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Do total da frota brasileira de veículos, 10% são motocicletas e 74% são automóveis, que significam 56% dos custos
Moto representa 19% do gasto com acidentes
DA REPORTAGEM LOCAL
DA REDAÇÃO
Elas são 10% da frota e quase um
quinto dos gastos com os acidentes ocorridos no Brasil -19%.
Se esses índices já sugerem que
as motos são mais perigosas do
que os automóveis (74% da frota e
56% dos custos), a gravidade das
colisões mostra o risco: de cada
100 acidentes com motos, há vítimas em 71. Para automóveis, essa
proporção é de 7 para 100.
Em São Paulo, por exemplo, os
motoqueiros representaram 24%
das 1.526 mortes ocorridas em
2001 -ano utilizado como base
na pesquisa do Ipea.
"Chamaram a atenção [na pesquisa] o custo e a alta severidade
dos acidentes com os motociclistas. Principalmente porque é um
veículo de menor valor, o que faz
com que o custo do acidente esteja basicamente associado ao dano
ao motociclista", diz José Ribamar Góes, da coordenação executiva do estudo do Ipea.
"Os números chamam mais a
atenção pela presença maciça de
motoboys nas cidades e por ser a
frota que mais cresce no Brasil. Se
nada for feito, a tendência é que a
situação piore", diz o engenheiro.
Só no mês passado, três vítimas
de acidentes com moto deram entrada na ala de lesados medulares
do Instituto de Ortopedia e Traumatologia (IOT) do Hospital das
Clínicas de São Paulo, que participou da pesquisa. Entre os motociclistas que morrem, o local atingido costuma ser a cabeça. Dos que
sobrevivem, muitos quebram as
pernas, outros ficam paralíticos.
Estudo feito pela Escola de Enfermagem da Universidade de
São Paulo (USP), publicado no
início de 2001, mostra que, entre
motociclistas que tiveram alta,
55,5% sofreram lesões nas pernas.
Já entre os que morreram, 48,4%
tiveram lesões na cabeça.
Na última quarta-feira, Valdilho
de Oliveira Cruz, 24, entrou para a
primeira estatística. Ele ia do trabalho para o cursinho quando um
carro bateu de lado em sua moto,
numa rua da Lapa, zona oeste de
São Paulo. "Só vi que era um carro
preto", relatou no pronto-socorro
do IOT, com a perna cheia de pinos. Terá de interromper o trabalho e o cursinho por dois meses.
O vendedor Marcio Henrique
da Silva, 27, quase passou para a
segunda lista. No Dia das Mães,
voltava do interior paulista à noite
e se perdeu. Um carro o pegou
por trás, lançou-o no ar e arrastou
a moto. Ficará imobilizado por 90
dias. Não fosse a roupa de proteção e o capacete, teria morrido.
Sem volta
"O crescimento do uso de motos é um fato irreversível. São
Paulo tem um perfil de uso diferenciado, predomina o motoboy.
No restante do país, tem o mototáxi", afirma Luís Antônio Seraphim, coordenador da divisão de
transportes do Instituto de Engenharia (IE) de São Paulo e assessor técnico da presidência da CET
(Companhia de Engenharia de
Tráfego) paulistana.
"A expansão é preocupante. É
um veículo de alto risco, que é potencializado pelo mau uso e por
adaptações feitas pelos motoristas", afirma Seraphim. "Adaptações", explica o engenheiro, são
colocar um retrovisor menor ou
diminuir o guidão, por exemplo.
Como minimizar, portanto, os
danos e os acidentes? "Temos que
atuar em quatro fatores: humano,
veículo, institucional [as leis] e
via", afirma Seraphim.
"Podem existir políticas diferenciadas, políticas que se destinam ao quadro geral de motoristas e outras para um público específico, como os motoboys", opina
Góes. "As estatísticas já mostram
um crescimento no número de
acidentes com os motociclistas."
O veto ao artigo 56 do Código de
Trânsito Brasileiro -que proibia
a moto de circular entre os carros- "fragilizou a fiscalização",
diz. "Os motoqueiros se sentem
"donos" desse espaço."
Góes, do Ipea, concorda. "Os
motoboys ficam andando entre as
faixas, o que é uma situação potencialmente perigosa."
Para o pesquisador da CET e do
IE, algumas opções de atuação
nessas quatro áreas são evitar o
mau uso e modificações na moto
com a inspeção dos veículos, a regulamentação de serviços e da
profissão de motofrete, um processo mais rigoroso para conceder a habilitação, redução do prazo para a renovação da mesma e
cursos de reciclagem.
Além disso, ele sugere a criação
de uma faixa exclusiva à esquerda, próxima ao canteiro central,
nas vias expressas das cidades. Ele
cita o exemplo da avenida 23 de
Maio, uma das mais importantes
de São Paulo e que integra o chamado corredor norte-sul, principal ligação entre as regiões norte e
sul da cidade. "Temos até 1.400
motos por hora no horário de pico. E é uma roleta russa: o motoqueiro está sujeito a ser interceptado a qualquer minuto."
Mas faz uma ressalva. "Hoje, é
muito difícil implantar uma medida dessas em São Paulo, principalmente por conta da necessidade de criar uma grande rede de
transporte coletivo", explica. "Os
corredores projetados para ônibus são junto ao canteiro central,
do lado esquerdo da pista."
Perfil do motoboy
A expansão dos motoboys em
São Paulo foi retratada em uma
pesquisa feita pela CET em outubro de 2001 e divulgada no ano
passado. Dos 999 entrevistados,
66,6% informaram trabalhar com
motofrete; os demais afirmaram
que são motociclistas.
O perfil do motoboy de São
Paulo é formado por homens
(99,7% dos entrevistados) que
concluíram o segundo grau
-53,2%- e rodam até 150 quilômetros por dia (64,7%).
Considerando só os que declararam trabalhar com motofrete
(666 pessoas), 60,6% têm de 20 a
29 anos, 51,6% rodam de 100 a 200
quilômetros por dia e 50,4% possuem até cinco anos de habilitação. A moto de 53,8% dos motoboys tem até quatro anos de uso.
Para muitos jovens que se arriscam com as motos no trânsito,
atravessar a fileira de carros e retrovisores em alta velocidade é
adrenalina pura. A médica Julia
Greve, que coordenou o estudo de
custos no HC, diz que o gosto dos
motoboys pelo risco da velocidade se compara ao rapel dos adolescentes da classe média.
Ela critica a pressa que contamina pessoas e empresas e leva a lançar mão dos serviços de motoboy
para qualquer coisa, quando há e-mail, correio e Sedex.
"É uma economia pé-de-barro
que precisa ser revista", diz. "Estamos alimentando empresas que
contratam meninos e os incentivam a correr como loucos. Quando se acidentam, vão custar muito
ao Estado."
(ROBERTO PELLIM E AURELIANO BIANCARELLI)
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