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Especialista em "bolhas" alerta para riscos em Bolsas
Para Robert Shiller, economista de Yale, preços das ações da Bovespa ainda estão baixos em relação ao resto do mundo
Professor diz estar "realmente preocupado" com o preço das ações na China, que avalia como um terreno fértil para distorção no valor dos ativos
TONI SCIARRETTA
DA REPORTAGEM LOCAL
Especialista em "bolhas", o
professor Robert Shiller, da
Universidade Yale, alerta sobre
os sinais preocupantes daquilo
que Alan Greenspan, que comandou o Federal Reserve (o
BC dos EUA) por 18 anos, chamou de "exuberância irracional" no preço das ações. No entanto o economista afirma que
os papéis não estão tão caros
quanto em 2000, época da "bolha" da internet -Shiller foi um
dos poucos a prever o estouro.
Ele diz que ainda vê preços
baixos nos papéis brasileiros.
Para ele, o "grau de investimento" pode levar a uma forte especulação imobiliária em São
Paulo. Diz ainda que a China é
um terreno fértil para o desenvolvimento de "bolhas". Cético,
afirma que os mercados nunca
aprendem totalmente com a
história. E por uma razão: concluem que ela é irrelevante.
FOLHA - As Bolsas batem recorde
atrás de recorde. Estamos vendo o
mesmo filme de 2000, antes do estouro da "bolha" da internet?
ROBERT SHILLER - Os preços das
ações nos EUA estão altos, mas
não tão exuberantes como no
final dos anos 90. Um sinal de
que as coisas não estão bem é
quando as pessoas começam a
falar que as ações estão caras ou
podem ficar muito sobrevalorizadas. E não temos isso agora.
Hoje, as pessoas parecem mais
seguras sobre o valor das ações
-talvez mais do que deveriam.
FOLHA - Quais sinais alertam para
a potencial formação de "bolha"?
SHILLER - A maior fonte de
preocupação são os preços das
casas nos EUA, que podem cair.
Empréstimos ruins no setor
podem levar a isso. A onda de
fusões e aquisições e o avanço
dos fundos de "private equities" [participação fechada em
empresas], que tiveram papel
importante na gestão de recursos, trazem uma dose de superempolgação, o que é preocupante. Há um boom nas ações
na China e na Índia. Também
há especulação nos EUA e no
Reino Unido. Quando essas
"bolhas" explodem, podem
causar uma recessão global.
FOLHA - As ações brasileiras nunca
tiveram preços tão altos em relação
ao lucro das empresas. Há uma "bolha" na Bovespa?
SHILLER - A Bovespa é uma das
mais bem-sucedidas Bolsas do
mundo. Mas os preços no Brasil
ainda estão baixos em relação
ao resto do mundo. As coisas
mudaram rapidamente no Brasil. E as pessoas concluem que
se trata de uma nova era -o que
de certa forma é. E pode alimentar uma "bolha".
FOLHA - O Brasil vende o álcool como o combustível do futuro. A receptividade internacional chegou
ao ponto de elevar os preços das terras e de faltar máquinas no campo.
Há uma "bolha" em formação?
SHILLER - O Brasil tem uma vantagem, que é ser pioneiro na
tecnologia. Mas não vejo uma
força particularmente importante na produção, que pode
ser feita em outras partes do
mundo. O Brasil pode perder
essa vantagem muito rapidamente se outro país investir pesado em tecnologia. Isso é algo
que deve ser nutrido e agora.
Mas pode ser demais, sim.
FOLHA - Os bancos chineses já figuram entre os maiores do mundo em
valor de mercado. As ações estão
com preços irreais na China?
SHILLER - Estou realmente
preocupado com o preço das
ações na China, que é um lugar
potencial para o desenvolvimento de "bolhas". Parte das
razões é que os mercados
emergentes tendem a enfatizar
mais o setor financeiro do que o
produtivo. As pessoas observam o milagre econômico e isso
estimula a imaginação. Elas
não têm uma expectativa clara
dos preços das coisas. Alan
Greenspan fez um favor para a
China alertando sobre isso.
FOLHA - O aumento do imposto
chinês na Bolsa é um bom caminho
para evitar o superaquecimento?
SHILLER - Tenho dúvida. Mais
eficientes são os aumentos dos
juros, o que a China está fazendo. O melhor é desenvolver o
mercado. E isso ela pode fazer.
Pode permitir operações curtas
[como "day trade"], negociar
índices futuros e permitir que
os chineses invistam em ações
em outras partes do mundo
-eles não têm onde investir.
FOLHA - O fluxo de dinheiro para
os emergentes veio para ficar? Moedas como o real só tendem a subir?
SHILLER - Não vejo uma reversão tão cedo [da alta do real].
Ela se deve ao boom de commodities e à impressão positiva
da economia. Mas tudo pode
mudar. No Brasil, se os juros seguem altos é porque as pessoas
continuam preocupadas com o
real. [O contrário] Seria muito
bom para ser verdade.
FOLHA - O "grau de investimento"
deve baixar os juros no Brasil? Quais
setores podem ter um superestímulo a ponto de criar uma "bolha"?
SHILLER - O FMI afirma que o
crédito barato é um dos fatores
que levam ao aumento nos preços dos imóveis. E isso começa
a acontecer no Brasil. Conforme fica mais fácil emprestar, as
pessoas podem elevar os preços
das casas. O preço das casas não
subiu no Brasil como aconteceu em outros países.
FOLHA - Como seria essa "bolha"?
SHILLER - Os preços das casas
sempre subiram mais por conta
dos custos da construção do
que da localização. Nos EUA,
isso está mudando. De acordo
com um estudo do Federal Reserve [o BC dos EUA], o preço
do terreno responde por 50%
do custo de um imóvel. Há poucos anos, era só 25%. De alguma
forma, estar próximo da cidade
é importante. No Brasil, a riqueza está toda em São Paulo. A
cidade pode ficar muito cara.
FOLHA - Os mercados aprenderam
com as crises do México e da Ásia?
SHILLER - Aprendemos lições
com o passado. Após o "crash"
de 1929, não houve um novo
boom nos mercados por um
longo período. As pessoas pararam de apostar todo o dinheiro
num mesmo ativo. Mas elas
nunca aprendem tudo. Não é
que simplesmente esqueçam a
história, mas concluem que algumas partes dela são irrelevantes. Infelizmente, não tenho uma cura para "bolhas" -elas vêm e vão por causa da
psicologia humana.
FOLHA - Sempre haverá "bolhas"?
SHILLER - Não sei. O que verificamos é que virtualmente não
existiram "bolhas" até o século
16. A primeira foi a da tulipa, na
Holanda, no século 16. E a Holanda foi o primeiro país que teve uma imprensa livre. A "bolha" é uma epidemia social que
precisa de comunicação entre
as pessoas para se propagar.
Com a internet, ficou e ficará
ainda pior. Por outro lado, a informação deixou o mundo mais
parecido e faz com que os mercados evoluam juntos, diminuindo o efeito devastador
quando as "bolhas" estouram.
FOLHA - Escândalos de corrupção
podem prejudicar as ações no Brasil?
SHILLER - Os escândalos têm o
potencial de prejudicar o mercado. Isso aconteceu na Ásia
antes da crise. Os escândalos no
Brasil não parecem preocupar
os investidores. Lula foi reeleito e os escândalos não o envolvem diretamente. O impeachment de Collor [em 1992] mostrou que o país está fazendo as
coisas certas.
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