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INTEGRAÇÃO SUL-AMERICANA
Guillermo Fernández de Soto nega que acordo entre países seja "união dos subdesenvolvidos"
Para andinos, bloco tem "grande potencial"
ROGERIO WASSERMANN
DA REDAÇÃO
A formação de um bloco de países sul-americanos não é a "união
dos subdesenvolvidos", mas a integração de uma região que possui grandes recursos naturais e
um importante potencial de crescimento, na avaliação do secretário-geral da Comunidade Andina
(CAN), o colombiano Guillermo
Fernández de Soto. "[A América
do Sul] não é uma região nada
desprezível. Claro que ainda falta
um caminho grande para percorrer, mas as potencialidades são
muito significativas", diz.
Ex-chanceler do presidente Andrés Pastrana (1998-2002), Fernández diz que a integração da região deve acontecer com uma
"anestesia" financeira, por meio
da ação dos organismos multilaterais de crédito para financiar
obras de infra-estrutura e o desenvolvimento dos países mais
pobres, a exemplo do que aconteceu no processo de integração da
União Européia.
Para ele, o tamanho do Brasil e o
peso de sua economia, a maior da
América do Sul, não devem se traduzir em hegemonia do país dentro de um eventual novo bloco regional. "O Brasil já demonstrou
que quer a integração sem hegemonias", disse ele.
Leia a seguir os principais trechos da entrevista concedida por
ele à Folha, por telefone, de Lima,
sede da CAN:
Folha - Quais são as vantagens da
integração para os países do Mercosul e da Comunidade Andina?
Guillermo Fernández de Soto - Não se trata simplesmente da
criação de um acordo de livre comércio, mas de avançar na criação de um espaço sul-americano,
que tem uma importância formidável. São 500 milhões de habitantes. Não somente na questão
do comércio, mas também no aspecto político, na integração física
e na cooperação financeira, geraria uma força enorme para as negociações internacionais.
Folha - Muitos que defendem essa integração citam a União Européia como exemplo. A integração
entre Mercosul e Comunidade Andina seria como uma UE dos subdesenvolvidos?
Fernández - Não chamaria assim. Se analisarmos as características da América do Sul, vemos
que é uma região que concentra
cerca de 35% da biodiversidade
do mundo. Só a região andina e o
Brasil têm 24% da água doce do
mundo. É uma região rica em
energia, em gás, em carvão, em
minerais. Portanto, não é uma região nada desprezível. Claro que
ainda falta um caminho grande
para percorrer, mas as potencialidades são muito significativas.
Além disso, no atual contexto
da globalização, não tenho nenhuma dúvida de que o melhor
que podemos fazer os sul-americanos é nos unirmos, não seguirmos sós.
Folha - E essa união serviria como
base para negociações multilaterais, como as para a formação da
Alca?
Fernández - A Alca já tem uma
dinâmica de negociação própria.
O que se prevê é uma Alca negociada por setores, por etapas. Portanto, prever que se pode negociar de bloco a bloco é prematuro.
Mas, sem dúvida, as coincidências do bloco sul-americano fortalecerão posições em muitos aspectos comuns nas negociações
da Alca. E também nas negociações com a Europa, ou com os
países da Ásia.
Folha - A integração pressupõe
gastos, com obras de infra-estrutura, ajuda aos países menos desenvolvidos para reduzir as diferenças, entre outras coisas. Considerando que a maioria dos países enfrenta crises financeiras, existe dinheiro para pagar essa integração?
Fernández - A Europa fez uma
integração com o que eu denomino anestesia. Não podem nos pedir para fazer uma integração sem
essa mesma anestesia. Na Europa,
a anestesia foram os fundos de
coesão regional.
Por isso, a Comunidade Andina, na proposta que fez há alguns
dias ao Mercosul, na cúpula de
Montevidéu, propôs um programa de cooperação que contemple, entre outras coisas, o pleno
aproveitamento dos mecanismos
existentes de financiamento do
comércio e dos investimentos para a melhoria da capacidade produtiva dos países e regiões, tudo
com o propósito de melhorar a
competitividade global.
Em segundo lugar, poder avançar no grande programa de integração física, chamado Iirsa [Integração da Infra-estrutura Regional da América do Sul], no qual
estamos trabalhando, dedicando
os mecanismos financeiros adequados. Por isso nossa insistência
em que o BID [Banco Interamericano de Desenvolvimento], o
BNDES [Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social] e a Corporação Andina de
Fomento estabeleçam os recursos
necessários para essa "anestesia".
Folha - O fato de o Brasil ser a
maior economia da região e ter
mais de 20% de toda sua população significará ao país liderar esse
processo de integração? Existe algum medo, entre os países da CAN,
de que isso aconteça?
Fernández - O Brasil assinalou
como uma de suas prioridades na
política externa a aproximação
com a América do Sul e a criação
desse espaço sul-americano. E já
demonstrou, por meio do presidente Lula e do chanceler Amorim, que quer isso sem hegemonias, com uma abertura muito
significativa reconhecida pelos
chefes de Estado andinos.
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