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"BORANDÁ"
Espetáculo baseado em texto de Luís Alberto de Abreu está em cartaz no teatro Paulo Eiró com entrada gratuita
Fraternal Cia. amadurece ouvindo a platéia
Arnaldo Pereira/Divulgação
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Atores da Fraternal Companhia de Arte e Malas-Artes em ensaio do espetáculo teatral "Borandá" |
SERGIO SALVIA COELHO
CRÍTICO DA FOLHA
Quando Aiman Hammoud,
logo no início do espetáculo,
cumprimenta a platéia -com
uma lotação acima da média para
um frio domingo-, são várias as
vozes que dão boa-noite de volta.
É um claro sinal que a Fraternal
Companhia de Arte e Malas-Artes
vem cumprindo o seu papel,
atraindo um público atento e fiel.
Talvez ele já preveja o que será o
espetáculo: uma saga picaresca,
releitura popular brasileira de um
tema conhecido, apoiado no texto
engraçado e poético de Luís Alberto de Abreu. Nos últimos anos,
a fórmula vem funcionando bem.
Desta vez, porém, antes de falar,
o grupo se propôs primeiro a ouvir (os migrantes do bairro, base
da platéia), para estabelecer seu
roteiro. Os depoimentos são tão
intensos -como se denota pelos
trechos publicados no programa- que modificaram inteiramente o tom do espetáculo.
Dá para pressentir o que ele seria originalmente na parte central
da peça: a saga de Galatéa, grotesca, tateando metáforas enquanto
paga um tributo excessivo a Macunaíma -tanto o de Mário de
Andrade quanto ao de Antunes
Filho-, soa inacabada, confusa, e
acaba se garantindo mais na vitalidade dos atores Edgar Campos e
Luti Angelelli.
Entende-se, portanto, a ambição que Mirtes Nogueira expressa
em cena de fazer uma personagem mais densa. Sua Maria Déia,
cuja história é contada na última
parte da peça, transcende a piada
e dá dignidade a um depoimento
urgente em um Brasil de mulheres espancadas. Apesar de ceder
às vezes ao tom de melodrama,
comove com simplicidade.
Por seu lado, a história de Tião,
que abre o espetáculo, mesmo
sem nenhum grande drama para
narrar, desarma pela singeleza.
Dá para sentir que a platéia, que
não raro interfere em voz alta, reconhece na simpatia de Ali Saleh
seu legítimo representante.
O espetáculo, assim, consegue o
mais importante, e o que acaba
parecendo deslocado são tanto as
intervenções "didáticas" (o narrador Hammoud interrompe a cena
com um sistemático "é suficiente") quanto as concessões a um
suposto "gosto popular".
O diretor Ednaldo Freire, no
texto do programa, manifesta sua
ambição de não querer expor motivos sociológicos, mas o de "conhecer um tanto de porção humana" que se esconde atrás das
frias estatísticas. No entanto, em
vários momentos, é clara a explicitação racional e política.
Essa abordagem é necessária
quando há uma denúncia a ser
feita a uma audiência que ignora
os fatos apresentados, mas empalidece quando há uma experiência humana compartilhada. A essa altura, é a escuta da platéia que
ensina ao artista o que se deve falar. Inverte-se o jogo portanto: em
transição, a Fraternal Cia. amadurece graças à grande qualidade de
seu público.
Borandá
De: Luís Alberto de Abreu
Direção: Ednaldo Freire
Com: Mirtes Nogueira, Aiman
Hammoud, Ali Saleh
Onde: teatro Paulo Eiró (av. Adolfo
Pinheiro, 765, Santo Amaro, tel. 5548-0449)
Quando: de qui. a dom., 21h; até 26/10
Quanto: entrada franca (retirar
ingressos com uma hora de
antecedência)
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