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PASQUALE CIPRO NETO
"Quando se sabe por que se sabe..."
Pouco importa se há ou não há ponto de interrogação. Não é esse o motivo da opção por "por que" ou "porque"
REENCONTRO O PROFESSOR Armênio Uzunian, antigo companheiro de labuta -a sagrada labuta de ensinar/aprender/apreender. Médico que preferiu a sala
de aula, Armênio é dos tantos professores de cursinho (sim, de cursinho) que privilegiam o pensamento,
o raciocínio, a razão do que se ensina
e apre(e)nde (biologia, no caso dele).
Referi-me ao encontro com Armênio porque ele me disse que
mencionou a seus alunos uma frase
que escrevi no fim da coluna de 19 de
junho ("Quando se sabe por que se
sabe, a coisa melhora muito, não?").
Se entendi bem, Armênio me disse
que a colocou na lousa para que seus
alunos nela pensassem. Aí o semáforo ficou verde, e precisei seguir meu
caminho, já pensando em algumas
das mensagens que eu recebera de
leitores quando escrevi a tal coluna.
Esses leitores se referiam à forma
"por que", empregada em "Quando
se sabe por que se sabe...". "Esse "por
que" não seria "porque", professor?",
perguntaram alguns leitores. Poderia ser, sim, mas não para expressar
a idéia que eu queria transmitir.
Vejamos, pois, que diferença há
entre as duas construções. De início
é preciso lembrar que a expressão
"por que" pode equivaler a "por que
razão/motivo", "por qual razão/motivo". Quando se diz, por exemplo,
algo como "Não sei por que ela fez isso", emprega-se "por que" como
equivalente a "por que motivo/razão", "por qual motivo/razão" ("Não
sei por qual razão ela fez isso").
Essa é uma velha "dica" para identificar um dos casos em que se escreve "por que" ("separado", como se
costuma dizer). Como se vê, pouco
importa se há ou não há ponto de interrogação no fim da frase. Não é esse o motivo da opção por "por que"
ou "porque". Na coluna de 19 de junho, optei por "por que" justamente
porque queria dizer que, quando se
sabe por qual razão/motivo se sabe
(ou quando se conhece a razão pela
qual se sabe), a coisa melhora muito.
E como ficaria a frase com a forma
"porque" ("junto", como se costuma
dizer)? Antes, parece razoável vê-la
e lê-la: "Quando se sabe porque se
sabe...". Que tal? Já desconfia de algo? Suponha que à pergunta "Por
que/Como você sabe isso/disso?" alguém respondesse o seguinte: "Sei
porque sei. Não vou dizer como fiquei sabendo". Já percebeu?
Agora não se diz mais que se sabe a
razão pela qual se sabe ou que se sabe por qual razão se sabe. Ocorre em
"Sei porque sei" algo semelhante ao
que ocorre em "Quero porque quero", "Faço porque faço", "Vou porque vou" etc. A razão de saber é saber, a de querer é querer, a de fazer é
fazer e a de ir é ir. No fundo, no fundo, quem diz coisas como essas ou
não tem razão ou não quer revelar a
razão para saber, querer, fazer, ir etc.
Bem, a esta altura parece conveniente colocar mais um pouco de pimenta na questão da (indevida) associação entre a presença/ausência
do ponto de interrogação e a opção
por "por que" ou "porque". Veja este
exemplo: "Será que ela ficou zangada porque Pedro disse que ela não fica bem com esse tipo de roupa?".
A frase termina com ponto de interrogação e o "porque" é "junto", já
que o que se pergunta não é o motivo
de Pedro ter dito o que disse. O que
se pergunta é se o motivo da zanga é
o fato de Pedro ter dito o que disse.
Como se vê, pode haver mais diferenças entre "por que" e "porque"
do que talvez se suponha. É isso.
inculta@uol.com.br
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