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INFANTIL
Artistas em São Paulo aproveitam a dissolução contemporânea dos gêneros para produzir técnicas inovadoras
Mescla de linguagens anima teatro de objetos
MÔNICA RODRIGUES DA COSTA
EDITORA DA FOLHINHA
Crianças paulistanas já se acostumaram a ouvir e ver contando
histórias bonecos vestidos nas
mãos, pendurados em fios, nas
pontas das varas ou sentados em
mesas iluminadas com montanhas ou outros cenários atrás deles. Figuras assim são integrantes
do repertório do teatro de animação, além das máscaras, dos objetos e de estranhas criaturas que se
movimentam na luz negra das
caixas pretas dos teatros.
Esse gênero, que conquistou sucesso de público com peças excepcionalmente boas, como
"Zôo-Ilógico" e "Pedro e o Lobo"
(no quadro ao lado), começa a se
constituir como linguagem em
espetáculos com atores.
Isso ocorre com os bonecos-personagens do musical "Os Direitos da Criança", protagonizado
por Gabriela Duarte e dirigido por
Osvaldo Gabrieli. Sobre essa peça,
Gabrieli disse que usou a fábula e
objetos animados para criar seu
sistema metafórico. Com sagacidade, combinou boneco e ator, e é
isso, segundo ele, que garante a
qualidade do espetáculo.
"A gente utiliza mais a linguagem da fábula para falar dos direitos das crianças. O sentido da fábula, por exemplo, está numa cena de crianças com defeitos físicos. Para evitar a discriminação,
em vez de atores fazendo crianças, usamos figuras grandes e pequenas, azuis e amarelas."
A mistura de colagem, arte multimídia, teatro de sombras, de luz
negra tem caracterizado a arte cênica produzida nas últimas décadas, e o teatro infantil acompanha
a tendência. Exemplos dela são
peças que estrearam em 2004, como "Rapunzel" e "Armazém do
Eugênio", em que os limites do
ator, do manipulador e do contador de histórias se atenuam.
Carlos Cesare, 38, único ator do
"Armazém", que iniciou seu trabalho no teatro com fantoches,
considera seu personagem metade ator e metade boneco. "Os
acessórios são bonecos, só que eu
os deixo com mais partes humanas, um homem vestido de foca
não é uma foca. É outro olhar sobre a fantasia. Cheguei a usar pernas postiças e houve números em
que encolhi, parecendo um boneco dentro de um teatrinho, o que é
uma cena clássica."
A fusão de linguagens ocorre
também em trabalhos de grupos
que atuam há pelo menos 20 anos
em São Paulo, como o Pia Fraus,
que tem em cartaz "Bichos do
Brasil" e "Histórias do Brasil".
Para Beto Andretta, 42, que é da
companhia, "o que interessa é a
junção boneco-bailarino, boneco-ator. Eu me interesso por procurar a terceira via de expressão,
que gera outro tipo de comunicação. O grupo Sobrevento também
se dedica a essa pesquisa. Na fusão, há muito a ser explorado".
"Zôo-Ilógico", de Claudio Saltini e Henrique Sitchin, 38, fundadores do grupo Truks, que ganhou visibilidade pública cerca de
15 anos atrás com "Truks, a Bruxinha", manipula objetos. Copos,
talheres e toalhas de um piquenique se transformam em vívidos
animais de um zôo encantado.
Sitchin diz que seu trabalho reflete sobre uma espécie de metáfora transformadora: "Dois devaneios envolvem o teatro de objetos de "Zôo...". É plausível imaginar que o homem primitivo tenha
brincado com a sombra e também não é demais imaginar que
tenham usado pedras de vários
tamanhos para descrever uma caçada antes da criação da linguagem verbal. Esses devaneios são a
base do teatro de animação".
De acordo com Claudio Saltini,
42, o sucesso de "Zôo-Ilógico" deve-se também ao histórico do trabalho tanto dele como de Sitchin.
"Abandonamos o teatro de objetos pelo qual começamos, conquistamos maturidade em "Truks,
a Bruxinha" (inspirada na personagem de Eva Furnari) e agora associamos o teatro de animação a
nosso trabalho de clowns. Creio
que isso é uma das bases do sucesso", explica.
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