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Fila para tirar passaporte dura até 13 horas
Proximidade das férias e baixa do dólar contribuíram para aumentar a demanda; lugar na fila pode custar até R$ 500
Na sede da PF em São Paulo, 600 senhas começam a ser distribuídas a partir das 8h, mas os primeiros candidatos chegam na noite anterior
PAULO SAMPAIO
DA REPORTAGEM LOCAL
Com os olhos inchados de sono, as irmãs Mariana e Daniela
Pascowitch, de 24 e 21 anos,
moradoras do Morumbi (zona
sul de SP), descem de um Toyota Corolla em frente à Polícia
Federal, na Lapa (zona oeste),
para uma experiência inédita:
pegar a fila do passaporte.
Às 7h, há cerca de 300 pessoas no local, mas as duas entram bem perto do início da fila. Conseguiram um bom lugar
porque o motorista delas, João
Gorga, 55, está na fila desde as
4h45. Por sua vez, Gorga rendeu um rapaz que chegou no
começo da madrugada. "Não
sei quanto custou, meu pai que
pagou o cara", diz Mariana.
Esse foi o meio que as duas
arranjaram para driblar a espera de até 13 horas imposta a
quem precisa tirar o documento. Com a proximidade das férias escolares e a baixa do dólar,
a situação só piorou.
Além da fila do lado de fora, o
candidato ao passaporte ainda
enfrenta outra espera dentro
da PF, com a senha na mão.
Como são distribuídas 600
senhas por dia, o último pode
esperar até cinco horas. "Nossa
estimativa é que se atendam 50
pessoas por hora. Então, se você ocupa o 150º lugar na fila,
nós o orientamos a pegar a senha e voltar três horas mais tarde", explica o assessor de comunicação, delegado Humberto Prisco Neto.
Com o novo modelo de passaporte, que tem ao menos 16
itens de segurança, o processamento do documento é três vezes mais lento. Mas, para o delegado, não há necessidade de
chegar de madrugada. "A pessoa pode vir por volta das 7h30,
pegar a senha e voltar depois."
"Estou voltando pela terceira
vez", diz a estudante Chayene
Pimenta, 25, às 5h de ontem.
"Vim quinta, às 4h, achando
que teria pouca gente por causa
do feriado, e a fila tinha 400
pessoas", conta.
Com a aproximação das 8h,
quando se abrem os portões, a
fila vai "inchando" -há gente
paga para guardar o lugar para
mais de uma pessoa. "Quando
cheguei eram 3h30 e eu contei
35 pessoas na minha frente.
Agora são 56", diz a modelista
Cibele Nogueira, 27, que foi
com o irmão, Joaquim Maurício, 25, por medo de ficar só.
O delegado Prisco diz que
guardar lugar na fila por dinheiro não é crime, e que fiscalizar o que acontece do lado de
fora da PF não é atribuição deles. Para Prisco, "não é um problema legal, mas comportamental". "Se tem gente que
vende lugar, é porque tem gente que compra, não é verdade?"
O primeiro da fila é o servente Josemas Pereira, 25, que
chegou ali às 19h do dia anterior, "para guardar lugar para
um tio". "A gente se ajuda muito na família", explica Pereira,
que é de Aliança, Pernambuco,
ganha salário mínimo e tem o
sonho de viajar para bem longe
de SP -de volta para Aliança.
O "tio" do servente chega
cerca de 30 minutos antes da
abertura do portão. De terno
cinza, gravata vermelha e dois
filhos, ele se recusa a falar com
a Folha. Diz, constrangido, que
Pereira guardou lugar para
seus filhos, não para ele.
Uma vaga na fila pode custar
R$ 100, R$ 300 e até R$ 500,
segundo apurou a Folha. Nem
todo mundo se envergonha de
dizer que comprou a vaga. A
norte-americana Deborah, que
está ali com os dois filhos, até
reclama porque a pessoa que
guardou seu lugar por R$ 100
pediu que ela chegasse às 5h.
"Imagina! Se eu tô pagando,
quero chegar às 7h", diz.
A publicitária Nina Farina,
45, que dorme no banco de trás
de sua minivan Mitsubishi, diz
que teve "dó" de mandar o motorista às 4h (ele foi mais tarde). Ela comprou a vaga por R$
300, "mas o cara vai nos acompanhar até lá dentro".
"Vim de táxi, olha a minha
cara de cansaço", diz Nina, que
mora no Jardim Europa.
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