Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Saulo quis acordo com PCC, diz Furukawa
Ex-secretário rebate as críticas do titular da Segurança e afirma que faltou "comando" a governador Lembo durante crise
Segundo ele, na primeira noite dos ataques, cúpula da Segurança defendeu "concessões ilegítimas" aos presos transferidos
ALENCAR IZIDORO
DA REPORTAGEM LOCAL
Apesar da imagem de "durão", Saulo de Castro Abreu Filho, secretário da Segurança
Pública de São Paulo, queria fazer um "acordo" com os líderes
do PCC e defendia "concessões
ilegítimas" à facção para controlar as rebeliões e os ataques
que ocorreram no mês passado.
A afirmação é do ex-secretário da Administração Penitenciária Nagashi Furukawa, 57,
que pediu demissão no último
dia 26 e que diz ter se negado a
aceitar a proposta de Saulo.
Em entrevista concedida em
sua casa, no interior paulista,
Furukawa se defende das críticas de Saulo publicadas anteontem pela Folha e também
faz ataques ao governador
Cláudio Lembo (PFL), sob a
alegação de que ele foi alertado
da falta de investigação sobre o
PCC e não tomou providências.
"Quando há direção, quando
há comando, não existe muito
problema de divergência dos
componentes da equipe."
Lembo e Saulo não quiseram
se manifestar.
FOLHA - Saulo disse que o sr. saiu
do governo porque "despirocou"...
NAGASHI FURUKAWA - É uma avaliação tão simplória, tão superficial, além de deselegante, que
confesso que fiquei estupefato.
Não queria ser um elemento dificultador do entendimento
entre as instituições. Como
sentia que tudo aquilo que estava propondo à Secretaria da Segurança não vinha sendo cumprido, achei melhor para a população que não continuasse lá.
FOLHA - Que tipo de ação o sr. propôs e enfrentou resistência?
FURUKAWA - O motivo dessa
crise toda que São Paulo viveu
foi a transferência de cerca de
800 presos pertencentes à cúpula do PCC. Ela foi feita numa
quinta, e as rebeliões começaram na sexta. Tinha sido apresentado um extenso programa
de ação conjunta com a Secretaria da Segurança Pública. Todos os presos que foram transferidos seriam investigados e
também todos os advogados. A
transferência se deu no dia 12,
e, até a minha saída, no dia 26,
nenhuma investigação foi iniciada. Num assunto como esse
não se pode perder tempo.
FOLHA - O Saulo diz que foi criado
um "monstrengo" nos presídios.
FURUKAWA - Não é verdade. Ele,
ao dizer isso, não está criticando o Nagashi, mas o governo de
São Paulo. Nunca o secretário
disse ao governador [Geraldo]
Alckmin que o sistema prisional era um equívoco. Seria absurdo se ele achasse isso e tivesse se omitido por tanto tempo.
FOLHA - O que o sr. acha do novo
secretário da Administração Penitenciária, Antônio Ferreira Pinto?
FURUKAWA - Ele tem toda a fama de um homem correto, honesto, duro nas suas ações, e espero que tenha êxito. Só que é
preciso analisar historicamente. Ele foi secretário-adjunto de
1993 a meados de 1995, e foi
nesse período que nasceu o
PCC, foi nesse período que
aconteceram rebeliões sangrentas em São Paulo.
FURUKAWA FOLHA - O sr. conversou com Alckmin sobre a crise atual?
- Conversei. Disse
do meu desconforto, disse que,
quando ele estava à frente do
governo, jamais essas coisas teriam sido encaminhadas dessa
maneira. Ele sabia governar,
sabia ouvir o Saulo, sabia me
ouvir e sabia conduzir as decisões de um jeito melhor. Agora
nada disso aconteceu. Não houve, após essa crise toda, nenhuma reunião presidida pelo governador Lembo chamando o
Saulo e me chamando.
FOLHA - O PCC não se articulou na
gestão do Lembo.
FURUKAWA - Mas, quando havia
uma postura divergente como
essa, de precisar continuar as
investigações e elas não serem
feitas, com certeza Alckmin teria determinado que fizesse.
FOLHA - O sr. passou essa mensagem ao governador Lembo?
FURUKAWA - Falei pessoalmente com ele.
FOLHA - Antes da demissão?
FURUKAWA - Sim. Ele disse que
iria verificar, mas ação concreta eu não assisti a nenhuma.
FOLHA - Que impacto na campanha do Alckmin o sr. acredita que essa crise da segurança vai ter?
FURUKAWA - Não sei fazer essa
avaliação. Mas a grande verdade é que essa crise aconteceu
porque o governo Alckmin, lá
atrás, em 2001, não fez acordo
com a organização criminosa.
Se eu quisesse passar os sete últimos meses do governo sem
que acontecesse nada, era só eu
ter feito concessões ilegítimas.
FOLHA - Houve gente que já defendeu "concessões ilegítimas"?
FURUKAWA - Na reunião que foi
realizada na sexta-feira à noite
para sábado [quando começaram os ataques], toda a cúpula
da Secretaria da Segurança
queria que fizesse acordo com
as pessoas [do PCC] que tinham sido transferidas. Queria
que autorizasse a visita imediatamente, no dia seguinte, aos
presos que estavam lá, quando,
pelo regimento interno, o preso, quando transferido, fica dez
dias em observação e outros 20
dias sem direito a visita.
FOLHA - Essa é uma das concessões
ilegítimas que o sr. acha...
FURUKAWA - Que eu não aceitei
e que acabou não acontecendo.
FOLHA - Quem representava a Secretaria da Segurança na reunião?
FURUKAWA - Estavam o Saulo, o
secretário-adjunto, Marcelo
[Martins de Oliveira], e a cúpula das polícias. O argumento é
que era preferível recuar um
passo naquele instante para
avançar cinco depois. Pediam
também que os advogados tivessem imediato acesso às prisões. É ilegítimo porque a gente
sabe que nenhum preso que estava lá tinha qualquer ato processual a acontecer naqueles
dias que exigisse a presença
imediata dos advogados.
FOLHA - O sr. se imagina, num
eventual futuro governo do Alckmin, trabalhando ao lado do Saulo?
FURUKAWA - Quando há direção, quando há comando, não
existe muito problema de divergência dos componentes da
equipe. O comandante sabe
aparar as arestas e sabe conduzir. Quando falta esse comando
é que surgem os problemas.
FOLHA - É isso que ocorre hoje?
FURUKAWA - Exatamente.
Texto Anterior: Mortes Próximo Texto: Frases Índice
|