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ENTREVISTA
Para presidente de associação, verba deveria ser dez vezes maior
Orçamento antidrogas é insuficiente
DA REPORTAGEM LOCAL
A Inglaterra estabeleceu um
plano de redução do uso de drogas que vai consumir R$ 2 bilhões
por ano ao longo de uma década.
No Brasil, o orçamento anual da
Senad (Secretaria Nacional Antidrogas) é de cerca de R$ 10 milhões. E a política de drogas nem
sequer saiu ainda do papel.
"Precisamos, para começar, de
um orçamento no mínimo dez
vezes maior", diz o psiquiatra Ronaldo Laranjeira, presidente da
Abead, Associação Brasileira de
Estudos do Álcool e Outras Drogas. Em dois anos de programa, a
Inglaterra já reduziu o consumo
de cocaína, embora o de maconha
tenha aumentado.
A Abead está encerrando hoje
seu 15º congresso com a presença
recorde de 800 participantes e dezenas de especialistas nacionais e
estrangeiros. No geral, todos os
balanços que se referem a drogas
falam em aumentos: do número
de usuários, da violência, da corrupção e até mesmo das apreensões. Por outro lado, são poucas
as iniciativas comprovadamente
positivas. "No atacado, a impressão que se tem é que só tem piorado", diz Laranjeira. "Mas, no varejo, há muitos pequenos avanços."
A psiquiatra Analice Gigliotti,
da Santa Casa do Rio de Janeiro e
vice-presidente da Abead, disse
que o número de fumantes vem
caindo entre os adolescentes, mas
aumentando entre as meninas.
Em 1999, 30% dos rapazes fumavam, contra 20% das adolescentes. Hoje, 27% deles fumam, contra 24% das meninas.
O congresso da Abead é o primeiro depois que o governo decidiu manter a Senad no Gabinete
de Segurança Institucional.
Pelo programa original do PT, a
política de drogas ficaria com o
Ministério da Justiça. A polêmica
dividiu especialistas e a academia,
já que a Senad é dirigida por um
general, quando se pretendia uma
política mais voltada para a prevenção e o tratamento. Por quase
seis meses, o governo negociou
sem consultar a sociedade, embora a droga envolva a área segurança, profissionais de saúde, educadores, pais e adolescentes.
Segundo a direção da conferência, o fato de o evento se realizar
na Câmara Americana do Comércio não significou interferência
dos EUA nas teses do evento.
Neste ano, "o encontro destacou a importância da educação,
da comunidade e da mídia", lembra Ana Cecília Marques, coordenadora científica do evento.
"Ninguém tem a utopia de acabar com as drogas, mas, sim, reduzir os riscos para os jovens", diz
Laranjeira. Abaixo, trechos da entrevista que concedeu à Folha.
Folha - O sr. e seu grupo faziam
restrições à política de redução de
danos. Houve mudanças?
Ronaldo Laranjeira - Eu estava
na Inglaterra, em 86 e 87, quando
se iniciou a prática de troca de seringas para usuários de drogas injetáveis. Nós começamos o fornecimento de metadona para dependentes de heroína. Não se pode ser contra uma política que está dando resultados, mas quando
faltam evidências dos benefícios,
não concordamos que se faça só
por ideologia. O cigarro, por
exemplo, a pessoa só vai deixar de
correr risco se parar de fumar
mesmo, ficar abstinente. Mas
mesmo que não pare, não se deve
negar a ele os cuidados médicos
que necessita.
Folha - A questão das drogas sintéticas já preocupa os EUA e a Europa. E no Brasil?
Laranjeira - Elas serão o grande
desafio dentro de dez anos. São
drogas que não precisam ser
plantadas, nem colhidas nem
processadas, como acontece com
a maconha, a cocaína e a heroína.
Elas são produzidas em pequenos
laboratórios, e isso vai dificultar
muito mais a repressão. Nós vamos ter que ser mais criativos.
Folha - Um dos especialistas,
George De Leon, da Universidade
de Columbia, defendeu a importância das comunidades terapêuticas no tratamento. Elas funcionam
no Brasil?
Laranjeira - Quando bem dirigidas, são interessantes. No Brasil,
existem cerca de 2.000 -95%
têm funcionários mal treinados.
São baseadas muitas vezes na religião. Quando a comunidade não
tem uma estrutura eficiente, é a
visão religiosa que predomina. Os
evangélicos são os mais organizados nessa questão.
(AURELIANO BIANCARELLI)
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