|
Rodada Doha, o Fla-Flu que não terminou
CLÓVIS ROSSI
COLUNISTA DA FOLHA
Rodada Doha não é exatamente uma expressão capaz de
mobilizar multidões. Não obstante, ganhou caudaloso espaço na mídia brasileira -e um
pouco menos na internacional- nos últimos 15 dias.
Há duas explicações. A primeira: a rodada discute o que
fazer com tudo o que o ser humano produz e comercializa
entre fronteiras, de automóveis
a aviões, de melões a software.
No ano de 2006, o último para o
qual há estatísticas definitivas,
o comércio mundial de mercadorias alcançou US$ 8 trilhões,
quase oito vezes o tamanho da
economia brasileira à época.
Segunda explicação, ao gosto
brasileiro: desde que foi lançada em 2001 na capital do Qatar
(daí o nome da rodada), a negociação transformou-se em uma
espécie de Fla/Flu entre o
mundo rico e os países pobres
e/ou emergentes.
Os países pobres/emergentes lutavam para abrir o mercado agrícola dos países ricos, defendido por uma formidável pilha de subsídios, tarifas de importação estratosféricas e outras barreiras, como, por exemplo, a sobretaxa de US$ 0,54
por galão de etanol que os EUA
importam do Brasil.
Já o mundo desenvolvido
queria que os emergentes reduzissem mais as suas tarifas de
importação de bens industriais.
Durante sete anos, a discussão
girou em torno desse eixo, com
uma multidão de detalhes técnicos paralelos ou complementares, absolutamente impenetráveis para o mortal comum
-e, não raro, para muitos dos
negociadores.
Como não se saía do lugar,
Pascal Lamy, diretor-geral da
Organização Mundial do Comércio, uma espécie de xerife
do comércio global, foi para o
tudo ou nada: convocou os ministros dos principais países da
OMC (no total são 153) para
uma maratona de encontros
em Genebra, onde fica a instituição. Ousou apresentar ele
própria uma proposta, o que é
inusual. Nem assim adiantou.
O Fla-Flu não terminou.
Com isso, perdem todos, porque a liberalização comercial,
desde que equilibrada, beneficia a todos. Mas o Brasil perde
mais porque, pelas contas da
OMC, seria o segundo maior
beneficiário da proposta Lamy,
depois da China. Além disso, ao
aceitar uma proposta que os ricos aprovaram, pareceu ter deixado o time dos pobres/emergentes, com inevitáveis divergências com parceiros antigos
como Índia e Argentina.
Texto Anterior: Hits da Web Próximo Texto: 6 lugares no mundo Índice
|