São Paulo, domingo, 03 de agosto de 2008

Rodada Doha, o Fla-Flu que não terminou

CLÓVIS ROSSI
COLUNISTA DA FOLHA

Rodada Doha não é exatamente uma expressão capaz de mobilizar multidões. Não obstante, ganhou caudaloso espaço na mídia brasileira -e um pouco menos na internacional- nos últimos 15 dias.
Há duas explicações. A primeira: a rodada discute o que fazer com tudo o que o ser humano produz e comercializa entre fronteiras, de automóveis a aviões, de melões a software.
No ano de 2006, o último para o qual há estatísticas definitivas, o comércio mundial de mercadorias alcançou US$ 8 trilhões, quase oito vezes o tamanho da economia brasileira à época.
Segunda explicação, ao gosto brasileiro: desde que foi lançada em 2001 na capital do Qatar (daí o nome da rodada), a negociação transformou-se em uma espécie de Fla/Flu entre o mundo rico e os países pobres e/ou emergentes.
Os países pobres/emergentes lutavam para abrir o mercado agrícola dos países ricos, defendido por uma formidável pilha de subsídios, tarifas de importação estratosféricas e outras barreiras, como, por exemplo, a sobretaxa de US$ 0,54 por galão de etanol que os EUA importam do Brasil.
Já o mundo desenvolvido queria que os emergentes reduzissem mais as suas tarifas de importação de bens industriais.
Durante sete anos, a discussão girou em torno desse eixo, com uma multidão de detalhes técnicos paralelos ou complementares, absolutamente impenetráveis para o mortal comum -e, não raro, para muitos dos negociadores.
Como não se saía do lugar, Pascal Lamy, diretor-geral da Organização Mundial do Comércio, uma espécie de xerife do comércio global, foi para o tudo ou nada: convocou os ministros dos principais países da OMC (no total são 153) para uma maratona de encontros em Genebra, onde fica a instituição. Ousou apresentar ele própria uma proposta, o que é inusual. Nem assim adiantou.
O Fla-Flu não terminou. Com isso, perdem todos, porque a liberalização comercial, desde que equilibrada, beneficia a todos. Mas o Brasil perde mais porque, pelas contas da OMC, seria o segundo maior beneficiário da proposta Lamy, depois da China. Além disso, ao aceitar uma proposta que os ricos aprovaram, pareceu ter deixado o time dos pobres/emergentes, com inevitáveis divergências com parceiros antigos como Índia e Argentina.


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