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DANUZA LEÃO
Outros Carnavais
Será que o Carnaval era
mesmo melhor do que agora,
ou o saudosismo é uma mania?
Não sei, mas que era divertido e
animado, lá isso era.
Havia os gritos de Carnaval,
sendo que o Caju Amigo, invenção de Carlinhos Niemeyer, era o
melhor de todos. Detalhe: a única
bebida servida era batida de caju.
Mas havia outros, onde menina
de família não entrava; os mais
famosos eram o Baile do Cabide
(onde os carnavalescos deixavam
a roupa na entrada), e o Baile da
Balança, para um público específico de advogados, juízes, desembargadores. Sempre à tarde, é
claro.
Uns 15 dias antes do Carnaval,
começava a dificílima tarefa de
escolher as fantasias, que eram
várias, confeccionadas por profissionais que só trabalhavam nessa
época.
A primeira festa de verdade era
o baile do Havaí, no Iate Clube,
onde o traje mais adequado era a
havaiana, claro -saia de ráfia e
soutien colorido- ou o pareô.
Um colar comprado no camelô da
esquina, uma flor na cabeça, a pele bem queimada -o que em fevereiro era elementar- e pronto.
Tinha também o baile do Popeye
no Clube Marimbás, na beira do
mar de Copacabana, e o baile do
Vermelho e Preto no Clube Flamengo, um verdadeiro delírio;
quando a orquestra -é, os bailes
eram animados por orquestras-
atacava de "Uma Vez Flamengo,
sempre Flamengo", a multidão
vestida de vermelho e preto se
acabava. E tem mais: mesmo
quem não era Flamengo cantava
com fervor, como se fosse verdade
-e naquela hora até era-, "Flamengo até morrer, eu sou".
Grande festa, essa.
Aí Guilherme Araujo inventou
o baile do Pão de Açúcar, o mais
lindo de todos, no Morro da Urca.
A fantasia era livre, e não passava
pela cabeça de ninguém ir de bermuda e camisa. Não, era sempre
uma produção; aliás, uma altíssima produção, onde rumbeiras
sambavam abraçadas a piratas e
odaliscas a índios de cocar. Atores
e atrizes de novelas, intelectuais,
socialites, estrangeiros famosos,
todo mundo tomava o bondinho
-ah, essa festa era maravilhosa e
ninguém pensava em ir embora
antes de o sol nascer. Quem ia
com o namorado saía sozinha, e
quem ia sozinha saía com um namorado novo. Ótimos tempos, esses.
Todos os anos havia uma safra
de músicas novas; "Quanto riso,
oh, quanta alegria, mais de mil
palhaços no salão", lembra?
Grande Zé Keti. Todo mundo sabia as letras de cór e todo mundo
cantava. Além disso, durante o
dia, tinha as bandas e os blocos,
que não dava para não ir. Como é
que a gente aguentava? Não sei
como, mas aguentava.
A grande diferença? O carnaval
era levado a sério e todas as pessoas, de todas as idades e classes
sociais, participavam: quem era
famoso ganhava convites para os
bailes, quem era pobre saía num
bloco de sujo ou ia ver o desfile
das Escolas de Samba.
Para o desfile, era só chegar cedo, já que não tinha essa história
de pagar.
Todo ano era montada - e depois desmontada - uma arquibancada; não tinha água, nem
sanduíche, nem banheiro, e ninguém se movia para não perder o
lugar. Como as pessoas conseguiam? Não sei mas conseguiam,
e detalhe: o
desfile frequentemente terminava ao meio dia do dia seguinte.
Quem teve a glória de assistir ao
desfile de 69 (ou era 70?), quando
a Portela foi a última escola a desfilar, nunca se esqueceu: no final,
com o dia já claro, o povo invadiu
a avenida e foi sambando atrás,
cantando "Foi um rio que passou
em minha vida", do portelense
Paulinho da Viola.
Sinceramente: dá para achar
alguma graça, hoje, ver as escolas
de um camarote cheio de gente
querendo aparecer na foto, vestindo a camiseta do patrocinador? Não mesmo.
Mas tudo bem; vamos deixar
para reclamar quando os enredos
das escolas forem uma lata de cerveja ou um celular.
Mudou o carnaval? Mudou. E
era mais divertido?
Quer saber mesmo? Era sim.
E-mail - danuza.leao@uol.com.br
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