São Paulo, domingo, 06 de outubro de 2002

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SAÚDE

Remédios sem orientação médica podem tornar crônica a dor de cabeça; cefaléia atinge 75% dos adolescentes

Uso de analgésico é abusivo entre crianças

CLÁUDIA COLLUCCI
DA REPORTAGEM LOCAL

O uso de analgésicos para alívio da cefaléia (dor de cabeça) sem acompanhamento médico tem sido abusivo entre crianças e adolescentes. Com isso, a dor pode piorar e até tornar-se crônica. O alerta é de neurologistas de alguns dos maiores centros de tratamento de cefaléia do país.
No Brasil, um terço das crianças com até sete anos de idade apresenta pelo menos uma queixa de cefaléia por ano. Em adolescentes, a incidência salta para 75%.
No ambulatório de cefaléia infantil do Hospital das Clínicas de Ribeirão Preto (SP), que atende em média 64 crianças por mês com cefaléia crônica, a estimativa é que 40% dos pacientes tenham abusado de analgésicos (mais de duas vezes por semana) antes de buscar ajuda especializada.
Segundo o neurologista Marcos Antônio Arruda, 40, responsável pelo ambulatório, na maioria dos casos são os próprios pais que, por desconhecerem os efeitos nocivos dos analgésicos, medicam os filhos. Mas, diz ele, não são raras as situações em que a próprias crianças se automedicam.
O uso abusivo desses medicamentos pode causar uma queda na produção de endorfinas (os "analgésicos" naturais do cérebro), deixando o indivíduo mais suscetível à dor.
Com isso, afirma Arruda, a pessoa vai sentir necessidade de aumentar ainda mais a dose do remédio e, em consequência, ter também sua dor aumentada num ritmo crescente até o momento em que o remédio simplesmente perderá o seu efeito.
Foi o que aconteceu com a estudante Bárbara Furue, 13, que sofre de enxaqueca desde os 11 anos, quando menstruou pela primeira vez. No início, a mãe de Bárbara, a comerciante Vânia, dava à filha analgésicos que tinha em casa. Depois, passou a medicá-la com os remédios indicados pelo pediatra da menina.
Um ano se passou e, como a dor persistia, o pediatra aconselhou Vânia a levar a filha a um neurologista. Logo após os primeiros exames, constatou-se que Bárbara sofria de enxaqueca.
Desde então, a garota começou a tomar um remédio de uso contínuo para evitar as crises. "Melhorou muito. Antes minha cabeça doía diariamente. Agora sinto apenas uma dorzinha durante a menstruação", diz Bárbara.
A enxaqueca, que tem origem genética, ocorre em 5% das crianças em fase escolar e em 20% dos adolescentes. A dor pode ser localizada, latejante, acompanhada ou não de náuseas e, às vezes, chega a persistir por várias horas.
Para o neurologista Deusvenir de Souza Carvalho, 54, professor da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo) e responsável pelo ambulatório de cefaléia do Hospital São Paulo, além do uso abusivo de analgésico, outro problema é o diagnóstico tardio da enxaqueca, provocado, muitas vezes, por desconhecimento do pediatra.
"O médico tem que ir fundo na investigação. Uma consulta de cinco a dez minutos não consegue diagnosticar nem o tipo nem as causas da cefaléia", afirma.
Ele diz que no serviço da Unifesp o diagnóstico só é feito após o preenchimento de um questionário com 15 perguntas, entre as quais a frequência da dor, sua duração e os fatores que desencadeiam as crises.
Segundo os médicos, o passo mais importante é descobrir o que está provocando a enxaqueca e, a partir daí, evitar esses fatores, que podem ser desde a exposição ao sol até o consumo de chocolate e de bebidas com cafeína.
Marco Arruda afirma que as emoções estão entre os fatores que mais desencadeiam a cefaléia infantil. A criança pode se estressar, por exemplo, por medo dos pais ou pelo excesso de atividades.


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