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ÉTICA NA PROFISSÃO
Categoria vai votar em assembléia proposta que torna obrigatória revelação de casos que envolvam violência
Psicólogos reavaliam quebra de sigilo
FABIANE LEITE
DA REPORTAGEM LOCAL
Uma proposta polêmica está em
debate nos conselhos regionais de
psicologia e será colocada em votação em assembléia da categoria
em dezembro. Pela minuta do novo código de ética em elaboração,
o psicólogo terá o dever de quebrar o sigilo profissional quando
pacientes admitirem ter sofrido
ou cometido uma violência.
A proposta veio de um fórum
preliminar da categoria, ocorrido
em novembro de 2003, e dificilmente será derrubada, segundo
avaliação de dirigentes dos próprios conselhos.
Atualmente, o código de ética
da categoria, que é de 1987, deixa a
decisão a critério do psicólogo. A
quebra do sigilo só é admissível
quando a gravidade do fato delituoso criar um "imperativo de
consciência" ao profissional. Ou
seja, é um direito, e não um dever.
Segundo Ana Bock, eleita presidente do conselho federal da categoria -assumirá em dezembro-, serão necessárias regulamentações posteriores sobre o assunto. Mas ela considera que o
paciente sempre deve ser avisado
das regras pelo psicólogo.
"A decisão deixa de ser individual e passar a ser um princípio
ético. Os profissionais têm medo
de denunciar. Agora [na proposta
que será votada], há um respaldo", afirma Elisa Zaneratto Rosa,
presidente da comissão de ética
do Conselho Regional de Psicologia do Estado de São Paulo.
Uma das intenções da mudança
é regulamentar melhor a questão
do sigilo, tanto para evitar possíveis abusos como omissões.
O código prevê, para todas as
infrações, punições que vão de
advertência à cassação do registro. Sua reformulação é debatida
desde 1998 em congressos da categoria, que já reúne 130 mil profissionais registrados. Em novembro de 2003 houve um fórum sobre ética em Brasília, que acolheu
sugestões de todas as instâncias
regionais dos conselhos.
Segundo Rosa, o código está defasado em relação à legislação que
apareceu depois de sua elaboração, como a própria Constituição,
o Estatuto da Criança e do Adolescente, o Código de Defesa do
Consumidor e o recente Estatuto
do Idoso.
Além disso, afirma ela, o código
não acompanhou a expansão da
psicologia em outras áreas, como
a de pareceres sobre a guarda de
crianças. Como diz a psicóloga, os
profissionais estão em todos os
lugares, lidam com diferentes populações e estarão cada vez menos entre as paredes do consultório.
"É uma mudança na caracterização da profissão", diz Rosa sobre as alterações no código. "Fica
clara a bandeira do compromisso
social da psicologia."
"Tudo aquilo que é ilícito deve
ser denunciado", afirma o advogado do conselho regional Marcelo Del Chiaro. "O que se está querendo é nortear um princípio
quanto a isso. Os profissionais estão perdidos. Os conselhos, como
autarquias, sofrem pressão do
Ministério Público."
Certo ou errado?
Casos sobre a quebra de sigilo
que chegaram à comissão de ética
do conselho regional de São Paulo
mostram diferentes posturas dos
profissionais e que é necessária
uma regulamentação, aponta Rosa. Os personagens foram embaralhados para dificultar sua identificação.
Em um dos casos, o psicólogo,
ao ter contato com um parente de
vítima de agressões e ameaças,
contou tudo a ele, na expectativa
de que agisse contra a situação.
A paciente relatava a violência
ao profissional, que a orientava,
mas a vítima não tomava providências e corria sérios riscos.
Em outro caso, em uma instituição que atende crianças, vários
psicólogos ouviram relatos, de
uma delas, sobre supostos abusos
praticados por adultos. Rosa conta que ninguém fez nada, dizendo
que se tratava apenas de uma suspeita. Mas depois ficou provado
que era tudo verdade.
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