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REFORMA TRIBUTÁRIA
Consultor do PT ressalva que mexer em interesses dos ricos é difícil
Para Khair, proposta é pouco progressiva
DA REPORTAGEM LOCAL
Tradicional colaborador do PT
para a área de finanças públicas,
Amir Khair, consultor na área fiscal e tributária, avalia que a reforma tributária a ser proposta pelo
governo poderia ter um caráter
mais progressivo, ou seja, cobrar
alíquotas maiores de acordo com
o tamanho da renda e da riqueza
do contribuinte.
"Mexer em interesses de quem
tem muita riqueza é difícil", afirmou Khair, que foi secretário de
Finanças da Prefeitura de São
Paulo durante a gestão Luiza
Erundina (1989-1992). "Em relação a outros países, o Brasil tributa muito pouco a renda e o patrimônio", declarou o consultor.
Khair, que elogia a iniciativa de
criar um imposto sobre heranças
e doações, acha que o sistema tributário brasileiro seria mais justo
com a instituição de um imposto
sobre grandes fortunas.
"Fala-se muito da renda mínima, mas isso é uma iniciativa do
lado da despesa. A reforma tem
de focar a receita. Por isso é importante colocar um artigo na
Constituição que permita que todo e qualquer tributo seja progressivo", disse.
(JD)
Folha - Como o sr. avalia a proposta do governo que visa a alterar
o sistema tributário?
Amir Khair - É a reforma tributária possível, em que existe um
grau de consenso. As tentativas
que foram feitas no passado não
conseguiram emplacar. Eles fizeram a coisa correta do ICMS com
legislação única, em que se pretende que seja mais simplificada.
Não vai ser fácil simplificar. Evitar
as 27 legislações e padronizar as
alíquotas já é uma grande coisa.
Folha - Haverá aumento da carga
tributária com a criação de apenas
cinco alíquotas para o imposto?
Khair - Sempre que você faz uma
reforma tributária acaba tendo.
Nesse caso, depende. As alíquotas
que interessam aos Estados, que
são as de energia elétrica e de comunicações, são as maiores. Normalmente 25%, em vez de 18%,
que é o normal das alíquotas. Só o
fato de ter algo padronizado já vai
fazer com que você nivele essas
alíquotas por cima.
Folha - Então haverá um impacto
negativo para o consumidor?
Khair - Sim, se eles não fizerem
um sistema interno de compensação. Vamos supor que definam
um novo conjunto de alíquotas
que todos os Estados têm de respeitar. Alguns ganhariam e outros
perderiam. Os Estados que sairiam ganhando teriam de colocar
esse algo a mais num fundo para
dividir com os que estão perdendo porque o espírito da reforma é
o da neutralidade. Esses fundos
preservariam a receita que Estados ou municípios tiveram nos
últimos anos.
Folha - O que falta na proposta?
Khair - Acho que deveria estar
contemplada a parte relativa ao
imposto sobre grandes fortunas.
Quem tem uma riqueza acima de
certo montante pagaria esse imposto com uma alíquota baixa. A
Constituição atual prevê esse imposto, mas nunca foi regulamentado porque dependia de lei complementar. A tributação sobre a
herança vai ser um avanço. Permite cobrar de heranças baixas
um pequeno valor e mais de 4%
acima de certo valor.
Como o IPTU (Imposto Predial
e Territorial Urbano), que pode
ser progressivo. É uma questão de
justiça tributária. Acho que a
Constituição deveria ter algum
artigo dentro da reforma tributária prevendo que todo e qualquer
tributo poderá ser progressivo na
forma da lei. Assim se faz justiça
fiscal: cobra mais de quem tem
mais e reduz de quem tem menos.
Folha - Por que o sr. considera o
imposto sobre grandes fortunas
tão importante?
Khair - Quando fazemos tributação em cima da atividade econômica, tributamos produção, um
movimento, um fluxo. Outra coisa é tributar estoque, que é a riqueza. Você pode descarregar impostos sobre o fluxo, se você quer
manter a mesma carga tributária.
A brasileira, que é hoje de 36% do
PIB, poderia baixar para 31%, por
exemplo, diminuindo a tributação sobre a atividade econômica.
Folha - Por que o governo não
propõe essa cobrança, que é uma
tradicional defesa do PT?
Khair - Mexer em interesses de
quem tem muita riqueza é difícil.
É relevante colocar essa questão
em pauta porque ela está omissa
nessa discussão. Em relação a outros países, o Brasil tributa muito
pouco a renda e o patrimônio. Poderíamos mexer ainda na questão
progressiva dos tributos sobre a
propriedade e nas alíquotas do
Imposto de Renda. Essa de 27,5%
para pessoa física é muito baixa.
Você pode estabelecer uma faixa
mais alta. Poderia ser 35%.
Folha - O sr. acha que a proposta
poderia ter sido mais progressiva?
Khair - Acho que sim. Fala-se
muito da renda mínima, mas isso
é uma iniciativa do lado da despesa. A reforma tem de focar a receita. Por isso é importante colocar
um artigo na Constituição que
permita que todo e qualquer tributo seja progressivo.
Folha - Houve enfoque correto
sobre a questão?
Khair - O mais importante não se
fala. É colocar no papel onde se
está e onde de se quer chegar. Para
isso, precisamos de planejamento. Saber quem tem que pagar para o Estado, quanto e como. E distribuir isso na sociedade. Quanto
menor a renda, menor a tributação. Hoje quem ganha mais, paga
proporcionalmente menos imposto. Tem muita carga de ICMS,
o imposto mais alto. Mas o rico e
o pobre pagam o mesmo pelo
quilo de arroz. Na progressividade sobre o patrimônio e a renda, o
rico paga proporcionalmente
mais do que o pobre.
Folha - Quem ganha com a proposta do governo?
Khair - Ela está por enquanto pesando na discussão de não desagradar aos governadores. O ponto
principal é o ICMS. A discussão
que veio a tona foi essa. Viram o
que tem de comum: unificação,
cobrança no destino, que vai dar
muita confusão. Para não ter tanta discussão, deixaram a questão
para lei complementar, que passa
com maioria. Mas isso vai estourar lá na frente.
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