São Paulo, quarta-feira, 19 de outubro de 2005

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OPINIÃO ECONÔMICA

"Custo Scheinkman" (Ao mestre, com carinho)

PAULO FRANCINI

Em artigo publicado neste jornal (9/10, Dinheiro, pág. B2), José Alexandre Scheinkman alega que o "custo Brasil" não seria razão para deixarmos de ter redução vigorosa das atuais alíquotas de importação. Isso porque consumidores e empresários estariam hoje apenados com a compra de produtos mais caros. O professor Scheinkman vai além, ao afirmar que "o que querem os lobistas é que, além de serem onerados pelos "custo Brasil", os consumidores e a vasta maioria dos empresários brasileiros paguem também o que poderíamos chamar de "custo Fiesp", o custo da proteção às indústrias dotadas de um lobby poderoso".
Em primeiro lugar, não considero o mestre Scheinkman integrante de nenhum lobby nocivo. Com certeza, esse tratamento gentil não foi por ele dedicado à Fiesp. Prefiro acreditar que o mestre seja movido por convicções, corretas ou incorretas, que ele crê serem as melhores para o Brasil. A Fiesp, entidade que representa a indústria paulista, não abdica a defesa do que acredita ser o melhor para o país. Não ter igual opinião sobre redução de alíquotas de importação não é, portanto, história de bandidos e mocinhos. O mestre pertence ao mundo acadêmico e sabe bem que, sobre o assunto, nem mesmo a posição dos doutos é homogênea.
O professor não nega o "custo Brasil", mas afirma que ele não pode ser pretexto para manter as atuais alíquotas de importação. Encontra-se subjacente o seguinte: consumidores pagam o "custo Brasil" embutido no preço de produtos industriais, então vamos beneficiá-los com importados que não precisam pagá-lo. Como nossa indústria pode competir nessas condições? Ora, que seja mais competitiva do que a de outros países e, assim, compense esse ônus! Caso não logre êxito, terá de "colocar a viola no saco", deixando de produzir, gerar renda, emprego e novos consumidores.
A Fiesp convida o professor, em sua próxima visita ao Brasil, a conhecer nossa indústria. Quem já a conhece sabe que, dentro dos limites da empresa, a eficiência da produção é comparável à de outras do mundo. No lado de fora, nota-se a presença ameaçadora de juros reais de 14% ao ano, da carga tributária de 37%, da valorização do real de 28% em 17 meses, da inflexível regulamentação trabalhista, da carência em logística e infra-estrutura, da complexidade da legislação e da morosidade da Justiça. Percebe-se ainda que o nível de escolaridade não é ponto forte dos trabalhadores. Além disso, o seguro-saúde e o transporte, muitas vezes, são bancados pelas empresas, incidindo nos seus custos, pois os sistemas públicos não funcionam.
A redução generalizada das alíquotas inviabilizará alguns setores industriais competitivos. Insistir nessa tese significa incorrer no que pode ser batizado de "custo Scheinkman". São custos de pensamentos antiprodução que contribuíram para que o crescimento da indústria tenha sido de 18% entre 1990 e 2004, enquanto os países emergentes tiveram 65%. Ah, claro, sempre restará ao professor o consolo de que os que continuarem empregados e, portanto, consumidores estarão mais felizes.
O mestre cita exemplo apressado em seu artigo: compara Brasil e Coréia do Sul quanto ao investimento em máquinas importadas, em 1999, deixando de comparar o crescimento econômico no ano: 0,79% para Brasil e 9,5% da Coréia do Sul. O mestre domina a dinâmica dos investimentos e, portanto, deveria surpreender-se por termos investido tanto em ano de tão baixo crescimento.
Ao final, o mestre nos reserva uma crença surpreendente: acredita que os industriais de outros países, beneficiados pela redução tarifária brasileira, pressionariam seus governos por maior entrada de nossa produção agrícola em seus países. Mestre, isso parece pouco realista.
A Fiesp defende isonomia das condições de concorrência entre a indústria nacional e a de outros países. Não negamos os benefícios de uma abertura comercial mais ampla, mas esse é um processo que deve caminhar com a redução do "custo Brasil".
Ao mestre, com carinho.


Paulo Francini, 64, é diretor do Departamento de Pesquisas e Estudos Econômicos da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo).

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