São Paulo, terça-feira, 30 de janeiro de 2007

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Cervejarias descumprem veto a erotismo

Fabricantes voltam a usar mulheres em propagandas com apelo sexual, apesar de terem se comprometido a evitar prática

Associação de cervejarias vê falhas pontuais; conselho de fiscalização do setor, Conar promete fiscalizar abuso em ações de outros produtos

FABIANE LEITE
DA REPORTAGEM LOCAL

Três anos após se comprometerem a não recorrer ao apelo sexual em anúncios de bebidas alcoólicas, as cervejarias voltaram a abusar de cenas com conotação erótica nas campanhas publicitárias deste verão.
Integrantes do mercado publicitário e representantes dos produtores de álcool admitem que parte da última safra de propaganda desrespeita o acordo de auto-regulamentação.
"É preciso que haja muita responsabilidade para que a gente não perca a liberdade", alerta Dalton Pastore, presidente da Associação Brasileira de Agências de Publicidade.
O superintendente do sindicato das cervejarias, Marcos Mesquita, também reconheceu "algumas irregularidades sob o conceito ético" na nova safra de comerciais, sem citar nomes. "Todos esses equívocos ou casos de mau gosto são pontuais."
A Folha apurou que o Conar (Conselho Nacional de Auto-Regulamentação Publicitária) já recebeu denúncias contra a Antarctica (Ambev) em razão do anúncio em que a atriz Juliana Paes atua como dona do Bar da Boa. O Conar tem poder para tirar um comercial do ar.
Em um dos comerciais, Juliana ameaça "botar para fora" os clientes que batem os pés para ver os seios dela balançar- eles respondem "bota, bota", em referência aos seios.
Já a atriz Karina Bacchi e a apresentadora Adriane Galisteu viraram "namoradas" do "baixinho" da Kaiser, da fábrica mexicana Femsa. Em um dos filmes, garotas tiram as roupas umas das outras em uma disputa pelo garoto-propaganda até ficarem de biquíni.
A cerveja Cintra, do grupo português homônimo, é mais explícita. Lançou há uma semana comercial em que a modelo Dani Lopes, ao abaixar para pegar uma cerveja, expõe a tatuagem "tô dentro" na altura do cóccix. Há marcas ainda que têm distribuído gibis eróticos.
"Não há sutileza, as mulheres estão ali para serem consumidas. Os anúncios revelam que a mulher é algo para servir ao homem e mostram como estamos longe de uma sociedade com eqüidade de gêneros", diz Berenice Bento, doutora em sociologia e pesquisadora da Universidade de Brasília.
Para Ilana Pinsky, coordenadora do Ambulatório de Adolescentes da Uniad (Unidade de Pesquisa em Álcool e Drogas), da Unifesp, as propagandas utilizam linguagem simplista, associações diretas entre beber e conquistar mulheres, parte de uma estratégia muito mais pesada de marketing. "Talvez ficaram mais apelativas em razão da entrada da Femsa no mercado."
O presidente do Conar, Gilberto Leifert, diz que o órgão passará a monitorar todas as propagandas -não só as de cerveja- para verificar se está havendo falta de ética no uso de mulheres em comerciais.
O anexo sobre bebidas alcoólicas do Código Brasileiro de Auto-Regulamentação Publicitária, publicado em 2003 pelo Conar, diz que os anúncios "não se utilizarão de imagens, linguagem ou idéias que sugiram ser o consumo do produto sinal de maturidade ou que contribua para o êxito profissional, social ou sexual".
O objetivo da regra era que se promovessem marcas e não quantidade de consumo -ficou acordado que a associação entre bebida e erotismo pode levar ao consumo abusivo.
A auto-regulamentação de dezembro de 2003 ocorreu após ameaça do governo, nunca concretizada, de endurecer no controle do álcool, inclusive sobre a propaganda, com horário restrito para as cervejarias.


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