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Nina Horta

Sem avós, não haveria grandes chefs

Como neto de coreana vivendo nos EUA, forjou um novo paladar e abriu aclamado restaurante

É muito difícil achar um bom livro de cozinha. Bom de se ler, com receitas novas, texto interessante e ideias que realmente te inspirem. Tinha um na Amazon me perseguindo há meses. Tento não comprar, afinal era um título que não prometia muito. "Smoke and Pickles", de Edward Lee. Receitas e histórias de uma cozinha nova do sul dos Estados Unidos.

Claro que, num sábado desassuntado, apertei o "one click" e pumba, o livro apareceu no iPad. E que grata surpresa.

Começa com a avó. Se os grandes chefs não tivessem avó, não haveria grandes chefs. Tudo tem início no Brooklyn, numa família coreana, cozinha apertada e singela e a avó fabricando comidas coreanas com uma faca Ginsu falsa. Recusava-se a fazer comida americana.

Ou o menino papava o que ela fazia ou passava a manteiga de amendoim e gelatina. E, através dos dois sabores, ele foi forjando um novo paladar. Reinventou-se.

O autor louva os Estados Unidos por essa oportunidade que teve. Comia na casa dos colegas e era, ora porto-riquenho, ora judeu ou mexicano. Foi ficando interessadíssimo em comida, achando que o máximo do status e da felicidade era um bom restaurante. Estudou bastante. Fez estágios importantes.

Um dia, lhe deu na telha ir assistir ao Derby de Kentucky. Nunca mais saiu de lá. Sua comida simples e deliciosa tem raízes na Coreia e na comida dos negros escravos do sul dos Estados Unidos.

Juntou à sua lista de ingredientes o tabaco, o Bourbon, o presunto da terra e abriu o hoje afamado 610 Magnolia. No cardápio, o arroz da infância não podia faltar. Ar- roz grudento que é a base das re- feições. E de resto, não exclui na- da. Mistura história, lembranças e bons ingredientes.

Foi se estruturando a partir desse bem-estar com a terra que o recebia sem distinções. Fechou o círculo, juntando os novos ingredientes dos quais aprendera a gostar, com a comida da avó de faca Ginsu "fake". Conseguiu enxergar com clareza a comida dela com muito alho, picante e cheia de azedos e doces. Fez sua própria história. Coreia, sul dos Estados Unidos com um traço forte de defumação. Com grelhados coreanos e churrascos sulistas. Consegue o gosto do defumado usando Bourbon, temperos defumados, cervejas pretas. Nada tão bom para cortar a intensidade do defumado como o picles bem azedo. O perfeito yin e yang.

Para nós, brasileiros, é uma achado. Couve, feijão, carne picadinha, rabada com fava, músculo de panela com molho de pêssegos e Bourbon. Faz sopa de tutano com pasteizinhos coreanos boiando por cima. Um sanduíche de fatias de bolo de carne feito com Coca e uísque, cortado em pedaços que serão fritos, mais um ovo frito por cima e molho de pimenta. Galinha frita com waffles. Torresmo, feijão-fradinho. No seu restaurante, mistura as imagens da comida de infância com a complexidade cultural da "soul food". Edamame com amendoim cozido, por exemplo.

Casou-se com uma alemã católica. Ele faz kimchi (fermentado), ela faz chucrute.

É um corajoso o tal de Edward Lee. Tem algumas receitas dele no meu blog.

ninahorta@uol.com.br

Leia o blog da colunista
ninahorta.blogfolha.uol.com.br


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