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Bichos

*SÍLVIA CORRÊA correa-silvia@uol.com.br

Xô, velhice!

Nos cães, como na gente, a idade chega e torna mais difícil segurar o xixi. É preciso paciência e carinho

A história começou há um ano. Fui me deitar e vi que havia uma enorme roda de xixi no meu lençol. A cena é evidentemente desagradável, mas quem deixa os cachorros entrarem em casa deve saber que está sujeito a isso. Suspeita generalizada, repreendi todos os que têm acesso ao quarto, troquei o lençol, limpei o colchão e dormi.

No meio da noite, entre uma virada e outra, tive a impressão de que as minhas costas estavam úmidas. Acendi a luz e lá estava, de novo, a enorme mancha de xixi.

Mas, agora, o xixi tinha dona: minha velha Dodivânia. E ela balançava o rabo, deitada sobre sua obra prima, com o pelo molhado e fedorento. Concluí que Dodi tinha sonhado e feito xixi durante o sonho.

Exausta, não tinha forças para trocar a roupa de cama àquela hora e dei uma solução mais porca: troquei de pijama, fiz uma pilha de toalhas sobre o xixi e coloquei Dodi para dormir no pequeno sofá do quarto. No dia seguinte, tudo aquilo seria lavado -inclusive a própria Dodi.

De manhãzinha, quando acordei para sair, havia xixi no sofá, o que descartava a possibilidade de ela ter urinado durante um sonho. O problema era outro. E eu teria de descobri-lo.

Coletei xixi dela e mandei para análise. Infecções urinárias podem levar a certa incontinência. Não deu nada.

Dodi é uma vira-latinha de beagle velhinha, velhinha. Ela apareceu no condomínio onde moro e se instalou na grama perto da portaria. Eu a via quando saía cedinho e quando voltava bem tarde. Foi assim por uns quatro ou cinco dias. Até que cheguei debaixo de chuva, e ela estava lá, deitadinha, no mesmo lugar. Aí não dá.

Parei o carro e chamei. A pequena saltou para dentro do porta-malas, abanando o rabo do mesmo jeito que fazia agora, sobre a poça de xixi.

Ela estava em bom estado geral, com exceção dos tumores que tomavam conta de todas as suas mamas. Coloquei cartazes pela vizinhança para tentar devolvê-la aos donos, mas ninguém apareceu.

Dodi passou por três cirurgias, alguns erros médicos e muitas complicações. Teve uma infecção que causou alterações em sua bexiga, provocando incontinência. Mas fez acupuntura por mais de um ano e melhorou. Pelo menos, tinha melhorado.

O problema é que Dodi está velhinha. A julgar por seus gastos e estragados dentes, deve ter mais de 12 anos. E na terceira idade, como acontece com a gente, a musculatura vai perdendo a força e tendo cada vez menos capacidade de segurar o xixi.

Eu me vi diante de um impasse: correr o risco de acordar diariamente sobre uma poça de xixi ou colocar Dodi para dormir no quintal? Ah, não. Teria de haver um meio termo. Há um ano, então, ela dorme de fraldas caninas, que têm até um buraquinho por onde passa o rabo. Chiquérrima, ainda usa uma calcinha vermelha para segurar a fraldinha.

Com frequência arrisco noites sem fralda. Às vezes ela vai bem, às vezes molha tudo. Esse vaivém me dá esperança de que o xixi noturno seja só uma forma de chamar a atenção. E que os sinais dos tempos demorem a chegar para a minha velhinha.

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