São Paulo, quarta-feira, 20 de abril de 2005

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Vai continuar a era do inverno, afirma Boff

DA SUCURSAL DO RIO

O teólogo Leonardo Boff afirmou ontem para a agência de notícias italiana Ansa que a eleição de Joseph Ratzinger significará "a continuação da era de inverno da igreja". "Seguramente este não será o papa que nós amamos devido às punições extremamente restritivas apoiadas por ele frente à igreja e frente ao mundo", disse.
Boff é um dos ideólogos da Teologia da Libertação, movimento que surgiu nas décadas de 60 e 70 na América Latina e que, inspirado no pensamento marxista, defendia a "a opção preferencial pelos pobres". Ratzinger foi um dos principais responsáveis pelas punições impostas aos líderes do movimento. Boff já fizera relato sobre seu relacionamento com Ratzinger em entrevista ao jornal "O Globo", no início do mês.
Boff disse na ocasião que, quando soube que Ratzinger seria o prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé, ele se entusiasmou por imaginar que o alemão, que ele considerava seu amigo, traria mais liberdade aos teólogos.
O brasileiro disse, no entanto, que se surpreendeu quando Ratzinger respondeu a ele que havia pendências a serem resolvidas a respeito de seus livros. Boff respondeu a um processo doutrinário que impôs a ele um "silêncio obsequioso" e deixou a Ordem Franciscana quando, além do silêncio, recebeu a notícia de que deveria também sair do Brasil.
Ontem, à Ansa, o teólogo disse achar que Ratzinger não se preocupará com a Teologia da Libertação. "Creio que Ratzinger a considera algo superado no passado e já enquadrado pelos dois documentos escritos por ele em 1984 e 1987. Acredito que não deverá reassumir o tema, mas seguramente não dará nenhum apoio."
Para Boff, será importante que as igrejas locais garantam vitalidade para além da figura tímida, não-carismática e não-mobilizadora do novo sumo pontífice.
Ele comentou a escolha pelo nome Bento 16. "Imagino que Ratzinger tenha escolhido o nome dado seu pessimismo cultural. Bento 15 enfrentou toda a Primeira Guerra Mundial, na qual houve grandes devastações. O Vaticano se empenhou enormemente nesse período para diminuir as dores, socorrer prisioneiros, mediar os países cristãos beligerantes. Nessa época, a igreja dizia que era uma vergonha para as nações cristãs estarem se destruindo", explicou.
Para Boff, talvez o novo papa tenha previsto o futuro belicoso da humanidade. "Uma das tarefas da igreja no futuro será mediar a paz, enxugar lágrimas, curar feridas e estar junto com os que sofrem", disse. No entanto ele admite que a igreja continuará seu caminho. "A igreja já sobreviveu a grandes crises, grandes perplexidades."
O teólogo defende que o novo pontificado torne a igreja uma força que apóie, reconheça e alimente os pobres. "Desejo que este papa pense menos na igreja e mais na humanidade sofredora e que o diálogo com as religiões, com as igrejas e com a ciência seja destinado a encontrar caminhos mais responsáveis e ligados à proteção da vida. Mais voltado ao coletivo, não apenas aos cristãos."


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