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TRANSIÇÃO
Dissidentes peemedebistas tentam convocar convenção do partido
Sem alarde, Lula estimula
ação de Sarney contra Temer
JOSIAS DE SOUZA
DIRETOR DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Reunidos em segredo na última
quarta-feira, o senador José Sarney e o ex-governador Orestes
Quércia acertaram detalhes de
um plano que ganhará o noticiário nos próximos dias.
Eles integram um grupo de neolulistas que planeja a destituição
da cúpula do PMDB. Informado a
respeito, Luiz Inácio Lula da Silva
estimula a estratégia com discrição protocolar.
Trama-se nos subterrâneos a
convocação extraordinária da
Convenção Nacional do PMDB,
instância máxima do partido. O
objetivo é acomodar no colo de
Lula os 94 votos da legenda no
Congresso (74 deputados e 20 senadores). Para convocar a convenção, Sarney precisa de nove
assinaturas de presidentes de diretórios estaduais. Informou a
Quércia, diante de testemunhas,
que terá 14.
Se não for um blefe, Sarney está
na bica de atropelar Michel Temer (SP), presidente do PMDB,
com quem trava queda-de-braço
particular. Temer conspira contra
o desejo de Sarney de tornar-se
presidente do Senado. Prefere o
senador Renan Calheiros (AL).
Nesta semana, Lula receberá
Roberto Requião. Eleito para o
governo do Paraná com o apoio
do PT, Requião tenta atrair para o
movimento pró-convenção outros dois governadores eleitos do
PMDB: Luiz Henrique (SC) e Germano Rigotto (RS).
Lula pisa o pântano peemedebista com cautela estratégica. O
suporte congressual do PMDB é
vital para o PT. Na ponta do lápis,
o novo governo soma 220 dos 513
votos disponíveis na Câmara.
É menos que os 257 deputados
necessários para assegurar quórum mínimo para a votação de
projetos de lei. É muito menos
que os 328 votos indispensáveis
para a aprovação de mudanças
constitucionais. Para piorar, o ativo de 220 votos está condicionado
a transações por realizar no balcão de trocas de Brasília. A costura envolve aliados naturais como
PC do B, PPS e PDT e parceiros de
conveniência como o PL e o PTB.
Negociador oficial do PT, o deputado José Dirceu adota discurso dúbio. Reunido há 15 dias com
Michel Temer, Renan Calheiros e
Geddel Vieira Lima (PMDB-BA),
Dirceu disse que a fatura do PT
com Sarney já foi liquidada.
Dirceu afirmou aos três que, em
troca do apoio eleitoral de Sarney,
o PT comprometera-se a não hostilizar Roseana Sarney no pleito
maranhense. E só.
Firmou-se na reunião acordo de
cooperação mútua para que o
PMDB aponte o novo presidente
do Senado e o PT indique o dirigente da Câmara. Restou a impressão de que estava aberto o caminho para Renan Calheiros.
Depois, em conversas com o
próprio Sarney e com Requião,
Dirceu disse que o encontro com
Temer e cia. fora "protocolar".
Convidado, não poderia ter-se
furtado ao diálogo. Meia-verdade.
Em realidade, foi Dirceu quem tomou a iniciativa de propor a reunião com Temer e seu grupo.
Dirceu move-se com desenvoltura. "Ele está jogando com profissionalismo. Não está fazendo
discurso de menino da UNE",
analisa o deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ), evocando o passado do presidente do PT, pontuado pela militância no movimento estudantil.
Jefferson e o resto da bancada
do PTB provaram do pragmatismo do novo PT na quarta-feira.
Reunido com o partido, Dirceu
acenou em direção à Esplanada
dos Ministérios. Nesta semana,
voltará ao assunto, em conversa
mais restrita. O PTB será representado por Jefferson e José Carlos Martinez, presidente da legenda. Espera emplacar pelo menos
um ministro. Já esboça uma lista
de alternativas.
A relação contém, por ora, quatro "ministeriáveis": Nelson Marquezelli (SP), líder ruralista; Félix
Mendonça (BA), ligado a Antonio
Carlos Magalhães; Walfrido Mares Guia (BA), com pendor pela
área educacional; e Carlos Wilson
(PE), lulista de primeira hora.
O ministério? Qualquer um.
"São pessoas polivalentes", afirma Jefferson.
Os critérios do loteamento variam conforme o interlocutor.
Convidado a analisar a participação do PDT, Leonel Brizola fez
uma exigência. Definida a pasta
que caberá ao seu partido, quer
indicar não uma lista de alternativas, mas o nome do ministro a ser
"chefiado" por Lula.
Tanta desenvoltura deixou irritada a cúpula do PL, que, preterida na primeira rodada de conversas, pôs-se em pé de guerra. O
partido da Igreja Universal receia
ficar com o que os seus dirigentes
chamam de "sobras". Entre quatro paredes, o nome de Dirceu é
associado no PL a palavras de calão raso.
A atmosfera de tensão contamina o PT. A ala mais à esquerda do
partido ainda não deglutiu a
aproximação entre Lula e Antonio Carlos Magalhães. Ao organizar a visita de Lula a Salvador, na
semana passada, o PT baiano discou para o gabinete do governador Otto Alencar. Informou que o
presidente eleito estaria na cidade. Se desejasse vê-lo, o governador poderia ir ao hotel.
Abespinhado, ACM disparou
dois telefonemas para São Paulo.
Logo seria tranquilizado. O encontro ocorreria onde o morubixaba baiano achasse conveniente.
Melhor: sua presença seria mais
do que bem-vista. Deu-se no Palácio de Ondina, residência oficial
do governador baiano.
Dirceu vem conversando amiúde com ACM. Num desses diálogos, ouviu que o PFL vai "colaborar" com o PT no Congresso. O
espírito de cooperação tende a
dissipar-se em 2004, por conta
das eleições municipais.
A cúpula do PMDB enxerga digitais de ACM na conspiração de
Sarney contra Michel Temer. A
queda de Temer interessa ao cacique do PFL. Sobretudo porque
junto com ele ruiria o prestígio de
Geddel Vieira Lima, líder do
PMDB na Câmara e inimigo mortal do cacique baiano.
Para tentar minar Sarney, os dirigentes do PMDB difundem no
partido a tese de que o entendimento do partido com o novo
presidente não depende da articulação do ex-presidente. Temer
defende a convocação do conselho do partido, instância intermediária entre a comissão executiva
e o diretório.
A ascensão de Sarney depende
da vontade dos 20 senadores que
compõem a bancada do PMDB.
Cabe a eles a indicação à presidência do Senado.
O grupo de Temer diz que o adversário não tem mais do que seis
votos. Sarney disse a Quércia que
espera ter do seu lado a maioria
absoluta da bancada.
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