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Rapaz espancado em trote supera trauma e volta aos estudos
Ex-aluno da Uninove, Márcio Marques da Silva, 24, fez terapia e teve síndrome do pânico; agora, freqüenta outra universidade
Seis meses após agressão a socos e pontapés, polícia ainda não ouviu veteranos, que tiveram punição administrativa na faculdade
VINÍCIUS QUEIROZ GALVÃO
DA REPORTAGEM LOCAL
Seis meses depois de ser espancado num trote no primeiro
dia de aula, o estudante de publicidade e propaganda Márcio
Marques da Silva, 24, ainda vive
à sombra do medo. Teve síndrome do pânico, fez 15 sessões
de terapia e chegou a tomar algum ansiolítico de cujo nome
nem se lembra mais.
Só voltou a estudar nesta semana, por incentivo das irmãs.
E um semestre depois, a polícia
ainda não ouviu os agressores,
que tiveram punição administrativa -foram suspensos- na
Uninove, a faculdade que continuam a freqüentar.
Márcio, que não estuda mais
lá, conta que quatro veteranos
entraram na sala com spray para pintar os calouros. Ele diz ter
se recusado a participar do trote, já que não queria ter a roupa
suja porque iria trabalhar.
Ao tentar deixar a sala, afirma que foi empurrado por um
dos alunos e espancado por outros três com socos e pontapés
no rosto por cerca de três minutos. A agressão só acabou
quando foi puxado pelo braço
por um colega de classe.
Embora não traga sinais ou
cicatrizes da violência física
que sofreu, as seqüelas de Márcio são interiores. Hoje, ele não
é mais de sorrir. Vive inseguro,
olha constantemente para trás
e para baixo e -embora pareça
um rapaz forte, parrudo nos
72 kg de seu 1,72 m- acha que
está sempre sendo seguido.
"Fiquei mais cismado. Não
tenho mais aquela confiança de
chegar a um lugar e ficar à vontade. Olho para os quatro cantos, observo o movimento, vejo
se não tem nada de errado", diz.
Foi assim no primeiro dia de
volta às aulas na nova faculdade, na qual tem bolsa integral.
Ainda na estação do metrô, a
uma quadra do campus, ficou
de vigília, à distância, para se
certificar de que não havia trote. "Se tivesse, teria voltado para casa." Em vez da zombaria,
assistiu a uma aula magna dada
por um candidato à prefeitura.
Ansiedade
Depois da violência que sofreu, Márcio não quis mais estudar. "Só de pensar me dava
pânico. Ainda hoje fico assustado com qualquer concentração
grande de pessoas." Foi atendido por um psicólogo, que o levou a lugares de grande movimentação para conter a ansiedade. Seu maior medo é passar
novamente por aquela situação. A mãe, Nilza, era contra
que ele voltasse a estudar.
"Se mataram um na USP,
imagina o que fazem nessas faculdades particulares", diz ela,
ao se referir à morte do estudante de medicina Edison
Tsung Chi Hsueh, em 1999.
"Minha vida não podia ter
um estrago maior do que aquele que passei. Se ficasse em casa
seria pior. Já perdi muitas
oportunidades na vida por falta
de estudos", diz Márcio ao justificar a motivação que o fez
voltar à faculdade.
Das cenas de pancadaria, ele
diz lembrar "como um sonho
obscuro", do qual tem vagas recordações. Durante o espancamento, pôs as mãos sobre o rosto para amortecer os chutes.
Ainda assim teve cortes nos supercílios e coágulos na cabeça.
Outro lado
Em nota, a Uninove disse
"que no início de cada semestre
adota uma série de ações para
promover a conscientização, a
integração e as boas-vindas aos
calouros, de modo a resguardar
a integridade física de alunos,
professores e colaboradores".
Procurada pela Folha, a Secretaria da Segurança Pública
informou que o inquérito até
hoje não foi concluído porque o
23º DP (Perdizes) teve dificuldades para localizar os supostos agressores, já que Márcio
teria dado informações imprecisas sobre a identidade deles.
Segundo a polícia, os suspeitos foram intimados depois da
colaboração da universidade. O
primeiro depoimento estaria
marcado para o fim deste mês.
Hoje, Márcio sabe de cor o
que diria aos agressores, caso
se encontrasse novamente com
eles: "Vocês não têm noção das
conseqüências que aquilo trouxe para a minha vida". E sairia.
Sem bater neles.
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