São Paulo, segunda-feira, 19 de setembro de 2005

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DANÇA/CRÍTICA

Balé Teatro Guaíra investiga a perda da memória

INÊS BOGÉA
CRÍTICA DA FOLHA

O Balé Teatro Guaíra (BTG), dirigido por Carla Reinecke, fez duas estréias na sexta-feira. Duas peças que abordam a percepção do real: "Verschwindend Kleine Welt" ("Pequeno Mundo Desaparecido", rebatizado só de "Pequeno Mundo" ), com coreografia e cenário do alemão Felix Landerer, aborda a perda da memória; e "Caixa de Cores", do brasileiro Luiz Fernando Bongiovanni, trabalha o sentido da visão, como compreensão do mundo.
No início de "Pequeno Mundo", paira sobre o centro do palco um gigantesco espelho quadrado, quebrado em pedaços. Sobre o chão, sua sombra acentua as fissuras. Sozinho, no centro do palco, um homem olha para o alto.
Na segunda cena, várias ilhas quadradas de luz dividem o piso. Surgem seis homens, todos iguais, de terno preto sem camisa, executando seqüências de movimentos, em tempos sucessivos. (Não se pode deixar de dizer: nos momentos em que todos dançam em conjunto, a fragilidade do grupo fica aparente, pela falta de unidade dos gestos -seja pela irregularidade de tempo, seja pelo desenho do corpo no espaço.)
Todos os bailarinos vêm do fundo do palco e se vão no escuro sem fim. Depois é a vez das mulheres, com direito a vários duos. O figurino de Paulinho Maia cria novas formas no espaço, com saias vermelhas e cinzas, para homens e mulheres. Em certos pontos, a sobreposição de movimentos redobra a sensação dramática de desnorteamento.
Trilha musical variada: de Fazil Say (pianista clássico turco) e Henryk Górecki a Christian Wallumroed Ensemble, Vasks e The Notwist. Ressalte-se o duo final, quando a coreografia ganha nova força, nos limites de um quadrado de luz. Aqui se vê a qualidade dos intérpretes de forma mais expressiva: um corpo passa pelo outro, acentua a música no detalhe do gesto, encontra os rastros deixados pelo movimento anterior.
"Caixa de Cores", de sua parte, tem movimentação muito rica. Bongiovanni dá visualidade à música de Vivaldi, articulando uma peça onde a linguagem dos gestos clássicos ganha outra fluidez. Tempos lentos e rápidos se contrapõem na construção coreográfica; por exemplo, no solo de um bailarino de laranja, todo acentuado, contraposto ao casal do fundo, de vermelho e amarelo, que cria amplas linhas para em seguida quebrá-las e entrar no ritmo do outro.
A trilha inclui também música de Mano Bap e de Ricardo Iazzetta e incorpora comentários verbais sobre as cores, calcanhar de Aquiles da peça. Pois se a própria narrativa coreográfica é rica de detalhes e insinuações, a simplicidade de comentários como "Me lembra o mar" ou "É vibrante" compromete seu efeito. A luz ressalta os painéis coloridos e as caixas iluminadas do cenário. E os figurinos tiram proveito das massas de cores para construir um sinuoso desenho no palco.
Tudo somado, com as estréias o BTG sinaliza caminhos concretos para a continuidade e renovação da companhia. O que é boa notícia para eles, e para todos nós.


Avaliação:    

A jornalista Inês Bogéa viajou a convite do Centro Cultural Teatro Guaíra


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