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JANIO DE FREITAS
Gil no Banco Central
A montagem do governo
enredou-se em si mesma,
enredou-se no PMDB, enredou-se nos sentimentos do eleitorado lulista. E quem levou as sobras foi Gilberto Gil. Aconteceu-lhe cair, ministro mas desavisado, como a velha gota da d'água, em cima do desalento acumulado com a inesperada tucanice do eixo do futuro governo.
Gil está apanhando, porque
atacá-lo nada custa à mídia,
como se ele é que viesse da presidência do BankBoston e da
campanha de José Serra sob o
rótulo das "mudanças" no Banco Central e no governo.
Amanhã, disse Lula da Silva,
saem os nomes finais do ministério. Sem o PMDB, dizem, mas
ainda há algumas horas para a
mudança da mudança de decisão, porque algumas mudanças
precisam aparecer. A única
mais consistente, por ora, seria
mesmo a ausência do PMDB fisiológico no futuro governo, depois de oito anos de compra-e-venda com a Presidência da República e vários escândalos
abafados, como o do DNER e o
da Suframa, pela entrega de setores do governo aos peemedebistas fisiológicos.
A se confirmar a ausência do
PMDB, o governo de Lula terá
escapado na última hora de
uma imoralidade. Se não ficasse tão evidente a insistência de
José Dirceu em negociar com a
cúpula do PMDB, seria inacreditável a intenção dos novos governantes de se associarem ao
grupo de Geddel Vieira Lima,
Moreira Franco, Jader Barbalho e congêneres. Mesmo que
houvesse necessidade comprovada, para fazer maioria na
Câmara e no Senado, ou as razões éticas passam a prevalecer
ou não haverá mudança essencial alguma, em comparação
com a imoralidade política dos
últimos oito anos, em que até
reeleição foi comprada no Congresso.
Mas nem a necessidade poderia comprovar-se. O PMDB está
rachado, e boa parte dele não
deixará de apoiar as inovações
importantes do governo, até por
ser defensora programática de
muitas delas. E, em silêncio,
desde as eleições estão ocorrendo muitas conversas de peemedebistas com outros partidos,
para sua transferência. O PTB,
por exemplo, já está mais gordo
do que saiu das urnas. Há sinais
de que também o PPS anda
bem cotado entre peemedebistas descontentes. Por fim, nada
até hoje negou que base no
Congresso só se constrói no governo, e não fora dele.
Se os organizadores do novo
governo desenredaram-se do
PMDB fisiológico, em casa continuam enredados.
Algum mal-informado de
sempre publicou que "Carlos
Lessa nunca foi convidado para
o Planejamento". Nesse caso,
Lessa teria sido chamado por
Lula apenas para matar improváveis saudades de Brasília.
Mas "Carta Capital" precisou
o dia da viagem, quinta-feira
12, e a colunista de política de
"O Globo", Tereza Cruvinel,
confirmou a escolha de Lula, registrada em nota por mim assinada já indicando que Lessa
viajara com dúvidas sobre a
aceitação do cargo. O PMDB fisiológico (Lessa é do PMDB histórico) vetou-o, e Lessa recebeu
o que preferia: o BNDES, que
não o tiraria do Rio.
O empresário Luiz Fernando
Furlan, adepto da candidatura
Serra e escolhido ministro do
Desenvolvimento, desautoriza
o noticiário e as entrevistas sobre a ida de Lessa para o
BNDES, a convite pessoal de
Lula. É lógico, e ficou claro, que
Furlan prefere alguém afinado
com suas idéias, que são as de
apoiador do atual governo. E
neste pequeno incidente tem-se,
então, o anúncio das contraposições que vão ocorrer no governo e cujas soluções não serão
simples. Entre o governo prometido e o que o prometem os
escolhidos para o setor econômico só cabem interrogações.
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