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Trauma por violência afeta 6% em SP
Pesquisa revela parcela da população da capital com transtorno mental induzido por episódios de agressão ou ameaça
Cientistas vão investigar neurologia dos pacientes de síndrome comum em áreas de conflito militar; estudo vai coletar DNA de vítimas
RAFAEL GARCIA
DA REPORTAGEM LOCAL
"No período de um ano, de
6% a 10% da população da cidade de São Paulo sofre de um
problema de saúde mental relacionado a algum episódio de
violência." Com essa frase, o
psiquiatra Jair Mari, da Unifesp (Universidade Federal de
São Paulo) resume o impacto
que episódios como roubos e
agressões têm sobre o comportamento dos paulistanos.
Os números saíram de um levantamento epidemiológico
com 2.500 pessoas na capital
paulista, articulado pelo pesquisador e realizado pelo Ibope. Mari é especialista em
TEPT -transtorno do estresse
pós-traumático-, expressão
criada por psiquiatras americanos para caracterizar uma síndrome comum em veteranos
de guerra e habitantes de zonas
de conflito militar. Esse problema afeta os 6% dos paulistanos
aos quais Mari se refere.
Cerca de um quinto dos indivíduos que passam por episódios como estupro ou seqüestro-relâmpago desenvolvem o
TEPT, diz Mari. "A pessoa passa a ter "flashbacks" da situação
e a mente é invadida por pensamentos ou imagens do que
aconteceu", descreve. "É como
se houvesse uma desregulação
da atividade mental da pessoa.
Obsessivamente, ela passa a reviver aquelas imagens, como se
fossem reais de novo, reagindo
emocionalmente."
Os resultados preliminares
da pesquisa, que foram apresentados em um seminário na
Unifesp no sábado passado, serão somados também a um levantamento que o Ibope está
fazendo no Rio de Janeiro, com
mais 1.500 pessoas. Aqueles
que relatam já ter passado por
um episódio crítico de violência são convidados pelos pesquisadores a passar por mais
uma bateria de exames.
A intenção, diz Mari, é ir
além do levantamento epidemiológico. Com um projeto
aprovado no programa Institutos do Milênio, do CNPq, Mari
conseguiu reunir um pequeno
exército de cientistas para
aprofundar a análise do TEPT
na realidade brasileira.
"Nós dividimos as áreas estudadas em vários estratos, de
acordo com a taxa de homicídios em cada um deles, porque
queremos também fazer um
estudo "ecológico". Queremos
relacionar a situação dos indivíduos com dados sociais."
À medida que o levantamento vem sendo feito, os entrevistadores do Ibope coletam também amostras de saliva, de onde serão extraídos dados de
DNA. Na etapa final do projeto,
pesquisadores farão um mapeamento para tentar descobrir quias genes podem influenciar a suscetibilidade ao
estresse pós-traumático.
"O transtorno tem origem
em muitos fatores, e cerca de
30% deles são genéticos", diz
Camila Guindalini, geneticista
que coordenará os testes na
Unifesp. Segundo ela, será possível fazer análise genética em
mais de 2.500 dos entrevistados, o que significaria o maior
estudo já realizado sobre esse
mal. "Não tenho conhecimento
de nenhuma amostra tão grande e tão rica em detalhes", diz.
Comparando os genes das vítimas de estresse pós-traumático com o de pessoas que passaram por situações de violência mas não desenvolveram o
trauma, o estudo pode ajudar
orientar a pesquisa de novos
medicamentos. Hoje, o tratamento receitado por psiquiatras é a terapia comportamental, mas mas com freqüência se
usam antidepressivos. O método tem eficácia razoável, mas
ainda não há drogas psiquiátricas com efeito mais específico
sobre os sintomas do TEPT.
Além do DNA, os cientistas
estão olhando para a fisiologia
cerebral das pessoas que desenvolvem o transtorno. O grupo espera confirmar a tese de
que o transtorno está ligado a
uma redução no hipocampo,
uma estrutura cerebral relacionada à memória. "Verificamos
uma redução pequena, de cerca
de 5% a 10%", diz Andréa Jackoswki, que coordena essa parte do estudo. Ainda não é possível, porém, saber se isso está
envolvido na causa do transtorno ou se é sua conseqüência.
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