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GILBERTO DIMENSTEIN
Quanto custa seu filho?
Um dos maiores disparates
sociais brasileiros, divulgado na semana passada, custa R$
7.000 por mês. Poucas cifras revelam com tanta precisão o desperdício de recursos públicos -e o
perigo das ruas.
Um estudo da Secretaria Nacional de Direitos Humanos informou que o custo para manter
uma criança ou adolescente infrator internado chega, em alguns
Estados, até a R$ 7.000 mensais.
Essa quantia seria suficiente para
manter um jovem em uma escola
de elite suíça.
O gasto médio no país, de acordo com o estudo, é de R$ 4.000,
aproximadamente quatro vezes o
valor de uma mensalidade nas
melhores escolas de ensino médio
do Brasil. Dinheiro que, muitas
vezes, é jogado fora. A taxa de
reincidência é alta e, pior, frequentemente a internação serve
de estágio de aperfeiçoamento
"profissional" no crime.
Um dispêndio de R$ 7.000 é
muito alto? A verdade dura de dizer e incômoda de ouvir é que
ainda é pouco para recuperar um
jovem contaminado pela delinquência.
Faça as contas.
Pais de classe média alta sabem
como sai caro tratar corretamente um filho com dificuldade de
aprendizado, mesmo suave: além
de mensalidade escolar, exigem-se professores particulares, psicólogos ou psicopedagogos. Levando em conta todas as despesas
educacionais -incluindo, por
exemplo, material didático, livros, aulas de inglês-, o gasto final ultrapassa R$ 3.000 mensais.
Se o adolescente tiver associados à deficiência de aprendizado
problemas de depressão ou decorrentes do consumo de drogas, demandando uma terapia mais intensa, o dispêndio facilmente
atingirá os R$ 4.000.
Existem mais valores embutidos nessa soma. Crianças e adolescentes de classe média desfrutam de museus, teatros, cinemas,
livros, exposições, o que, obviamente, não é de graça. Há também um valor inestimável e, claro, um dos mais importantes: o
apoio da família, que os ajuda a
desenvolver um projeto de vida.
Imagine, então, a dificuldade de
recuperar um jovem de baixa escolaridade, contaminado pelas
drogas, filho de uma família desestruturada, que vive em comunidades onde os traficantes são
heróis e os policiais são corruptos
e onde, além disso, impera o desemprego.
Vivemos numa sociedade que
já começa a exigir de faxineiros
um diploma de segundo grau (e
sem exagero) e que, ao mesmo
tempo, oferece a um professor
universitário em início de carreira menos de R$ 3.000 mensais.
Em contrapartida, um iniciante
no tráfico consegue faturar, por
mês, R$ 1.500 numa favela do Rio
de Janeiro ou de São Paulo.
A verdade -que, mais uma
vez, quase ninguém gosta de reconhecer- é que, exceções à parte,
não existem recursos suficientes
para recuperar adequadamente
jovens depois de determinado estágio de delinquência, tantos são
os focos a serem atacados ao mesmo tempo. A sociedade trata de
exterminá-los -seja pelo homicídio, seja pelas doenças- do jeito
mais "barato".
Dois dias depois da divulgação
do estudo da Secretaria Nacional
de Direitos Humanos, divulgou-se, com mais precisão, o tamanho
do problema. Um documento do
Unicef informou que, dos 21 milhões de jovens brasileiros de 12 a
17 anos, 8 milhões (38%) vivem
em áreas de risco.
Eis a matemática do terror infanto-juvenil: 1,3 milhão de jovens, entre aqueles 8 milhões, são
analfabetos ou semi-analfabetos;
3 milhões deles não estão na escola; 2 milhões, que estão na faixa
etária de dez a 14 anos, estudam e
trabalham; 3,2 milhões, com idades entre 15 e 17 anos, somente
trabalham. Aí estão os candidatos a viver na fronteira da irreversibilidade.
O tema da segurança encheu os
discursos de campanha nas últimas eleições. Mas, desde a vitória
de Lula, fala-se, basicamente, da
governabilidade política e econômica, e não da governabilidade
das ruas.
Como se viu com mais clareza
na semana passada, o interesse
está focado em quem adere ao novo governo (e no que ganha para
aderir), em quem vai comandar a
economia e em quais serão as estratégias macroeconômicas
-por aí, e não pelos discursos, é
que se mede a prioridade da elite.
Vigora a antiga lógica de que o
econômico está acima do social.
Até agora não se acenou com
uma só proposta para evitar que
um adolescente custe aos cofres
públicos R$ 7.000 por mês, não seja recuperado e ainda se torne
mais ameaçador.
P.S. - Virou esporte nacional na
elite intelectual ironizar Lula,
comparando o que ele defendia e
o que está fazendo. Melhor ele ser
incoerente com o passado, mas
coerente com um futuro de estabilidade, para evitar uma tragédia. Ainda desconfio, e muito, da
capacidade de Lula de resistir às
pressões sociais, de administrar
conflitos e de operar a máquina
governamental. Mas merece registro que, até aqui, ele vem desarmando habilmente os espíritos. A sorte dele é não haver na
oposição algo parecido com o PT.
E-mail - gdimen@uol.com.br
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