casa, em Araraquara.
Foi então que o vendedor descobriu que seu nome estava relacionado a um grande esquema de
lavagem de dinheiro no Sul do
país. "Ainda não parei para avaliar o tamanho do problema",
conta Moraes, que não consegue
tirar talão de cheques ou cartão de
crédito. "Alguém tem que pagar
por isso", lamenta.
Mas nem todos os laranjas foram escolhidos ao acaso, como
Moraes, que perdeu os documentos em São Paulo. Muitos foram
indicados por outras pessoas,
principalmente familiares, e outros venderam seus dados por em
média R$ 200 ou R$ 400.
É o caso da costureira Elvira
Werle, 66. Segundo a Procuradoria, seus documentos foram fornecidos para a "cooperativa" pelo
filhos Valdir e Valderi Werle. O
primeiro trabalhava na casa de
câmbio Elcatur, em Foz. O outro,
no Banestado.
"Sou analfabeta e não entendo
nada disso", afirmou Elvira, que
disse ter ficado assustada após ser
procurada pela Receita Federal.
Elvira diz que a única conta aberta
com a ajuda dos filhos foi uma
poupança de "uns R$ 1.500 para
doença". Ela isenta os filhos de
qualquer responsabilidade.
Valdir, 45, não gosta de falar sobre o assunto. Diz ter medo. "Foz
e Ciudad del Este é praticamente
uma cidade só. Aqui já aconteceu
de tudo. Não quero falar." Questionado sobre os R$ 19 milhões
enviados para fora do país em seu
nome, chorou e respondeu que,
dos R$ 1.200 que recebe por mês
como vendedor, mais da metade
gasta em advogados.
Os dados de Valdir foram utilizados por três casas de câmbio diferentes para a transferência de
dinheiro para o exterior.
A dona-de-casa Raucilda Bardemarker, 46, diz ter sido enganada por seu irmão, Rolf, que tinha
uma casa de câmbio. De acordo
com dados da Receita, ela movimentou cerca de R$ 79,5 milhões
para a Ciudad del Este.
Entre os laranjas que venderam
os documentos está a manicure
Ilda de Jesus, 40, ouvida pelo grupo que investiga o envio de dinheiro para o exterior.
Ilda vive em Foz e afirma ter recebido R$ 300 por seus documentos. A compradora foi uma de
suas clientes paraguaias, Amélia
Neves. Pela conta de Ilda transitaram cerca de R$ 42 milhões. A
quantia foi depositada em nome
da própria manicure em Nova
York e no Paraguai. Ela diz nunca
ter visto o dinheiro.
Segundo a Procuradoria da República, todos os laranjas estão
sendo investigados em seus respectivos domicílios fiscais e deverão responder por crime de falsidade ideológica, já que emprestaram ou venderam seus dados para a abertura de contas.
A força-tarefa que investiga o
envio de dinheiro para o exterior
é formada por seis procuradores,
quatro delegados da Polícia Federal e por agentes da Receita Federal e do Banco Central.
(RUBENS VALENTE E LILIAN CHRISTOFOLETTI)
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