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NO PLANALTO
Futuro do combate à corrupção passa pelo STF
JOSIAS DE SOUZA
DIRETOR DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Já se sabia que a Justiça é
cega. Pode-se descobrir agora que é desprovida também de
olfato. Os juízes do Supremo estão na bica de julgar um processo
vital para o futuro do combate à
corrupção.
A causa tramita em silêncio.
Envolve suspeitas de fraude contra o INSS. Subiu ao STF porque
envolve um deputado federal do
Maranhão, Remi Trinta. Encontra-se licenciado da Câmara. Integra o PL, mesmo partido do vice-presidente José Alencar. Era
sócio de uma clínica.
Chamava-se Santa Luzia. Investigada pelo procurador da República Nicolao Dino de Castro,
foi acusada de fraudar o SUS.
Coisa cabeluda. O processo menciona cobranças irregulares -de
exames inexistentes a aborto em
pessoa do sexo masculino. Só em
95, o suposto logro impôs ao INSS
prejuízo de R$ 700 mil, fora correções. Brasília descredenciou a
Santa Luzia do SUS. A clínica fechou.
Em defesas encaminhadas ao
STF, o deputado Trinta e seus sócios negam responsabilidade por
eventuais ilícitos. E esgrimem
uma tese capciosa. Argumentam
que o caso deve ser arquivado
porque se baseia exclusivamente
em dados recolhidos pelo Ministério Público. Invocam decisão
anterior do STF.
No ano passado, a 2ª turma do
Supremo deliberou que o Ministério Público não pode realizar
investigações penais. A sentença
foi proferida em ação movida
por um delegado de Brasília.
Processado por promotores, ele
alegou que só a polícia teria poderes para realizar investigações
penais. Deram-lhe razão os ministros Nelson Jobim, Gilmar
Mendes e Carlos Velloso.
O relator do caso do deputado
Trinta é o ministro Marco Aurélio de Melo. Proferiu o seu voto
em 15 de outubro de 2004. Submetido ao crivo do plenário do
STF, o julgamento foi suspenso
graças a um pedido de vista do
ministro Joaquim Barbosa. Voltará à pauta nos próximos dias.
Em seu texto, Marco Aurélio
anota que está "convencido de
que o inquérito criminal há de
ser feito não pelo Ministério Público, mas pela polícia". Polícia
Federal, no caso da Santa Luzia.
Conduzido só pelo Ministério
Público, o processo da clínica seria, na opinião de Marco Aurélio, "insubsistente".
O novo julgamento é mais importante do que o anterior. A decisão agora não será de uma turma, mas do plenário do Supremo, composto de 11 juízes. A sentença pode vir a se converter em
jurisprudência.
Antes que Joaquim Barbosa
pedisse vista, Jobim proferiu o
seu voto. Acompanhou a posição
do relator Marco Aurélio. Por
coerência, Gilmar e Velloso farão
o mesmo. Basta que mais dois
ministros encampem a tese para
que promotores de Justiça e procuradores da República sejam
postos de joelhos.
Privado da prerrogativa de
promover investigações penais, o
Ministério Público vai virar um
aleijão. A decisão representará
um inesperado mimo à corrupção. As conseqüências serão funestas.
Uma primeira pergunta: o que
será feito dos processos que já estão em curso. Vão ao lixo, por
exemplo, os autos do caso do juiz
Lalau. Baseiam-se fundamentalmente em investigações do Ministério Público. Não há vestígio
de interferência da polícia.
Vai virar entulho também o
caso Celso Daniel, reaberto graças a achados de procuradores
que expuseram fragilidades de
um inquérito policial. Virará fumaça, de resto, a investigação
que rastreou depósitos em nome
de Maluf no exterior. De novo,
não houve participação da polícia.
Uma eventual sentença acerba
do STF chegará num instante em
que a improbidade torna-se trivial. Verifica-se que, na administração pública, nada se cria, nada se transforma. Tudo se corrompe. Multiplicam-se as malfeitorias. O noticiário não consegue
mudar de assunto. Muda no máximo de escândalo.
Imaginou-se que o Collorgate,
por extravagante, produziria
efeitos benignos. A descoberta de
que Brasília convertera-se numa
Bagdá entregue a Ali Babá levaria à republicanização do Estado. Amedrontados, políticos não
ousariam reincidir na delinqüência. Empresários hesitariam
em comprar influência. Eleitores
negariam voto a tipos suspeitos. O
país tomaria jeito. Engano.
Depois de Collor "PC" de Mello
vieram outros: João "Anão do Orçamento" Alves, Jader "Sudam" Barbalho, Paulo "US$ 200 milhões"
Maluf, Celso "Farinha do Mesmo
Saco" Pitta...
Vieram mais outros: ...João "Sentenças Micadas" da Rocha Matos,
Flamarion "Folha Salarial Macetada" Portela, Rodrigo "Dólares na
Suíça" Silverinha, Nicolau "TRT"
dos Santos Neto...
Vieram outros mais: Sérgio "Santo André" Gomes da Silva, Waldomiro "1%" Diniz, Luiz Cláudio
"Vampiro" Gomes da Silva e, para
não roubar a paciência e o domingo
do leitor, um enorme etc...
A banda podre assumiu tais proporções que, entre suspeitas e certezas, o Brasil ganha feições de uma
nação com estruturas de poder intrinsecamente corruptas. Em meio
à fauna de anacondas, gafanhotos e
morcegos o bom senso recomenda
que sejam tonificados, não podados, os poderes de quem combate a
corrupção.
Operações recentes têm demonstrado a eficiência da parceria entre
polícia e Ministério Público no combate aos atentados contra as arcas
públicas. Aleijar procuradores numa hora dessas é coisa que não faz
sentido.
Ao tempo em que era a virgem pura da oposição, o PT era aliado incondicional do Ministério Público.
Às voltas com os prazeres do bordel
governista, o ex-PT torce pelo desastre iminente. Reze-se para que o
STF recobre o faro.
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