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NO PLANALTO
Lula 2003 vive seu primeiro ano de covarde
JOSIAS DE SOUZA
DIRETOR DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O "novo" governo completa
o primeiro ano "com muito
pouco para mostrar à população". As "altas taxas de juros desestimulam a produção e estão
levando a um ritmo de crescimento insuficiente para gerar a
riqueza e os empregos necessários ao país". Cumpriram-se "à
risca todos os mandamentos do
FMI".
"Devemos reconhecer que nossos gestores foram muito eficientes em fazer economia com a saúde, a educação, os investimentos
em infra-estrutura e tudo o que
diz respeito aos programas sociais, cuja soma de gastos ficou
muito aquém do montante de juros pagos. Basta pegar uma estrada federal nestes feriados de fim
de ano ou frequentar um hospital
público para perceber isso."
O Planalto tornou-se "prisioneiro de uma aliança conservadora, que o imobiliza e o impede
de levar adiante as transformações necessárias para o avanço
da sociedade brasileira. São seus
próprios aliados que estão interessados em manter os privilégios
seculares e deixar as coisas como
estão".
A avaliação acima foi extraída
de um artigo de jornal. Assina-o
Luiz Inácio Lula da Silva. É de 31
de dezembro de 1995. Saiu na página 3 da Folha, seção "Tendências/Debates". Referia-se ao primeiro ano de gestão de Fernando
Henrique Cardoso.
Se ao Lula de 2003 fosse concedida a graça de enxergar a si próprio com o ponto de vista do Lula
de 1995, morreria de rir de seus
admiradores. "Fiz um primeiro
ano de FHC", diria ao espelho.
"Com uma diferença: fui mais
covarde."
O diabo é que o poder é cabotino. E o Lula de 2003 não costuma
dar bom dia à autocrítica. No papel de gestor do nono ano do
mandato de FHC, o "novo" presidente tem pronunciado discursos
memoráveis. Os trechos mais importantes são as pausas. Mas, por
vezes, fala tão grosso que fica difícil escutar-lhe o silêncio.
Dias atrás, discursando na Paraíba, o Lula de 2003 disse: "Cheguei à Presidência da República
para fazer as coisas que precisavam ser feitas neste país e que
muitos presidentes, antes de
mim, foram covardes e não tiveram coragem de fazer o que precisa ser feito".
Não fosse a azáfama do dia-a-dia palaciano, o Lula de 2003 talvez desperdiçasse um naco de
tempo na releitura do Lula de
1995. Decerto se daria conta da
própria debilidade. E talvez substituísse a melodia desconexa por
uma pausa de infinitos compassos. Não resolveria o problema.
Mas pouparia irritação à choldra.
Assim como o FHC de 1995, o
Lula de 2003 produziu um primeiro ano de êxitos. Ontem como
hoje, o que conspurca a administração é uma expressão muito
utilizada no português corrente:
o famigerado "por outro lado".
Como FHC, Lula manteve a estabilidade monetária. Por outro
lado, produziu ruína e estagnação econômica.
Assim como FHC esqueceu o
que escrevera, Lula deu de ombros para o que dissera. Abandonando o discurso incendiário,
honrou contratos e adotou a responsabilidade fiscal. Por outro
lado, tonificou a dívida pública e
conservou a dependência do país
em relação ao capital estrangeiro.
Lula manteve escancaradas as
portas que FHC abrira nos organismos financeiros internacionais. Por outro lado, tornou a
submeter o interesse nacional às
metas de desempenho orçamentário ditadas de fora. Entregou
mais do que o FMI pediu.
Lula trocou a enganação do
Comunidade Solidária pela empulhação do Fome Zero. Por outro lado, manteve intocada a perversa distribuição de renda que
fossiliza na miséria a malta que o
elegeu.
A exemplo de FHC, Lula governou com maioria no Congresso.
Aprovou na Câmara a antes renegada reforma da Previdência.
Roça no Senado um arremedo de
reforma tributária. Por outro lado, entregou-se à fisiologia. Aparelhou a máquina pública. Ressuscitou Sarney. Ensaia a reacomodação do PMDB na Esplanada.
O Lula de 1995 fez pouco do feito agrário de FHC: o assentamento de "ridículas 15 mil famílias" de sem-terra. O Lula de 2003
logrou assentar risíveis 5.000 famílias.
O Lula de 1995 zombou da generosidade do tucanato para
com a banca: "Se no próximo
ano o governo FHC fizer pelo
Brasil metade do que fez em 1995
pelos banqueiros [...], tenho certeza de que teremos um feliz
1996".
Sob o Lula de 2003, casas bancárias como o Bradesco (lucro de
R$ 1,6 bilhão nos primeiros nove
meses de petismo) não têm do
que se queixar. A tesouraria da
banca comemora, de quebra, a
intenção de Brasília de isentar
pobres investidores em papéis do
Tesouro do pagamento da
CPMF.
À moda do tucanato, o petismo
cumpriu um primeiro ano de sucesso medíocre. Por outro lado, o
Lula de 2003 dispõe de algo que o
FHC de 1995 não tinha: Duda
Mendonça. A golpes de marketing, não há cenário antigo que
não possa reluzir como novo.
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