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Estátua de santo leva discórdia a Caraguatatuba
Maioria dos católicos é a favor da estátua no morro; evangélicos não acham correto usar verba pública em imagem religiosa
Ibama vetou imagem de 15 m de santo Antônio em área de preservação ambiental
PAULO SAMPAIO
DA REPORTAGEM LOCAL
Em nome de Deus, um beato
de Caraguatatuba, no litoral
norte de São Paulo, encaminhou um e-mail ao chefe do escritório regional do Ibama,
Leonardo Teixeira, avisando-o
de que ele iria "ajustar as contas lá em cima", caso insistisse
no embargo de uma imagem de
santo Antônio instalada no alto
de um morro da cidade.
Com 15 metros de altura e aspecto de alegoria de escola de
samba, a estátua está no terço
superior do morro e, de acordo
com o código florestal, em uma
área de preservação ambiental.
Candidato à reeleição, o prefeito José Pereira de Aguilar
(DEM) havia conseguido autorização do Departamento Estadual de Proteção dos Recursos
Naturais (DEPRN) para pavimentar o caminho que leva ao
topo do morro, que é o principal ponto turístico da cidade e
também local usado por esportistas para saltos de asa delta.
A autorização, contudo, não
era extensiva à instalação da
imagem, diz Teixeira. Ele afirma que a melhoria do acesso é
considerada "obra de utilidade
pública". "Não sou contra nem
a favor de nenhuma religião,
mas defendo a causa ambiental.
A obra é irregular, tem de ser
embargada."
Na prefeitura, o procurador
Cassiano Ricardo da Silva Oliveira apresenta um laudo do
DEPRN dizendo que contém
autorização para a instalação
do santo Antônio. Assinado pelo engenheiro florestal Luciano
Gois em 2 de junho, o laudo
apenas constata a obra de implantação da imagem.
O DEPRN, através de sua assessoria, afirma que sua função
não é autorizar obras como a
instalação da imagem, e sim garantir a preservação da vegetação e verificar se há processo de
erosão na estrutura do solo.
A promotora Elaine Taborda
investiga o caso e vê duas possibilidades em caso de constatação de irregularidade. "Ou a
prefeitura remove a imagem ou
vamos entrar com uma ação civil pública", diz.
Substituição
Na verdade, já havia uma estátua de santo Antônio no morro, em um local um pouco abaixo da que foi instalada agora.
Mas a anterior, segundo informação da prefeitura, foi retirada na década de 80, com a promessa da administração à época de substituí-la por outra.
A promessa é um dos argumentos usados pelo prefeito
atual para defender a permanência do santo onde está.
Ocorre que, segundo Teixeira, a
imagem antiga não tinha mais
de dois metros.
Para quem chega de fora, parece curioso que uma imagem
de olhos arregalados, cabelos
grudados na cabeça e bochechas avantajadas possa causar
tamanha polêmica.
Assinada pelo artista plástico
Irineu Migliorini, autor de uma
estátua da liberdade em Joinville, entre outras obras, a imagem foi inaugurada no dia 13 de
junho, data do santo padroeiro
da cidade. A maioria dos católicos está do lado do prefeito; os
evangélicos, que são 20% da
população de 80 mil habitantes, não acham correto usar
verba pública para erigir uma
imagem religiosa.
O pároco Marcos Vinícius
Rosa desafia quem queira remover a estátua dali. "Quero
ver quem vai tirar o santo Antônio do morro." Ele afirma que
"há mais de 15 anos a população
pedia um Santo Antônio ali".
Já o pastor evangélico Waldir
Carvalho diz que "quem mexe
com religião tem que agradar a
todos". Para Carvalho, o prefeito tirou recursos que poderia
investir na população carente
para usar na estátua.
O prefeito não recebe a Folha pessoalmente. É representado por sua chefe de gabinete.
Conversa no salão
Em um salão de cabeleireiro
no shopping da cidade, a maioria evangélica debate sobre a
instalação da imagem.
"Ali tem dinheiro do budista,
do espírita, de todo mundo", indigna-se Jéssica Mendes, 22.
A vendedora Maria do Carmo Deodato, 43, diz que a luta
dos evangélicos "é para que a cidade não seja consagrada a uma
imagem só". "Isso é monopólio
religioso", alega.
Independentemente de religião, diz Diné Ramos, 42, "a estátua é muito esquisita".
Depois da missa das 15h, um
grupo de senhoras católicas
aceita subir o morro para posar
ao lado da estátua. Muito falantes, elas debatem o tema na
maior alegria.
"Não sei por que encasquetaram com o pobre do santo Antônio...Olha que lindo!", diz a
aposentada Nanette "do Zizo"
de Oliveira, 77.
Referindo-se a uma imagem
de Iemanjá instalada na praia
da cidade, Nanette diz que integrou um abaixo-assinado pela
permanência da rainha do mar
na umbanda e no candomblé
no local. "Assinei mesmo, a
imagem é linda. Tá lá, não faz
mal a ninguém!"
A professora Marília Rocha,
50, explica que é devota de santo Antônio desde a infância.
"Você acredita que meu pai
morreu no dia 13 de junho (dia
do santo)? Disse a ele: "Pai, você
conseguiu'!" "Que chique", comenta a professora aposentada
Maria Bellato, 69.
A funcionária pública Maria
Genes, 63, roga uma praga leve:
"O (presidente Humberto de
Alencar) Castello Branco aboliu os feriados de santo Antônio, são Pedro e são João e você
viu o que aconteceu? Ele foi
embargado no céu. Morreu em
um desastre de avião."
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