|
Texto Anterior | Índice
GILBERTO DIMENSTEIN
O melhor pilar de Ciro
Marta Suplicy atacou, na semana passada, o envolvimento da atriz Patrícia Pillar na
campanha presidencial de Ciro
Gomes, seu namorado. "Existe algo mais acintoso do que o uso descarado da mulher para servir aos
propósitos eleitorais do marido?",
perguntou.
A frase deixa mal o suposto explorador, acusado de machista e
de interesseiro, e a suposta explorada, que não se impôs como mulher. Dá a entender que Ciro Gomes explora a mulher, servil, como um objeto eleitoral. Diante
das óbvias implicações da pergunta, a prefeita tentou voltar
atrás, dizendo-se que não se referia à Patrícia, mas a polêmica já
estava armada. Ela deve ter-se
lembrado de que muitas vezes foi
vítima de insinuações justamente
por ser mulher; de resto, quem lhe
abriu as portas da política foi o
ex-marido, Eduardo Suplicy, que
lhe serviu de cabo eleitoral.
Descontadas as maledicências,
o fato óbvio é que Patrícia Pillar
assegura valiosos pontos de popularidade para Ciro Gomes, especialmente entre o público feminino. A ajuda é medida pelas pesquisas: o Vox Populi captou que
70% dos eleitores consideram que
a atriz melhora a imagem política do namorado.
Tivesse mais força entre as mulheres, Lula estaria numa situação bem mais confortável nesta
sucessão. A mais recente pesquisa
Datafolha, divulgada na semana
passada, mostra uma forte disparidade: 40% dos eleitores preferem o candidato do PT, percentagem que desce para 27% entre as
eleitoras.
Pode-se dizer que Lula não caiu
no gosto feminino - essa foi uma
das razões para o comitê de campanha do partido ter pedido a
ajuda de Marta Suplicy.
"Patrícia é o ideal da mulher
brasileira", analisa o publicitário
Washington Olivetto com base
nas pesquisas que orientam os
anúncios da W/Brasil, segundo as
quais o sonho da mulher é ser independente, forte e bonita, unindo a realização profissional, à
afetiva e à estética. Assumir a
doença, exibindo a falta de cabelos, cercou Patrícia de uma imagem heróica.
Quem conhece Patrícia sabe
que sua simplicidade não é uma
estratégia de marketing -e ela
transmite isso pelo vídeo.
A importância eleitoral de Patrícia reflete mudanças estruturais na sociedade brasileira, em
que a mulher desempenha um
papel cada vez mais relevante.
As mulheres já são maioria no
ensino médio e superior e têm notas melhores do que as dos homens. Cada vez mais chefiam famílias e ganham altos cargos em
empresas. Estão conseguindo diminuir a disparidade salarial em
relação aos homens. De cada dez
novos empregos criados na região
metropolitana de São Paulo, sete
estão nas mãos masculinas. Mais
educação, emprego e salário significa mais poder -e também
novos conflitos.
Não é à toa que tradicionais revistas dedicadas ao público feminino são forçadas a se reciclar,
oferecendo mais atualidades e informações sobre trabalho.
Se o ideal é o "padrão Patrícia"
-beleza, independência e força- , as mulheres, como mostram as pesquisas que orientam
os candidatos, sentem-se isoladas,
incompreendidas e culpadas por
não saberem conciliar vida familiar com vida profissional. Acumulam a dureza do trabalho com
a rotina doméstica. Sofrem de um
crônico estresse. Estão morrendo
mais de câncer do pulmão e de infartos. Mesmo simbolicamente, a
doença de Patrícia reforça a identificação com os novos padrões da
saúde feminina decorrentes do estresse -ou seja, transmite fragilidade.
A dureza é mais aguda para os
pobres em geral e para a mulher
pobre em particular; é baixa a
oferta de vagas nas creches e nas
pré-escolas -tema que, aliás, por
enquanto, só vi com destaque no
programa do PT.
Personagens como Patrícia Pillar servem de ponte, por mais
frágil que seja, entre a política e os
interesses femininos, pouco visíveis na agenda dos candidatos.
PS - A verdade é que Ciro Gomes
tem poucos rostos de aliados que
pode mostrar, sem preocupação,
no vídeo. Um deles perdeu o cargo
de coordenação da campanha na
semana passada: José Carlos
Martinez tinha relações pouco
transparentes com PC Farias, o
tesoureiro da campanha de Collor. Paulinho passa mais tempo
dando explicações sobre sua
atuação como dirigente sindical
do que fazendo campanha. Leonel Brizola é uma figura carimbada, símbolo dos arcaísmo ideológico. Antônio Carlos Magalhães é
um dos símbolos do coronelismo.
Roberto Jefferson foi defensor de
Collor até o final. Nesse ambiente,
Patrícia é um oásis visual.
E-mail -
gdimen@uol.com.br
Texto Anterior: Violência: Três da mesma família morrem no interior de SP Índice
|