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'Eu fiz'

Brasileiro investigado na Itália confessa ter participado de rede de manipulação de resultados e conta, com detalhes, como esquema funcionava

RAFAEL REIS
DE SÃO PAULO

"Foi coisa de gente de cabeça fraca mesmo. Sei que todo mundo fala a mesma coisa quando erra. Imagino que vou ser suspenso e talvez vá ficar alguns anos sem poder jogar. Foi grave o que eu fiz."

O atacante brasileiro José Joelson Inácio, 28, do Pergocrema, da terceira divisão italiana, admite: participou do esquema de manipulação de resultados que provocou um rebuliço no futebol do país.

O jogador confessou ter agido na tentativa de fraudar os placares de duas partidas.

Os episódios, descobertos pela operação "Última Aposta", deflagrada há um ano pela polícia para investigar a máfia que frauda jogos de futebol, ocorreram no fim da temporada 2009/10 da Série B, quando Joelson estava emprestado ao Grosseto pela Reggina, dona de seus direitos.

Ele entrou no esquema antes de um jogo contra o Ancona. O atacante conta que recebeu a missão de tentar comprar por € 30 mil (R$ 75,4 mil em valor atual) o goleiro rival, o brasileiro Angelo da Costa, hoje na Sampdoria.

"O diretor esportivo do Grosseto, Andrea Iaconi, me pediu um favor. Disse que era para eu oferecer um dinheiro para que meu colega nos ajudasse a ganhar aquele jogo. Mas ele não aceitou. A

resposta dele foi seca, natural", afirma o jogador à Folha, por telefone, da Itália.

Apesar de ter confessado, Joelson foi liberado pela Justiça Comum após uma semana em prisão domiciliar, já que as investigações não encontraram dinheiro oriundo da máfia em suas contas.

"Até o pessoal da polícia disse que fui bobo. Não recebi dinheiro. Tem funcionário que aceita fazer coisas erradas só porque o chefe pede. Na minha cabeça, a responsabilidade era do Iaconi."

Joelson diz que, na rodada seguinte, deixou de intermediar para atuar ativamente na armação. A bolsa era de € 20 mil (R$ 50 mil), inferior a seu salário, segundo ele. Mesmo assim, aceitou a proposta.

"Eu e outros jogadores estávamos comprados. A gente tinha que perder da Reggina. Mas o técnico me deixou no banco. Entrei quando já estava 2 a 0 para eles e acabei fazendo um gol. Aí, no fim da partida, o juiz marcou um pênalti", diz o jogador, que ainda era vinculado à Reggina.

"Eu era o cobrador oficial e teria que errar. Mas não tive coragem. Um outro jogador, que não era do esquema, bateu e fez. O jogo ficou empatado, e eles não pagaram."

Segundo Joelson, a máfia de apostas já estava bem espalhada no elenco do clube.

"O Filippo Carobbio [meia que defende o Spezia] era o vírus maior disso tudo. No começo da semana do jogo contra o Empoli, ele nos avisou que era para empatarmos. Depois, voltou atrás e disse não precisava mais", diz.

"Não participei daquela partida, que terminou empatada mesmo. Ele sabia que isso ia acontecer, porque era placar bom para os dois. Então eu não quis armar, para que ninguém mais apostasse e para ele não ganhar mais."

Joelson diz que só participou de esquemas com a máfia no Grosseto, mas afirma que armar resultados não é incomum na Itália. "Todo torcedor sabe que os jogos entre dois times que não têm mais objetivo nenhum no final do campeonato não são reais."

O atacante nunca jogou no Brasil. Natural de Ibitinga (a 347 km de São Paulo), foi para a Itália aos 13 anos com irmão, Inácio Piá, um ano mais velho. Os dois passaram pelas categorias de base da Atalanta, pouco jogaram na elite e construíram a carreira nas divisões inferiores.

Ele ainda irá depor no Tribunal da Federação Italiana de Futebol, de onde, crê, não deve sair sem punição. "Sei que quando falarem do Joelson vão lembrar muito mais dos meus erros do que daquilo que eu fiz como jogador".

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