São Paulo, domingo, 16 de junho de 2002 |
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
RADIOLOGIA Área radiológica vive sucateamento, afirma especialista; crise pode causar doenças e erros de diagnóstico Aparelhos estão defasados no Brasil
CLÁUDIA COLLUCCI DA REPORTAGEM LOCAL Um bebê com pneumonia. Uma mulher com câncer de mama. Os dois procuraram médicos, foram submetidos a exames e não tiveram seus problemas diagnosticados precocemente por erros supostamente causados por equipamentos defasados ou sem manutenção. A situação dos aparelhos radiológicos e de diagnóstico de imagem no país é crítica e atinge as redes pública e privada, segundo avaliação de 12 médicos e físicos ouvidos pela Folha. Um levantamento do CBR (Colégio Brasileiro de Radiologia) aponta que metade dos mais de 40 mil equipamentos existentes no país está tecnologicamente defasada. Na rede pública, a defasagem chegaria a 80%. Na avaliação dos especialistas, pior que a defasagem tecnológica é a falta de manutenção dos equipamentos. Estudo realizado pela pesquisadora Ana Cecília de Azevedo, da Faculdade de Medicina da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), mostra que o Brasil desperdiça por ano cerca de 20% das chapas radiográficas devido a máquinas descalibradas. Segundo o físico em medicina Renato Dimenstein, 40, na maioria dos serviços de saúde, a manutenção preventiva, que deveria acontecer a cada dois meses, inexiste. "Só se faz a manutenção quando o aparelho quebra." Dimenstein, que realiza testes de controle de qualidade desses equipamentos para vários serviços de saúde, afirma que o principal problema verificado são aparelhos de raios X descalibrados, que liberam altas doses de radiação. A radiação excessiva pode, eventualmente, causar câncer, problemas nos órgãos sexuais e catarata. Segundo Rui de Andrade Dammenhain, 40, diretor técnico do CVS (Centro de Vigilância Sanitária), órgão responsável pela fiscalização dos equipamentos radiológicos, metade das autuações realizadas pelo órgão é referente a aparelhos clandestinos, ou seja, que funcionam sem licença do CVS. A cada ano, o CVS exige que os serviços de saúde apresentem laudos que comprovem que os equipamentos não oferecem riscos de radiação aos pacientes. Defasagem tecnológica O presidente do CBR, Aldemir Humberto Soares, afirma que a área radiológica brasileira vive um processo de sucateamento desde a desvalorização cambial, em janeiro de 1999. Como a maioria dos equipamentos é importada, a renovação regular teria deixado de acontecer desde então. O mesmo ocorreria, segundo ele, com as peças usadas na manutenção desses aparelhos. Soares afirma que apenas hospitais de ponta, como o Incor-HC (Instituto do Coração do Hospital das Clínicas de São Paulo), Einstein, Sírio Libanês, entre outros, estão conseguindo manter seu parque tecnológico permanentemente atualizado. Segundo ele, a vida útil dos equipamentos brasileiros, como tomógrafos e ressonâncias magnéticas, se estende por até 15 anos. Caso existisse uma boa manutenção, o limite poderia chegar a dez anos. Nos EUA, a vida útil desses aparelhos é de cinco anos. "A situação é seriíssima. Se a conjuntura econômica nacional mudasse, o que é improvável, seriam necessários oito anos para o Brasil voltar a oferecer condições razoáveis de atendimento à população", afirma Soares. Um aparelho de ressonância magnética custa em média US$ 1 milhão, enquanto um tomógrafo não sai por menos de US$ 500 mil. Segundo Soares, para piorar a situação, o setor privado está há seis anos sem ter os serviços reajustados pelo SUS (Sistema Único de Saúde) e pelos convênios médicos. Ele afirma que 70% do setor de radiologia está inadimplente. A maioria estaria recorrendo à compra de equipamentos de "segunda mão". "Manter o parque tecnológico atualizado não é um luxo, é uma necessidade. O diagnóstico depende muito disso", afirma Giovanni Guido Cerri, 48, diretor clínico do HC. Texto Anterior: Mortes Próximo Texto: Governo gastou R$ 2,2 bi em equipamentos Índice |
|