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TOSTÃO
Sua função é não ter função
Riquelme contraria tudo o que os apaixonados pelo tecnicismo afirmam em
relação ao "craque moderno"
PARA SE FORMAR um bom time,
como o Boca, é necessário
unir, na dose certa, a garra, a
marcação, a disciplina tática e o
equilíbrio emocional com a improvisação e o talento individual. Com
raras exceções, os craques só brilham em equipes organizadas. Já
bons conjuntos sem craques é uma
chatice, mesmo quando vencem.
Riquelme, um jogador especial,
contraria tudo o que os apaixonados
pelo tecnicismo dizem do "craque
moderno". Ele não tem nada a ver
com Elano. Riquelme não é veloz,
não corre 15 quilômetros por jogo,
não marca, tem um estilo clássico e
bonito e ainda, uma cara triste. O
técnico do Boca e os companheiros
sabem que vale a pena deixá-lo livre,
só para jogar futebol. A função do Riquelme é não ter função.
Riquelme trata a bola com tanto
carinho, que ela, apaixonada e agradecida, com a humildade de um cão,
procura o craque por todo o campo
para beijar os seus pés.
Algumas vezes, uma ótima equipe
se forma em pouco tempo, com nenhuma, pouca ou muita participação do treinador. As peças se encaixam, dizem uns. Outros falam em
química entre os atletas. Diria ainda
que as características técnicas e físicas dos jogadores se completam.
Os bons técnicos são os que definem com clareza e com detalhes o
que querem dos jogadores, mesmo
se não for a melhor opção. Pior é deixar dúvidas.
Na Copa de 2002, Felipão só pôde
escalar juntos Rivaldo, Ronaldo e
Ronaldinho próximo da Copa. Por
causa das instruções claras do técnico -vi isso durante os treinos na Coréia do Sul-, Ronaldo atuava pelo
meio e Ronaldinho e Rivaldo se movimentavam por todo o ataque e trocavam de posição. Enquanto um estava pelo lado, o outro jogava pelo
meio e próximo do Ronaldo, que
nunca estava isolado, como ocorre
hoje com Vágner Love ou Fred.
Robinho vai jogar de segundo atacante, livre, por todo o ataque e mais
pela esquerda, como gosta, sem participar da marcação, do jeito que
atuou na Copa das Confederações e
nos amistosos com Dunga ou vai ser
um meia pela esquerda, marcando
perto dos volantes para, depois, chegar ao ataque, como no Real Madrid? Desconfio que nem ele sabe.
Outro jogador que precisa ser
mais bem orientado é Mineiro. Ele
se destacou no São Paulo pelo dinamismo, pela marcação por pressão e
por chegar de surpresa ao ataque.
Nos amistosos com Dunga, Mineiro
parecia um volante burocrático, óbvio, igual à maioria, que marca de
longe e toca a bola para o lado.
Para o jogador criar e improvisar,
ele precisa se sentir seguro, saber o
que vai fazer e quais são as suas obrigações. O conteúdo é indissociável
da forma.
Desumanização
Do jeito que a violência e a incompetência crescem, breve teremos em todo o Brasil clássicos com
apenas uma torcida. No de domingo em Porto Alegre, no campo do
Inter, a torcida do Grêmio só terá
2.000 ingressos. Com o tempo, os
clássicos serão sem torcida, como
já aconteceu algumas vezes por decisões da Justiça Desportiva.
O futebol vai se tornar virtual,
sem emoção, visto apenas pela televisão. Será a completa desumanização, mais um fracasso humano.
tostao.folha@uol.com.br
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