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SAÚDE
Ministério Público dará 30 dias para Conselho Federal de Medicina se pronunciar sobre teste suspeito de matar pacientes
CFM será obrigado a explicar morte cerebral
MAURÍCIO TUFFANI
FREE-LANCE PARA A FOLHA
O procurador da República Luiz
Carlos Weber, de Porto Alegre,
determinará ao CFM (Conselho
Federal de Medicina) que responda a diversas questões científicas
sobre a segurança de um exame
usado para diagnosticar morte cerebral. O prazo de resposta será de
30 dias após o recebimento.
O chamado teste de apnéia (veja
quadro), que consiste em desligar
por dez minutos os aparelhos de
suporte à respiração de pacientes
em coma, é apontado por pesquisadores do Brasil e do exterior como capaz de causar a morte em
vez de diagnosticá-la.
O Ministério Público Federal tomou a decisão em resposta a um
requerimento encabeçado pelo
advogado Celso Galli Coimbra, de
Porto Alegre, irmão de Cícero Galli Coimbra, professor de neurologia da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), autor de um
estudo que apontou riscos no teste de apnéia.
O estudo de Coimbra, que também é médico do Hospital do Servidor Público Municipal de São
Paulo, foi publicado em novembro de 1999 na revista científica
"Brazilian Journal of Biological
and Medical Research". Segundo
ele, o teste é aplicado em cerca de
10 mil jovens brasileiros por ano,
vítimas de traumatismo craniano
por acidentes ou agressões.
"O CFM deve satisfações transparentes à sociedade", disse o advogado. O requerimento encaminhado à Procuradoria contém 40
questões, e afirma que a opção pelo teste de apnéia contraria o princípio que obriga todo médico a
"utilizar todos os meios disponíveis de diagnóstico e tratamento a
seu alcance em favor do paciente", previsto pelo Código de Ética
Médica. "Não há em nossa solicitação ao CFM nenhum juízo prévio sobre essa questão", afirmou o
procurador Weber.
Importantes defensores do teste
de apnéia reconhecem que não há
consenso sobre o exame, como o
neurologista holandês Eelco Wijdicks, da clínica Mayo, em Rochester (EUA), em estudo publicado em janeiro de 2002 na revista
científica médica "Neurology".
Autorização da família
As 40 questões já haviam sido
enviadas ao conselho no dia 14 de
agosto pela Assembléia Legislativa do Rio Grande do Sul, que realizou, em maio deste ano, um seminário sobre o assunto.
Foi enviado também o pedido
para que o teste de apnéia só seja
executado com autorização da família dos pacientes após o esclarecimento sobre os supostos riscos,
além de solicitar a revisão da Resolução CFM 1.480, de 1997, que
define os procedimentos para a
declaração de morte cerebral.
O neurologista Coimbra afirma
que, em vez de submeter pacientes em coma ao teste de apnéia,
deveria ser aplicada a chamada
técnica de hipotermia cerebral,
que consiste em resfriar o organismo para reduzir a pressão no
interior do crânio, que dificulta a
circulação de sangue no cérebro.
Os países em que houve fortes
contestações aos critérios de morte cerebral, como Japão, Alemanha e Dinamarca, são aqueles em
que os debates sobre o assunto foram cobertos pela mídia e tiveram
amplitude nacional, afirmou Masahiro Morioka, professor da
Universidade de Osaka, em um
artigo publicado em 2001 na revista de bioética "Hastings Center
Report".
Os primeiros critérios de morte
cerebral foram estabelecidos em
1968 por um comitê da Universidade Harvard, nos EUA. No ano
anterior, Christian Barnard realizou na África do Sul o primeiro
transplante de coração.
Em um estudo publicado em
1997 na revista "Social Science &
Medicine", a pesquisadora Mita
Giacominique afirma que os interesses da área de transplantes
-"talvez mais de rins do que de
coração"- influenciaram a elaboração dos critérios pelo comitê.
Vários neurologistas ouvidos pela
Folha concordaram com essa
afirmação.
O médico José Medina Pestana,
especialista em transplante renal e
presidente da ABTO (Associação
Brasileira de Transplantes de Órgãos), disse não acreditar que o
questionamento do teste de apnéia traga prejuízos para a captação de órgãos.
"Nós [os transplantadores] não
participamos de diagnósticos de
morte cerebral. Nada mudará em
nosso trabalho se os critérios vigentes eventualmente vierem a
ser substituídos por outros", declarou Pestana.
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