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Presidenciável afirma que PFL fará parte de seu governo e que, se passar pelo primeiro turno, será eleito
Ciro admite Tasso no ministério e diz que FHC "avassalou" o país
PATRICIA ZORZAN
DA REPORTAGEM LOCAL
Pré-candidato do PPS à Presidência pela segunda vez, Ciro Gomes, 44, já admite a possibilidade
de o ex-governador Tasso Jereissati (PSDB), seu padrinho político, vir a assumir um de seus ministérios caso seja eleito.
"Sem dúvida. Sem dúvida [poderia ser ministro"", declarou Ciro à Folha, durante entrevista
concedida na noite da última
quarta-feira, em São Paulo.
Mais do que uma troca de gentilezas, o gesto reafirma a sintonia
fina entre os dois políticos, parceiros desde os anos 80 no Ceará.
Preterido pelo PSDB na escolha
do pré-candidato tucano ao Palácio do Planalto, Tasso já chegou a
declarar ter comunicado ao presidente Fernando Henrique Cardoso sobre uma aliança informal
com o PPS em seu Estado.
Além do próprio ex-governador, o presidenciável defende a
presença em seu governo de todos os que o ajudarem a chegar ao
Planalto, incluindo o PFL, partido
com o qual negocia uma troca de
apoios em pelo menos 16 Estados.
Leia a seguir os principais trechos da entrevista.
Folha - O sr. se define como um
candidato de centro-esquerda,
mas fez alianças com PTB, setores
do PFL e também trabalha para ter
parte do PMDB.
Ciro Gomes - Tem também o
PDT e o PPS. Isso é exatamente
centro-esquerda. Você tem, em
um processo político, o programa, que, no meu caso, não é uma
peça de publicidade. Temos ainda
algumas lacunas, mas o norte de
centro-esquerda está afirmado
ali. Mas é preciso, ao mesmo tempo em que se constrói a viabilidade eleitoral, construir a governabilidade do dia seguinte. Se você
vir, não tenho nenhum atrito sistêmico com nenhuma força organizada. Tenho diálogo com todos.
Folha - Mas o sr. já teve atritos
com várias das pessoas que hoje estão a seu lado.
Ciro - Com pessoas sim, porque,
não só a conjuntura brasileira foi
variando, como minha posição
mudou. Fui eleitor pró-ativo, central, do Fernando Henrique em
1994. Assumi o Ministério da Fazenda cumprindo uma missão
que me honrou muito, cumpri
meu dever, mas, naquele ato, fui
um eleitor importante pela posição de FHC. Daquela perspectiva
critiquei os antagonismos porque
acreditava mesmo que ele ia cumprir o que tínhamos combinado.
Folha - O sr. se arrepende disso?
Ciro - Não. Naquela circunstância ele era o melhor. O que não
posso é dizer que eu estava certo
ao criticar quem combateu o Fernando Henrique quando eu achava que ele seria a solução. Quem
dizia que ele não era acertou. Eu
errei. Mas é da vida pública. Isso é
normal da democracia.
Folha - Como o eleitor pode ter
certeza de que o caminho não será
desvirtuado depois da eleição, como ocorreu com FHC?
Ciro - O problema do Fernando
Henrique nunca foi o PFL. O problema foi que ele perdeu a hegemonia moral e intelectual do processo. E, no meu caso, qual a concessão fisiológica que tenho para
dar para alguém?
Folha - Mas sendo eleito terá.
Ciro - Mas qual a razão subalterna para que as pessoas estejam
comigo? Objetivamente não há.
Só estão comigo os que acreditam
que eu possa representar uma alternativa ao governo e ao PT.
Folha - Mas esperam fazer parte
do poder com o sr. sendo eleito.
Ciro - E vão fazer. Qual a segurança? Ofereço meu passado no
poder, como ministro, governador, prefeito, deputado, líder do
governo e da oposição.
Quem deve ocupar o terreno
conquistado é o exército que vencer a batalha. Mas cargo não é ferramenta de aliciamentos espúrios, mas de pôr em prática idéias,
propostas, compromissos.
Folha - Vale para o PFL?
Ciro - Todo mundo que ajudar.
Folha - Serra não se viabilizando,
pelo fato de o sr. ter sido do PSDB...
Ciro - Parte do PSDB, uma boa
parte, poderia ser um parceiro
muito interessante. Deveria ser.
Folha - Que parte?
Ciro - A parte ética, ideológica,
que eu conheço de longa data. Depois o PSDB descaracterizou-se
muito. Tem uma parte que não
merece, que não tem nada a ver
com aquilo que a gente imaginou.
Folha - Qual é?
Ciro - Não vou particularizar,
porque política não é fulanizar.
Folha - Entre os que o sr. acha que
não poderiam estar...
Ciro - Essa parte que contemporizou com a corrupção, com a fisiologia, que calou a boca diante
dos desatinos éticos, econômicos,
financeiros e sociais que se cometeu. A parte que entrou depois por
razões fisiológicas. Dessa parte
não quero saber.
Folha - Por seu discurso, pode-se
deduzir que Serra e Fernando Henrique fazem parte desse setor?
Ciro - Fernando Henrique não.
Ele é o responsável funcionalmente por tudo, que é uma desgraça do presidencialismo. Podemos arrumar atenuantes para o
seu desmantelo, mas há também
agravantes. Agora o Serra foi contra tudo isso, contra o Plano Real.
Ele sabotou, conspirou e no dia
seguinte vira ministro, usufrui do
privilégio, do poder, manipula
despudoradamente o poder. Nas
coisas todas o Serra estava ali e
agora vem com papo de oposição.
Folha - Mas o sr. já deu declarações elogiando a honestidade do
Serra. Isso mudou?
Ciro - Não tenho mais essa convicção pelas evidências todas. Um
cara que contrata uma firma de
arapongagem telefônica com dinheiro público...
Folha - Serra é seu principal adversário?
Ciro - Pela forma como está se
comportando é o inimigo público
número um do Brasil.
Folha - O ex-governador Tasso Jereissati pode ser seu ministro?
Ciro - Sem dúvida. Sem dúvida.
Tasso, ao lado do meu pai, e por
valores completamente distintos,
são as duas mais fortes influências
na minha concepção pública.
Meu pai, por razões óbvias, e o
Tasso, na sequência. E ninguém
vai apagar essa história.
Folha - Da Fazenda?
Ciro - Meu ministro da Fazenda
só nomeio depois de eleito. Posso
dizer que Tasso daria um excelente presidente da República. E
quem pode ser presidente da República pode ser qualquer coisa.
Folha - Pelos desentendimentos
entre ele e Serra há a expectativa
de que ele o apóie informalmente.
Ciro - Isso é intriga da imprensa.
Folha - A relação entre eles está
ótima, então?
Ciro - Não digo ótima, mas já
ouvi o Fernando Henrique dizer
coisas muito sérias, graves, contra
o Serra. E não é o candidato dele?
Folha - Como por exemplo?
Ciro - Quando Serra deixou o
Fernando Henrique em uma situação absolutamente desagradável, concluindo a negociação da
dívida externa. Ele tinha garantido uma revisão constitucional como premissa da renegociação.
Serra, líder do PSDB na Câmara,
sem consultar ninguém, retirou o
apoio à revisão. Fernando Henrique me ligou chocadíssimo, não
vou reproduzir as palavras.
Folha - Mas isso não pode ser episódico, já que o senhor teve confrontos com ACM [que já declarou
voto em Ciro" e Fleury?
Ciro - Pode, mas o episódio era o
Plano Real, contra o qual Serra
pôs-se contra.
Folha - Voltando às alianças, o sr.
foi o primeiro candidato a fechar a
sua, apesar de ela ter passado por
uma série de problemas.
Ciro - Primeiro, não. Único. Enquanto vocês todos faziam a sabotagem. Vou pedir indenização
por danos políticos.
Folha - Hoje o sr. tem certeza de
que PTB e PDT não o abandonarão?
Ciro - Certeza absoluta tenho de
que estou vivo agora. Política é
uma construção. Vá que eu amanhã diga uma bobagem. Amanheço maldormido e cometo
uma grosseria com um líder desse. Pode ser uma causa.
Folha - O sr. tem um adversário
dos sonhos para o segundo turno?
Ciro - Minhas chances [de ir para o segundo turno" são mais duras de serem exitosas, embora
muito fortemente possíveis, mas,
se venço essa batalha, você está falando com o próximo presidente.
Folha - Se for com Lula?
Ciro - Isso de ficar todo o mundo
dando valor definitivo às pesquisas... Não consultam nem mesmo
a experiência real dessa campanha. Há 60 dias davam Roseana e
Lula no segundo turno.
Folha - A namorada do sr. tem
aparecido como um ponto forte de
sua candidatura. Ela vai participar
da campanha?
Ciro - Ela é minha mulher, e como minha mulher, tem todas as
inerências disso. O que a minha
mulher faz? O que as mulheres
das outras pessoas fazem.
Folha - Com a diferença de que a
mulher do sr. tem a popularidade
um pouquinho mais alta...
Ciro - Isso é a minha sorte e o
meu privilégio [sorri". Mas não é
por isso que ela vai fazer isso ou
aquilo. Deveria ter um debate das
primeiras-damas, né? [risos" Estou convocando um [assistindo à
entrevista, Patrícia Pillar concorda com a cabeça e sorri".
Folha - O sr. tem reclamado do
uso da máquina a favor de Serra.
Ciro - Estamos vivendo a fisiologia desbragada, o pior momento
de fisiologia da história moderna
brasileira. Vamos ser sérios. Fernando Henrique Cardoso nomeou um secretário de Arapiraca.
Com todo o respeito, pode ser um
excelente quadro. [Mas há" claramente uma vinculação à agenda
de cabalar votos na convenção do
PMDB. Isso é uso de máquina.
Folha - Qual sua primeira medida
na Presidência?
Ciro - Só responde a essas perguntinhas quem não entende patavina ou é um mentiroso. Porque
o ato de governar não é espetaculoso. É o ato de compor uma boa
equipe e executar um bom planejamento simultâneo. Mas algumas coisas podem ser feitas no
primeiro dia, rapidamente. Determinarei um controle central do
caixa do Tesouro. A Presidência
da República controla, mas não
precisa ser o presidente. É proibido gastar. Quero saber todas as
despesas e isso precisa de uma
equipe, para não travar o fluxo.
Simultaneamente vai sair um decreto, determinando a publicação
de preços unitários e regionalizados de todos os itens de compra
ou de contratação regular pela administração pública. Deflagro
também no primeiro momento
um programa de frente de trabalho nos bairros pobres das grandes cidades, ocupadas de executar
um plano de urbanização de favelas, recuperação de moradias.
Folha - Maior mérito e maior defeito da administração FHC e uma
nota para o governo?
Ciro - Nota três e esse três acho
que é porque ele deu majestade ao
cargo, no lado bom. Embora a relação internacional do Brasil tenha se enfraquecido muito no que
interessa. O país está avassalado
diante do mundo rico e nossa economia guiada pelo FMI. Mas na
parte de representação do Brasil,
o Fernando Henrique merece elogio e é uma coisa que sempre me
agradou e nunca me omiti de fazer essa menção. O lado ruim é
que FHC tem desprezo pelo povo
brasileiro. Ele parece uma pessoa
que não tem o menor sentimento
com o descalabro que está acontecendo com o Brasil.
Folha - O país melhorou ou piorou
nesses últimos oito anos? Por quê?
Ciro - Piorou dramaticamente.
Pelos números. Muitas coisas melhoraram. A mortalidade infantil,
o nível de escolarização, queda no
analfabetismo. Ele deu ao país
também um período de paz e de
estabilidade política. Agora o Brasil tem o maior desemprego da
história, a menor taxa média de
crescimento econômico deste último meio século. O Brasil nunca
esteve ilíquido patrimonialmente
como está hoje. Antes tínhamos
dívida preocupante, mas tínhamos ativos. O Fernando Henrique
explode a dívida e aliena irresponsavelmente os ativos.
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