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ARTIGO
Mapa da desigualdade
PAULA MIRAGLIA
ESPECIAL PARA A FOLHA
NUM CENÁRIO de queda expressiva dos homicídios no Estado
nos últimos cinco anos, a publicação do mapa da distribuição
dos crimes na cidade de São
Paulo, baseado em dados da Secretaria da Segurança Pública,
ganha ainda mais importância.
Em primeiro lugar, fica evidente o valor da informação,
sobretudo quando o tema são
dados relativos à criminalidade. Ainda que a pasta questione
a divulgação desses dados
-apontando a possibilidade de
estigmatização de determinadas regiões, possível benefício
da especulação imobiliária ou
eventual prejuízo das ações policiais-, essas são informações
fundamentais para a formulação de políticas públicas que
extrapolem a área da segurança, assim como para revelar a
economia desigual de riscos em
São Paulo.
O mapa traz uma série de informações conhecidas, expondo disparidades profundas na
cidade e mostrando como a capital paulista foi eficiente na
contenção dos crimes de natureza violenta, tais como homicídios e estupros, nas periferias
da cidade.
Mas os dados também mostram que essa não é uma associação imediata. Distritos com
níveis semelhantes de vulnerabilidade social não têm como
resultado as mesmas taxas de
homicídio, da mesma forma
que nem todos os bairros com
renda alta são alvos dos crimes
contra o patrimônio. O que pode, a princípio, parecer uma
equação óbvia, se apresenta como um problema mais complexo e diversificado, e está intrinsecamente ligado à geografia de
uma cidade fragmentada, onde
a segregação se dá também via
vitimização criminal.
Desse modo, fica claro como
o território é um elemento fundamental na elaboração de políticas de prevenção e combate
à criminalidade. É preciso compreender, a partir de cada localidade, as dinâmicas envolvidas
nas estatísticas criminais. A
presença do crime organizado
ou a grande circulação de armas de fogo, por exemplo, são
elementos determinantes para
altas taxas de homicídio. Por
outro lado, ruas pouco iluminadas e espaços desertos e deteriorados podem favorecer a
prática de roubo de carros ou
estupros.
Com efeito, se a ação policial
cumpre um papel essencial, um
diagnóstico territorializado pode subsidiar políticas de prevenção mais eficazes, plurais e
que envolvam outras áreas e
atores além da própria polícia.
Iluminação e melhoria da infra-estrutura urbana atendem
às demandas colocadas por certo tipo de crime; câmeras de vigilância em certos locais podem ser eficientes na prevenção de roubos de carro e furtos;
a recuperação de espaços públicos e a mobilização comunitária já se mostraram estratégias poderosas de prevenção.
Os exemplos são muitos e refletem o fato de que as múltiplas
versões da criminalidade pedem ações e políticas focadas.
São Paulo é uma cidade que
vem fazendo grandes investimentos -públicos e privados-
em segurança. Nas últimas
duas décadas, a criminalidade
foi responsável pela transformação progressiva da paisagem
da cidade, seja em regiões ricas
ou pobres. Reverter a disparidade que caracteriza a distribuição da segurança entre distritos deve ser entendido também como uma política urbana,
e parte de um projeto maior de
construção de uma cidade menos desigual, na qual a segurança seja um direito de todos.
Paula Miraglia é doutora em Antropologia Social
pela USP e diretora executiva do Ilanud (Instituto
Latino-Americano das Nações Unidas para a Prevenção do Delito e Tratamento do Delinqüente).
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