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CIENTISTA AMERICANO SUGERE QUE JÚPITER, O MAIOR PLANETA DO SISTEMA SOLAR, TAMBÉM
PASSA POR MOMENTO DE MUDANÇA CLIMÁTICA E DEVE MUDAR SEU ASPECTO EM UMA DÉCADA
Gigante desperto
Divulgação Nasa
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Imagem obtida durante a missão das sondas americanas da série Voyager mostra a Grande Mancha Vermelha, marca registrada do planeta Júpiter |
Salvador Nogueira
da Reportagem Local
Mudança climática parece estar mesmo na
moda entre os mundos do Sistema Solar.
Aquela de que mais se ouve falar é a da Terra, que parece estar se aquecendo por conta
do aumento das emissões de gás carbônico na atmosfera, graças a uma certa espécie primata que resolveu deixar a vida mansa e construir fábricas e automóveis movidos a derivados de petróleo e a carvão. Em Marte, sem
interferências civilizadas, uma coisa parecida parece estar acontecendo.
Um estudo feito em 2001 por Michael Malin, cientista
responsável pela câmera de alta resolução instalada na
sonda Mars Global Surveyor, mostrou que, a cada ano,
a camada de dióxido de carbono nos pólos marcianos
está menor -sinal de que parte dele está indo para a atmosfera, intensificando também lá o famigerado efeito
estufa (que na verdade cairia bem ao gélido planeta vermelho). E a última novidade, divulgada há apenas dez
dias, vem de Júpiter.
É o que diz Philip Marcus, um físico do Departamento
de Engenharia Mecânica da Universidade da Califórnia
em Berkeley, nos Estados Unidos. Num estudo solo publicado na revista científica britânica "Nature" (www.nature.com), ele sugere que o maior planeta do Sistema
Solar está prestes a entrar num momento de turbulentas mudanças, que devem levar a drásticas modificações em sua aparência.
"Nos próximos dez anos -o que é um tempo curto
para a maioria das coisas astrofísicas-, astrônomos
amadores e profissionais ou vão observar mudanças,
ou minha hipótese está incorreta", ele diz. "A mais dramática -e observável por amadores- será que as faixas de nuvens aos 34 S vão formar ondas. As ondas ficarão mais pronunciadas até que a faixa se quebre em
"manchas" altamente alongadas e separadas. As manchas vão encolher e se tornarão mais circulares, durante
uma década, depois de sua formação."
Os efeitos não somente farão surgir coisas no Sul joviano (Jove é um outro nome dado a Júpiter, o deus dos
deuses entre os romanos na Antigüidade), mas também
propiciarão o desaparecimento de outras. "Houve uma
fila de 24 vórtices observada a 41 S que foi claramente
fotografada pelas sondas Voyager em 1979. Esses vórtices são pequenos e, portanto, mais difíceis de ver. Eles
vão começar a desaparecer. Na verdade, acredito que
alguns deles já tenham até sumido."
Marca registrada
Até mesmo a característica mais
marcante de Júpiter, a famosa Grande Mancha Vermelha, sofrerá modificações com a mudança climática. O
primeiro a reportar sua existência foi o britânico Robert
Hooke (1635-1703), no longínquo ano de 1665. Desde
então, a mancha tem sido observada consistentemente,
oferecendo um desafio formidável aos cientistas planetários. Para começo de conversa, de que se trata?
O consenso é o de que se trata de uma enorme tempestade sem fim na turbulenta atmosfera joviana, um
vórtice poderoso, com dimensões assustadoras -na
área que ela ocupa seria possível acomodar umas duas
ou três Terras. "A mancha vermelha vive de comer todas as suas vizinhas (em sua latitude) que tenham o
mesmo sentido [ou seja, que girem na mesma direção].
Ela não tem companheiras. Ela as come. Eu diria que é
um fenômeno muito, muito duradouro", diz Marcus,
que foi atraído para o estudo de Júpiter justamente pelo
enigma da marca registrada do planeta.
"Eu tenho feito pesquisa sobre Júpiter desde 1979,
quando as duas naves Voyager nos mandaram fotos e
vídeos mostrando a interessante dinâmica fluida da
mancha vermelha, das correntes de jatos e de outros
vórtices. Eu tinha acabado de sair da graduação. Um
dia, enquanto via as fotos da Voyager da mancha vermelha, eu me convenci de que, entre dinâmica de fluidos e computação, eu tinha as habilidades necessárias
para atacar o problema que era entendê-la. Eu publiquei vários estudos sobre o tema."
Claro, nem todos os mistérios foram resolvidos. "A
cor da mancha vermelha vem de moléculas-traço cuja
química é incerta", diz Marcus. "Eu suspeito -mas não
posso provar- que a cor seja bem sensível à temperatura, então eu espero que ela fique mais suave ou sofra
uma mudança, como já fez muitas vezes no passado."
Para o pesquisador americano, tudo faz parte de um
ciclo climático que se repete em Júpiter a cada 70 anos,
aproximadamente. No momento atual, o fim de um
desses ciclos está para acontecer. O sumiço dos vórtices
responsáveis por várias manchas brancas observadas
em Júpiter desde 1930 -uma das predições- seria o
primeiro efeito de uma cadeia que levaria a um aumento de cerca de 10C na temperatura equatorial e a uma
redução equivalente nos pólos.
Surpreendentemente, hoje Júpiter tem uma temperatura mais ou menos igual em toda parte (e não muito
aprazível, diga-se de passagem, flutuando em torno dos
-150C), diferentemente do que acontece na Terra, em
que os pólos são bem mais frios. Ao que parece, há mecanismos atmosféricos ausentes aqui que fazem com
que a temperatura seja equilibrada por lá, a despeito do
equador receber mais radiação solar do que os pólos. E
essa é só a ponta do iceberg. Com toda a franqueza, Terra e Júpiter são planetas bem diferentes.
Enquanto o primeiro é um corpo rochoso, com uma
superfície sólida e dimensões relativamente pequenas,
o segundo é um gigante gasoso, com diâmetro cerca de
12 vezes maior e composição bem mais simples, em que
predomina o hidrogênio. Além disso, orbitam o Sol a
distâncias bem díspares. A Terra está a 150 milhões de
quilômetros da estrela, o que faz dela um bom lugar para abrigar água líquida em sua superfície. Já Júpiter se
posiciona a uma distância pouco mais de cinco vezes
maior e nem mesmo tem uma superfície sólida que
possa abrigar água, em qualquer estado que seja. Boa
parte de sua energia térmica vem de dentro do próprio
planeta. É quase como uma estrela que acabou sendo
pequena demais para ter dado certo.
(Essa idéia foi explorada na continuação da saga literária e cinematográfica "2001: Uma Odisséia no Espaço", de autoria de Arthur C. Clarke, em que sondas alienígenas -os famosos monolitos- acabam por desencadear um processo no planeta gigante que faz com que
ele, de algum modo, inicie a fusão nuclear do hidrogênio em seu núcleo e se "acenda", tornando-se uma estrela-irmã do Sol.)
Apesar do tamanho, o velho Jove não mete medo nos
cientistas. "Júpiter é de muitos modos bem menos complicado que a Terra, uma vez que é basicamente uma
bola de hidrogênio: um núcleo sólido bem pequeno,
provavelmente feito por hidrogênio metálico, sob grande pressão. Em volta há hidrogênio líquido e acima, hidrogênio gasoso", diz Marcus. "Não há continentes para aquecer com o Sol, nenhuma montanha para desviar
correntes, nenhuma vida vegetal para colocar e tirar
carbono da atmosfera, nenhum ser humano para poluir
e complicar a química etc."
Planetologia comparada
Ainda assim, há muito
que para aprender sobre o planeta de residência dos humanos olhando para outros mundos mais inóspitos no
Sistema Solar, segundo Marcus. E Júpiter, apesar de tão
diferente, não é exceção. "No que diz respeito à meteorologia, há muita similaridade entre as correntes de jato, os ciclones e os anticiclones jovianos e os terrestres.
Eles se comportam de maneira similar, especialmente
no modo como interagem uns com os outros", afirma.
"Se eu tivesse estudado o clima de Júpiter do mesmo
modo que alguns -mas não todos- cientistas modelam o clima da Terra, eu teria usado um código de computador enorme, que teria incluído todos os processos
físicos que eu pudesse imaginar. Claro, eu nunca teria
achado o ciclo joviano desse jeito. É complicado demais", diz Marcus. "Em vez disso, eu me concentrei em
pedaços muito específicos da física -estudei cada um
deles até saber o que era importante e o que não era- e
então juntei as peças. Se vamos entender as mudanças
climáticas da Terra, acho que precisamos começar a
olhar para elas com idéias novas."
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