São Paulo, quarta-feira, 20 de agosto de 2008

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Exposição revê "traço livre" de Shiró

Artista nipo-brasileiro que vai completar 80 anos ganha exposição com 250 trabalhos no Instituto Tomie Ohtake

Obras foram reunidas pelo curador Paulo Herkenhoff; entre elas, há raras pinturas da fase inicial de Shiró, retratando bairros de SP


Alex Almeida/Folha Imagem
O artista nipo-brasileiro Flavio-Shiró, 79, mostra as mãos com tinta usada na realização de painel especialmente feito para sua retrospectiva no Instituto Tomie Ohtake, que é aberta hoje em SP

MARIO GIOIA
DA REPORTAGEM LOCAL

Um embate entre o figurativo e o abstrato, que pode resultar em paisagens de uma São Paulo gentil que se perdeu no tempo ou em telas de grande dimensão carregadas de tintas e gestos fortes. Esse é o tom que está presente em toda a exposição retrospectiva dos 80 anos de Flavio-Shiró, que é aberta hoje para convidados no Instituto Tomie Ohtake.
Um dos principais nomes da abstração brasileira e que hoje se divide entre seus ateliês em Paris e no Rio, Shiró, 79 -completa 80 no próximo dia 27- ganha um panorama de sua obra assinado pelo curador Paulo Herkenhoff (ex-Bienal de São Paulo e atual integrante do comitê que escolherá o próximo curador da Documenta de Kassel). Vai de sua primeira pintura, de 1942, retratando a praça da Sé vista de uma rua da Liberdade, a trabalhos feitos no ano passado, totalizando cerca de 250 obras.
"Sempre tive o traço livre, isso está em toda a minha carreira", diz o artista. "Também acho que, desde que comecei a pintar, os elementos abstratos estão presentes."
Herkenhoff concorda com a avaliação de Shiró e, ao montar a exposição, tentou enfatizar esse aspecto. Em uma das paredes que é um dos destaques da mostra, com 20 telas da fase inicial da produção do artista, o curador percebe em seu estilo já tentativas de escapar de uma pintura mais literal.
"Ao fazer "Paisagem Imaginária" e seus quadros sobre jogos de futebol, ele não leva o cavalete para tais locais. É uma pintura de ateliê que mostra sua inventividade e a liberdade com que trata tais cenas."
"Era engraçado, os artistas da comunidade [japonesa] não gostavam muito de futebol ou não faziam pinturas sobre isso.
Mas no estádio não dava para eu ficar pintando, então eu fazia tudo de memória", conta Shiró. "Os japoneses também estranhavam que eu torcia para o Corinthians, já que a maioria, se gostasse do esporte, preferia o Palmeiras, dos italianos, aliados do Japão no Eixo."
A parede com a produção inicial de Shiró também chama a atenção por retratar uma São Paulo muito diversa da atual, com imagens provincianas da Liberdade, do Cambuci e de outros bairros próximos do centro da cidade. "Em meu quadro "Fábrica" [1948], por exemplo, mostro os arredores da rua dos Lavapés cheio de galpões. O pessoal chamava aquela parte do Cambuci de "fábrica", mas hoje isso se perdeu."
O artista lembra que artistas da época sempre iam para locais afastados para pintarem, mas ele preferia lugares próximos de onde morava, na Liberdade, com seus pais, que o estimulavam a pintar. Boa parte dos quadros dessa fase pertence à coleção do artista e nunca foi reunida numa mostra.

Iberê
Para Herkenhoff, Shiró influenciou a pintura de Iberê Camargo (1914-1994), entre outros nomes, e isso nunca foi analisado com profundidade.
"A exposição de Shiró no MAM do Rio em 1959 tem muito do que Iberê vai desenvolver, que é uma carga pictórica forte, com o vigor no traço e uma visceralidade evidente", diz ele.
Além das pinturas, o curador fez uma sala para a obra gráfica de Shiró, com tom predominante de preto-e-branco, e salas com a produção recente do artista, que inclui outros objetos e fotografias.


FLAVIO-SHIRÓ, PINTOR DE TRÊS MUNDOS: 65 ANOS DE TRAJETÓRIA
Quando: abertura hoje, às 20h; de ter. a dom., das 11h às 20h; até 12/10
Onde: Instituto Tomie Ohtake (r. Coropés, 88, tel. 2245-1900); livre
Quanto: entrada franca



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