|
Próximo Texto | Índice
CONEXÃO PORTUGUESA
Está no mínimo mal contada a
história acerca das relações entre o governo brasileiro, o empresário Marcos Valério e a empresa Portugal Telecom. Na terça-feira, no
Conselho de Ética da Câmara, o deputado Roberto Jefferson questionou o ex-ministro da Casa Civil José
Dirceu sobre sua participação numa
suposta trama, urdida no Palácio do
Planalto, para obter do maior grupo
privado português uma contribuição
financeira para "colocar em dia" as
contas do PT e do PTB.
Dois emissários, um de cada agremiação, teriam, segundo Jefferson,
viajado a Lisboa. Dirceu, que até então tudo negara, continuou em seu
discurso pouco verossímil: disse que
desconhecia o episódio e acusou seu
adversário de estar criando uma fantasia. Logo, porém, se descobriu que
a viagem de fato ocorreu.
Foram à capital portuguesa o "tesoureiro informal" do PTB, Emerson
Palmieri, e o onipresente Valério,
gestor, como se sabe, das finanças
subterrâneas do PT. A partir daí, surgiu uma série de versões -algumas
um tanto imaginosas.
Flagrado mais uma vez, o empresário mineiro disse ter viajado em janeiro para tratar com a Portugal Telecom de negócios publicitários, já que
a empresa estaria interessada em
comprar a Telemig Celular, cuja conta pertence a uma agência da qual ele
é sócio. Palmieri o teria acompanhado como amigo, por sentir-se "estressado". Viu uma oportunidade de
relaxar em Lisboa durante dois dias.
Soube-se a seguir que Valério já havia, em outubro de 2004, desembarcado na capital portuguesa, onde se
avistou com o então ministro de
Obras Públicas, Transportes e Comunicações, António Mexia, por indicação da Portugal Telecom. No
mês passado, o semanário português "Expresso" publicou reportagem na qual Mexia diz que Valério
apresentou-se como "consultor" do
presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Foi então a vez de o Planalto negar
tudo e afirmar que jamais autorizou
o publicitário a se identificar dessa
maneira. Ontem, o próprio Mexia,
de acordo com o embaixador brasileiro em Portugal, disse não ter dito
que recebera Valério na condição de
consultor do presidente brasileiro.
Já a Portugal Telecom admitiu em
nota oficial contatos com o empresário mineiro no contexto da possível
compra da Telemig Celular, mas refutou de forma categórica e veemente que encontros tivessem ocorrido
durante a viagem de janeiro.
Quanto às negativas de Dirceu, ficaram mais frágeis com a constatação de que o ex-ministro recebeu Valério e o representante no Brasil do
Banco Espírito Santo (acionista da
Portugal Telecom) em audiência na
Casa Civil. A conversa ocorreu 13
dias antes do vôo de Valério e Palmieri. Ontem, por fim, o deputado Roberto Jefferson, que na terça-feira
mencionara um encontro entre Lula
e diretores da empresa telefônica patrocinado por Dirceu, recuou ao
prestar depoimento à CPI do Mensalão. Afirmou que o primeiro mandatário nada tem a ver com o episódio
ou com o "mensalão".
O caso, ainda envolto em névoas,
precisa ser o quanto antes esclarecido. Vai gerando crescente impaciência e tornando-se cansativa a deliberada insistência do governo -ao
qual Dirceu servia ainda há pouco-
de que absolutamente nada sabia
dos desmandos do PT, nunca ouvira
falar do sr. Valério e jamais suspeitou
de que em torno de si movimentava-se um vasto e milionário esquema de
distribuição de verbas a parlamentares, tráfico de influência, intermediação de recursos privados e captura de
estruturas e fundos públicos.
Próximo Texto: Editoriais: O MUNDO FANTÁSTICO DE LULA Índice
|