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SAÚDE / GRAVIDEZ
Homens doam sangue para que possam se tornar pais
Vacina feita com células do sangue do marido ajuda mulheres a manter gestação
Com a imunização, o corpo da mulher passa a produzir anticorpos que identificam as proteínas de origem paterna no embrião
CLÁUDIA COLLUCCI
DA REPORTAGEM LOCAL
Muitos homens estão, literalmente, dando o sangue para
conseguirem ser pais. Uma vacina feita com células do sangue do marido promete fazer
com que mulheres que sofram
abortos recorrentes por fatores
imunológicos "segurem" a gestação até o final.
O aborto de repetição é caracterizado pela perda de duas
ou mais gestações antes da 20ª
semana. Afeta até 5% dos casais
em idade reprodutiva. Nesses
casos, uma das hipóteses é que
o organismo feminino reconhece o embrião como um "invasor" (por causa da carga genética do pai) e o expulsa.
Com a imunização, o corpo
da mulher passaria a produzir
anticorpos que identificam as
proteínas de origem paterna no
embrião e não mais o rejeita.
O tratamento é controverso
por falta de evidência científica
-não tem aprovação nem nos
EUA e nem na Europa-, mas
está disponível em oito Estados
brasileiros, com taxa média de
eficácia de 80%, segundo os
médicos que o adotam. No SUS,
apenas a Unicamp (Universidade Estadual de Campinas) oferece a terapia, com fila de espera mínima de seis meses.
Segundo o ginecologista Ricardo Barini, coordenador do
ambulatório de aborto recorrente da Unicamp, a causa mais
freqüente dos abortos de repetição é a rejeição do sistema de
defesa do organismo da mãe às
características do embrião herdadas do pai.
Ele explica que, na maioria
das gestações, essa adaptação
imunológica do corpo da mulher ao embrião ocorre normalmente. "Se o sistema imunológico da mulher não compreende a mensagem e não protege o
feto, a gravidez não se desenvolve. O organismo da mulher a
interpreta como se fosse uma
doença que estivesse tentando
agredi-lo", diz ele.
Barini reforça que, antes de
indicar a vacina, é preciso se
certificar de que o aborto tem
causa imunológica, descartando outros fatores como problemas genéticos, má-formação
do embrião e doenças infecciosas e uterinas. Ele também indica o tratamento em casos de
falhas sucessivas de implantação do embrião durante a FIV
(fertilização in vitro)
A alteração imunológica pode ser diagnosticada por meio
de exame (crossmatch) onde
são analisados o sangue da mulher e o do marido. Se o resultado der negativo (o que pode ser
sinal da incompatibilidade), é
indicada a vacina feita com
sangue (linfócitos) do parceiro.
Segundo o ginecologista Artur Dzik, diretor da Sociedade
Brasileira de Reprodução Humana, não existem na literatura internacional grandes trabalhos científicos demonstrando
a eficácia da vacina.
O também ginecologista Ricardo Baruffi reforça que o último guia de investigação de
aborto recorrente publicado
pelo periódico científico "Human Reproduction" disse que o
tratamento não oferece nenhum benefício comprovado.
Ainda assim, a maioria dos
médicos que trabalha com reprodução assistida indica a vacina, quando descartadas as
outras possíveis causas de
aborto recorrente.
Em casos de FIVs frustradas,
Dzik é contra o uso da vacina.
"O crossmatch feito para constatar [a causa imunológica] é
sempre negativo no casal que
nunca engravidou. Então não
há razão para a vacina."
O urologista Edson Borges
compartilha a mesma opinião.
Ele avalia que a vacina possa
ser uma boa alternativa para
abortos de repetição até a 10ª
semana, mas descarta seu uso
na FIV. "Cada vez mais estamos convencidos de que as falhas de implantação [do embrião] ocorrem por falhas genéticas dos gametas."
O ginecologista Eduardo
Motta diz que é comum ele receber casais acima de 40 anos
interessados na vacina quando,
na realidade, o problema da
não-gravidez é a insuficiência
ovariana da mulher.
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