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COMPORTAMENTO
Elas agora freqüentam a cena underground, fogem de "mauricinhos" e adotam visual mais "descolado"
Patricinhas passam por transformação e evoluem
PAULO SAMPAIO
DA REVISTA DA FOLHA
Tal como no desenho pokémon, a patricinha evoluiu. Mudou de figurino, de trilha sonora e
até de par na balada. "Agora misturo calça de terninho com tênis,
aprendi a gostar de música eletrônica de verdade, não a que toca
nas FMs, e não suporto mais sair
com playboyzinhos", diz Camila
de Salles, 23.
Também mudou de habitat: anda frequentando clubes "underground". Camila dá a entrevista
no Ampgalaxy, um clube que funciona no bairro paulistano de Pinheiros, no andar de baixo de
uma grife de modernos.
A neopatricinha -ou camilinha, nome mais de acordo com
essa geração- gosta de dizer que
ampliou seus horizontes, perdeu
os preconceitos e não freqüenta
mais apenas um grupo, o dos endinheirados. "Hoje eu aceito muito mais as pessoas, sou uma simpatizante com a vida", resume a
artista plástica Roberta Sobral, 26,
dançando na pista do D-Edge,
clube de música eletrônica da
Barra Funda, bairro paulistano
fora do eixo Jardins-Vila Olímpia.
O apego às grifes de luxo, dizem,
é menor. "Aprendi a me sentir segura sem usar marcas, é quase
uma psicanálise fashion", afirma
a estilista Fernanda de Goeye, 27,
que inaugurou com a amiga Paula
Raia, 26, sua própria loja, a Raia
de Goeye, depois de quatro anos
trabalhando na Daslu, loja de grifes da alta sociedade paulistana.
Atualmente namorando o empresário do ramo da gastronomia
Rogério Fasano, Fernanda recebe
a Revista usando o que ela define
como "uma roupa despretensiosa
e confortável": short-sarongue
curto de plush preto, camiseta de
malha verde-musgo e sapato alto
Gucci "velhérrimo".
Cansada da "massificação", ela
diz que foge dos rótulos, das combinações óbvias e dos programas
previsíveis. Na análise da própria
Fernanda, "a patricinha está mais
doida, mais livre, chutou o pau da
barraca". "Ela não faz mais linha,
não vai mais para a noite procurar
marido, e sim para se divertir, por
isso deixou de se policiar tanto."
Fernanda faz escola. "Fujo do
rótulo Daslu: procuro tudo o que
não tenha a cara da marca", diz a
publicitária Roberta Tilkian, 22.
Ela conta que "odiava" música
eletrônica, até que um dia foi levada por um grupo de amigas para
uma apresentação do DJ inglês
Carl Cox em um galpão no Rio.
"Entrei bonitona, de sandália alta Armani, achando que fosse estalar o dedo e me trariam uma caipirinha. Era um galpão enorme,
lotado, um calor dos infernos",
conta. Depois de subornar o barman para que ele a abastecesse a
noite inteira com água, ela relaxou: "Tirei minha sandália, dobrei a barra da calça e segui o "close your eyes and feel the music"
(feche os olhos e sinta a música)".
No novo ambiente, a camilinha
é facilmente reconhecível, dizem
os iniciados na cena eletrônica,
onde o ideal é fazer de conta que
ninguém está nem aí para nada.
"Algumas ficam gritando em
frente à cabine, como se estivessem em um show de rock, e o namorado assobia alto, no ritmo da
música. Quem já frequenta a noite há muito tempo estranha tanta
empolgação ou deslumbramento.
Mas a pista tem que ser democrática", afirma o DJ Luiz Pareto, 43.
O curador de arte Ricardo Oliveros, 39, "20 de pista", diz que
pensou até em escrever um manual de etiqueta da noite eletrônica. "Alguém deveria ensinar essas
meninas a se portar na pista. Elas
conversam, atendem celular, fumam e tomam uísque ao mesmo
tempo, queimando e molhando
quem está em volta."
Longe da antiga turma e querendo se jogar na noite eletrônica,
a camilinha se sente um pouco órfã de tribo. "Para as patricinhas, a
gente é esquisita; para o povo do
"underground", a gente é patricinha", reconhece a empresária Helena Linhares, 26, que também
abriu sua própria grife, a Pelu, diminutivo de peluqueria, ou cabeleireiro em espanhol.
Mas ela não reclama. Não pertencer a um grupo específico faz
parte da política pelo "fim dos
preconceitos" encampada pela
patricinha-pokémon. Seu maior
orgulho é justamente dizer que
transita livremente por turmas
que não se freqüentam, sinal de
estilo próprio e independência,
assim como a mistura de peças
"anônimas" com grifes e de informações de várias tribos -gays,
clubbers, bacaninhas e os nada-a-ver-com-os-outros.
Quanto mais avança no terreno
da cena eletrônica, mais a camilinha se orgulha da própria façanha. Lívia Grimberg, 23, conta
que era "completamente patizinha". Formada em economia, trabalhava de terninho escuro em
uma corretora do mercado financeiro, gostava de dance music e
freqüentava a bolsa de valores.
Convidada a ir a uma rave, resistiu um pouco, mas gostou tanto
que virou DJ: "O que eu mais gosto é dessa liberdade, cada um é o
que quer, sem julgamentos pela
aparência", diz a DJ.
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