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SEQÜÊNCIA DE DESCOBERTAS PALEONTOLÓGICAS FEITAS POR PESQUISADORES CHINESES REVELA NOVOS LAMPEJOS SOBRE COMO SURGIU A ARTE DO VÔO ENTRE OS PÁSSAROS PRIMITIVOS
GANHANDO OS ARES
Zongda Zhang
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Reconstrução de um embrião de ave com desenvolvimento precoce, originário do Período Cretáceo, na China |
Ricardo Bonalume Neto
da Reportagem Local
Como descobriram os múltiplos pioneiros da aviação, cerca de um século atrás, ou você voa, ou não
sai do solo. Por mais bonito que seja o modelo do
seu avião, a prova de fogo é sair do chão, voar e
voltar. Algo parecido aconteceu com os seres vivos. Quais
começaram a ser capazes de voar, e como, e quando?
Uma seqüência notável de fósseis descobertos na China
lança luzes sobre esse momento da evolução biológica.
Apesar das críticas dos fanáticos religiosos, existem boas
provas da gradual evolução das formas dos seres vivos.
Entre um ancestral e seus descendentes existentes hoje podem ter havido formas intermediárias. Uma "meia asa"
poderia não servir para voar, mas poderia ter outra função. E, no fim das contas, um animal capaz de vôo surgiu
no planeta. Se adaptado, deixou descendentes. Mesmo hoje existem aves incapazes de vôo, apesar de terem anatomia em quase tudo semelhante à de suas colegas voadoras.
Os fósseis chineses da Província de Liaoning têm dado
suporte à teoria que afirma que os pássaros modernos
descendem dos dinossauros. Em edição recente da revista
científica britânica "Nature" (www.nature.com) se revelou o achado de um fóssil de filhote de dinossauro preservado durante o sono com a posição típica de uma ave.
Também foram achados ali fósseis de dinossauros com
penas, mas incapazes de vôo. As penas teriam alguma outra função -controle de temperatura do corpo, por
exemplo. Mas sua existência criou as condições para um
descendente usá-las para outra coisa -como voar.
O pássaro mais antigo conhecido é o Archaeopteryx,
que aparentemente não voava tão bem e parecia um híbrido de dinossauro com ave desenhado por uma criança
alucinada.
O Archaeopteryx certamente era mais capaz de voar do
que os dinossauros com penas -com uma exceção, um
pequeno dino, o Microraptor, capaz de planar como um
esquilo moderno (e que tinha um tamanho parecido).
O dino planador usava as penas nos seus quatro membros para facilitar o salto de galho em galho -algo que os
cientistas batizaram, entre aspas, de estágio das "quatro
asas". Há quem afirme que o Archaeopteryx também usava uma propulsão semelhante.
Outra descoberta chinesa revelada recentemente lança
ainda mais luz sobre esse possível estágio, feita por Fucheng Zhang e Zhonghe Zhou, do Instituto de Paleontologia de Vertebrados e Paleoantropologia da Academia Chinesa de Ciências.
Os dois acharam um fóssil -descrito na mesma revista
"Nature", na edição de quinta-feira passada- de um pássaro com penas em grande quantidade nas pernas, uma
característica mais parecida com as "quatro asas" do Microraptor do que com as aves modernas, com sua cauda
aerodinâmica.
Já as penas de cauda dos pássaros fósseis são bem mais
curtas e não teriam o mesmo desempenho em contribuir
para a sustentação do animal no ar.
Mesmo hoje, dizem os autores, existem aves que utilizam detalhes estruturais das pernas para efeitos durante o
vôo, como uma "brecada" mais rápida.
As penas nas pernas do novo pássaro fóssil, ainda sem
nome, são relativamente mais compridas do que as do
Archaeopteryx e aparentam ter melhor aerodinâmica.
"A capacidade de vôo desses pássaros antigos tem sido
geralmente reconhecida, embora não fosse provavelmente tão forte como nos pássaros modernos", dizem os autores do estudo. "As fracas características aerodinâmicas
das penas nas pernas do novo pássaro poderiam ter ajudado a cauda pouco desenvolvida em manobras durante
o vôo", afirmam os dois pesquisadores chineses.
Os pesquisadores não publicaram a idade do fóssil além
de citar que são do início do período geológico conhecido
como Cretáceo (65 a 136 milhões de anos atrás), mas os
que costumam ser achados nas formações da Província
de Liaoning datam de 124 a 145 milhões de anos atrás.
O Microraptor e o novo fóssil foram apenas duas das
descobertas interessantes dessa Província chinesa. Um
dos achados mais espetaculares é um dinossauro considerado ancestral do grande carnívoro Tyrannosaurus rex. O
Dilong paradoxus é uma curiosa versão ancestral e emplumada do famoso dino matador.
A descoberta mais nova foi publicada anteontem na revista "Science" (www.sciencemag.org) também por Fucheng Zhang e Zhonghe Zhou: um fóssil de pássaro, com
penas, de 121 milhões de anos de idade, possivelmente a
ave mais antiga fossilizada antes do nascimento.
O embrião estava preservado dentro de uma estrutura
oval com cerca de 35 mm por 20 mm, embora não se tenha
conseguido notar a existência de uma casca de ovo. A posição do fóssil lembra a de um embrião em estágio tardio
de desenvolvimento, mas ainda não perto de sair do ovo.
O embrião de ave fossilizada apresenta características
que lembram as aves primitivas como a que os mesmos
pesquisadores descreveram no periódico "Nature" um dia
antes, conhecidas como enantiornitinas.
O caráter primitivo do embrião também aparece na ausência de um "dente", uma estrutura na parte de cima do
bico usada pelas aves de hoje para quebrar a casa do ovo,
que desaparece logo depois do nascimento.
O aspecto de "elo perdido" do fóssil também está presente no fato de ele ser "precoce", isto é, de nascer razoavelmente bem desenvolvido, completo com penas e já capaz
de se mover e de se alimentar independentemente. Os
cientistas afirmam que esse tipo de ave surgiu antes de outras mais vulneráveis, nas quais os filhotes nascem praticamente pelados, com cérebros menores e menos capazes de
se virar no mundo primitivo.
Segundo Fucheng Zhang e Zhonghe Zhou, há estudos
que indicam que certos dinossauros também se desenvolviam desse modo "precoce", justamente de espécies consideradas parentes próximas dos pássaros.
Já faz algum tempo que os pesquisadores associam as
aves aos dinossauros. Ainda se discute se os dinos teriam
sangue frio (como os répteis de hoje, que não regulam a
temperatura do corpo) ou sangue quente; talvez os mais
próximos entre eles tenham tido sangue quente.
E já faz algum tempo que os fósseis chineses têm trazido
novas e importantes contribuições para o debate. A propósito, se o tipo de descoberta que foi revelado nas duas últimas semanas puder servir de termômetro, novos achados
espetaculares certamente estão no horizonte.
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