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MAGNETISMO ALIADO
Para Leôncio Rodrigues, troca-troca ajuda a governar, mas desgasta imagem do sistema político
Infidelidade não incomoda eleitores, diz cientista político
FLÁVIA MARREIRO
DA REDAÇÃO
O trânsito de parlamentares entre os partidos aumenta a governabilidade e não incomoda o eleitorado -o primeiro interessado
e o único com poder de punir os
envolvidos com a não-reeleição.
"Os eleitores não dão muita importância à infidelidade dos
trânsfugas", completa o raciocínio o cientista político Leôncio
Martins Rodrigues, 69.
Ele aponta o desgaste de imagem e o desconforto "para uma
visão ética da política" causado
pelo fenômeno, mas ressalva que
ele opera em falhas concretas dos
sistema político-eleitoral do país:
governos sem maioria parlamentar, negociação de verbas.
Leôncio acredita que o ímpeto
petista de fazer a reforma política,
uma promessa de campanha reforçada nos recentes discursos de
Lula, arrefecerá à medida que se
consolide a maioria do governo
-"Afinal, o PT (e os partidos de
'esquerda') vêm crescendo sob o
atual sistema".
O professor da Unicamp concedeu entrevista por e-mail.
Folha - Assistimos a um troca-troca parlamentar recorde. Qual o
efeito para o sistema político?
Leôncio Martins Rodrigues - A taxa de migração partidária aumentou em razão da ascensão de uma
nova elite ao poder sem suficiente
apoio parlamentar. Se a anterior
coligação continuasse no poder, o
troca-troca deveria ser menor.
O principal efeito, por mais desagradável que seja para uma visão ética da política, é aumentar a
governabilidade. É óbvio que essas mudanças não melhoram a
imagem da classe política brasileira e de nossos partidos. Mas dado
o fato concreto da fragmentação
partidária, da eleição de presidentes sem maioria parlamentar e da
necessidade de os parlamentares
contarem com as benesses do
Executivo para agradarem suas
"bases", os estímulos e recompensas por trocas de legenda
oportunistas são muito fortes.
Os eleitores não dão muita importância à infidelidade dos
trânsfugas.
Folha - Quais medidas podem ser
tomadas para restringi-lo? Elas poderiam estar na reforma política?
Leôncio - Em princípio, muito
poderia ser feito. Por exemplo: estabelecer que o parlamentar não
poderia abandonar a legenda pela
qual foi eleito sob pena de perda
de mandato. Contra essa tese milita a idéia de que, no Brasil, o eleitor vota no candidato, e não no
partido: o parlamentar seria livre
para trocar de partido depois de
eleito. Quando à reforma política,
nenhuma mudança que contrarie
os interesses da maioria da classe
política é aprovada por ela. Penso
que se alguma mudança vier, será
bem superficial.
Folha - No mais, o sistema político precisa de reforma? É urgente?
Leôncio - Há muitos problemas,
mas me parece uma ilusão acreditar que se pode chegar a um sistema sem problemas. Um ponto
muito criticado é o voto personalizado em lista aberta. Mas o sistema de lista fechada e bloqueada
fortalece os chefes partidários. O
nosso sistema outorga maior liberdade para o eleitor.
Folha - O sr. concorda com os termos da reforma política no Congresso ( financiamento público da
campanha, fim das coligações...)?
Leôncio - Não sou favorável ao
financiamento público, apresentado como uma solução moralizadora diante do poder do dinheiro. Ele já existe. Pretende-se aumentá-lo. A grande ingenuidade
me parece a crença de que o financiamento consiga evitar o caixa dois. Com relação às coligações
em eleições proporcionais, uma
fração dos políticos no Congresso
tenta uma conciliação entre proibi-las de uma vez (o que poderia
liquidar os minipartidos) e permitir as federações. Minha dúvida
é o que exatamente se pretende
com isso. Se é para elevar a governabilidade, pode ser inócuo, porque um dos problemas operacionais do sistema é o número elevado de partidos médios que dispõem de poder de chantagem.
Folha - O governo Lula se empenhará em fazer a reforma política?
Leôncio - Não depende só da
ajuda do Executivo. Se o governo
conseguir uma base de sustentação razoável no Congresso, a disposição reformista tenderá a declinar. Afinal, o PT (e os partidos
de "esquerda") vêm crescendo
sob o atual sistema.
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