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BIBLIOTECA FOLHA
Romance de Umberto Eco, segundo livro da coleção, traz história policial ambientada numa abadia, no século 14
"O Nome da Rosa" tem trama labiríntica
CASSIANO ELEK MACHADO
DA REPORTAGEM LOCAL
É do próprio Umberto Eco a definição mais precisa sobre seu romance "O Nome da Rosa". "Até o
leitor ingênuo percebeu que se
encontrava diante de uma história de labirintos", cravou o italiano, em breve ensaio que escreveu
sobre sua obra mais famosa.
Pois hoje é um desses raros dias
em que as bancas de jornal se
transformam em passagens secretas para labirintos.
A Biblioteca Folha está lançando hoje uma nova edição desse
clássico contemporâneo, que
marcou a estréia do influente ensaísta no campo da ficção. Publicado em 1980, "O Nome da Rosa"
se transformou logo depois em
um dos grandes fenômenos editoriais das últimas décadas.
Tanto seu editor italiano quanto
Eco declararam que a expectativa
máxima de vendas era de 30 mil
exemplares. E é para os 30 milhões de leitores, em todo o mundo, que caminha o livro, que já
disputa com "O Leopardo"
(1958), de Giuseppe Lampedusa,
o posto de romance mais vendido
da história da Itália.
Poucas vezes uma multidão tão
grande folheou uma obra tão
complexa, ainda que a complexidade de "O Nome da Rosa" seja
ela também um labirinto.
Autor do clássico ensaio "Obra
Aberta", de 1962, no qual discutia
a possibilidade de "uma pluralidade de significados em um só
significante", Eco criou um romance que pode ser lido em diversas camadas de profundidade.
Ao olhar mais ligeiro, temos um
frei chamado Guilherme de Baskerville e seu ajudante Adso de
Melk, torneados à imagem e semelhança do detetive Sherlock
Holmes e seu caro Watson, que
topam, em uma abadia italiana no
século 14, com uma série de misteriosos assassinatos.
Essa roupagem policial, enfatizada na adaptação do livro para o
cinema, pelo francês Jean-Jacques
Annaud, em 1986, pode prender o
leitor até o final. Eco conduz com
maestria o visitante dos corredores escuros por uma série de indícios que levam a crer em tramas
passionais ou religiosas por trás
das mortes violentas de monges.
Mas Eco, de novo no livro "Pós-Escrito ao Nome da Rosa", adianta: "É um romance policial no
qual se descobre muito pouco".
Aí é que o labirinto começa a se
estreitar. Nos bastidores de "O
Nome da Rosa", pelo menos em
parte deles, existe uma série de intrincados debates os quais o leitor
dificilmente desvendará.
Por trás dos "quem matou
quem" estão disputas como a do
racionalismo, personificado por
Baskerville, com o misticismo, na
pele do bibliotecário Jorge de Burgos (clara homenagem ao argentino Jorge Luis Borges), além de
querelas econômicas, políticas,
relacionadas ao poder na Igreja
Católica, e filosóficas -o que é a
verdade?, podemos chegar a ela?
Eco, vale repetir, diz que não
chegaremos a "descobertas". Mas
a pista mais consistente de sua posição talvez esteja em uma frase de
Guilherme de Baskerville, relatada pelo narrador Adso.
Em meio a uma busca frenética
a um misterioso segundo livro da
obra "Poética" de Aristóteles, supostamente sobre o riso, ele comenta: "Talvez a tarefa de quem
ama os homens seja fazer rir de
verdade, porque a única verdade é
aprendermos a nos libertar da
paixão insana pela verdade".
Eis aí o riso irônico de Umberto
Eco. Homem de tantas verdades
na semiótica, estética e teoria da
comunicação, o professor da Universidade de Bolonha acaba levando multidões de todo o mundo a uma longa turnê pela "inverdade" nos labirintos da ficção.
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