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DANUZA LEÃO
Não-me-toques
O preconceito deve ser combatido, nisso estamos todos de
acordo. Não foi horrível quando,
em 89, disseram que se Lula fosse
eleito centenas de empresários
deixariam o Brasil? E nessas eleições, quando alguém levantou a
tese de que o candidato, por ser
ex-operário e não ter curso universitário, não poderia governar
o país, não foi um baita sinal de
preconceito? E não foi horrível a
declaração de Garotinho dizendo
que mandaria desinfetar o palácio antes de Rosinha tomar posse?
Foi, e ele talvez seja até processado por isso pelo PT. Com esses
exemplos, voltamos ao início: o
preconceito deve ser combatido
etc. etc.
Quando se ouve ou lê uma crítica cruel, de má-fé ou injusta sobre
alguém de quem gostamos ou que
simplesmente admiramos, o primeiro sentimento é de revolta e
raiva. Muito justo. Mas é fantástico observar como as mesmas pessoas que levantam a bandeira do
não-preconceito podem ser tão
preconceituosas -só que no sentido contrário.
De uns tempos para cá -mais
precisamente, desde o resultado
das eleições-, ficou proibido falar uma só palavra que possa parecer, de longe, uma crítica ao PT
em geral e a Lula e Marisa em
particular. Por mais que se diga,
da maneira mais sincera e simpática, que a mudança na vida do
casal vai ser radical e muitas vezes difícil, tem sempre quem ache
que é preconceito; assim não dá.
Se você não é filiado ao partido
desde a sua fundação, se disser
que o brinco que Marisa usou é
grande (ou pequeno), se fizer um
comentário sobre o nó da gravata
de Lula, que não estava bem feito,
ou que a risada dele é alta (ou
baixa) demais, é preconceito. E se
ousar -ousar- fazer um comentário sobre como irá proceder
o casal quando for jantar com a
rainha da Inglaterra (o que seria
um problema para qualquer
mortal), aí cai o mundo e 200 petistas de primeira hora -ou
não- vão dizer que você é preconceituosa.
Para eles, quem teve acesso ao
chamado mundo sofisticado e
glamourizado, viajou e conhece
as frivolidades da vida -que
mesmo inúteis, existes-, é imediatamente acusado de alguma
coisa. Se bobear, vão dizer que esse tipo de pessoa não tinha nem
direito a votar no petista. O que é
isso? Preconceito, e pesado.
Os eleitores de Lula votaram
nele para ver o Brasil mudar sob
todos os aspectos, inclusive neste.
Duvido que o novo presidente, de
origem humilde, tenha qualquer
preconceito quando for se encontrar com o presidente Bush, com o
imperador do Japão ou com David Rockfeller. Mas nem todos os
seus fiéis seguidores, cheios de
não-me-toques, se deram conta
disso.
Tenho a impressão de que
quem mais vai criar problemas
para Lula serão exatamente os
seus companheiros, aqueles que
não conseguem ver a diferença
entre um comentário feito com
boa vontade de uma ironia, uma
brincadeira de uma maldade; se
continuarem assim, vão mais
atrapalhar do que ajudar.
Além de serem extremamente
preconceituosos, falta a eles uma
coisa fundamental, sem a qual a
vida não pode ser vivida: humor.
E-mail - danuza.leao@uol.com.br
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