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Crítica/teatro/"Literatura Contemporânea"
Bonassi faz auto-ironia com a condição de escritor
SÉRGIO SALVIA COELHO
CRÍTICO DA FOLHA
"Literatura Contemporânea" segue à
risca a fórmula de
"O Incrível Menino da Fotografia": é um monólogo no qual o
alter ego do autor, beckettianamente aprisionado em uma situação metafórica, joga com o
aqui e agora junto à platéia,
convidada a ser cúmplice já no
saguão, quando se depara com
uma instalação (um banquinho
de suicida com instruções) e ganha o texto integral da peça, para poder seguir a partitura.
O que não quer dizer que
Fernando Bonassi esteja se fechando em uma fórmula única.
Pelo contrário: pioneiro e principal nome da dramaturgia participativa, é curioso como, para
suas causas próprias, ele criou
uma fórmula tão radicalmente
presa ao literário.
Assim, em seus monólogos, o
dramaturgo-diretor pouco a
pouco deixa o experimento
aberto para conquistar um estilo próprio, o que não é nenhum
demérito, muito pelo contrário. No entanto, aqui, o impacto
se dilui. Ao contrário do menino congelado na típica foto das
escolas da ditadura, porta-voz
de uma geração mutilada, a
condição de escritor, evocada
por um homem amarrado à sua
mesa de trabalho, entre paredes brancas, por ser mais particular, tem uma auto-ironia
quase narcisista.
Afinal, ao contrário do menino em armadilha existencial, a
condição do escritor é voluntária. Complica a empatia também a escolha de César Figueiredo para encarná-lo. Apesar
de talentoso, cumprindo com
desenvoltura uma marcação
difícil, parece jovem demais para o papel e não dá a impressão
de estar dando um depoimento
nem mesmo quando, em parábase, vem até a platéia e fala em
seu próprio nome.
O distanciamento técnico é
amenizado pelo truque do jogo
da forca, que é pintado nas paredes brancas e ao qual o público é desafiado. Há uma palavra
a ser descoberta, que é chave
para o entendimento do tema, e
que pode ficar mais ou menos
explícita de acordo com a sua
performance.
Brincando inteligentemente
com uma velha e insolúvel angústia, a da autonomia do criador em uma sociedade capitalista, "Literatura Contemporânea" é um exercício divertido e
sofisticado, com luz e cenário
impecáveis, mas que, ainda assim, parece uma aplicação menor de uma fórmula instigante.
LITERATURA
CONTEMPORÂNEA
Quando: sex. a dom., às 20h; até 21/9
Onde: Unidade Provisória Sesc Avenida Paulista - espaço 13º andar (av.
Paulista, 119, tel. 3179-3700)
Classificação indicativa: não recomendado para menores de 14 anos
Quanto: R$ 5 a R$ 20
Avaliação: bom
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