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Testemunhas dizem que militares já haviam entregue outros jovens a inimigos
DENISE MENCHEN
DA SUCURSAL DO RIO
Mototaxistas que trabalham
ao lado da Companhia de Comando do Exército, na rua Santo Cristo, afirmaram ontem à
Folha que militares já tinham
levado dois moradores do morro da Providência para outra favela, há cerca de três meses.
Segundo eles, na ocasião, os
homens foram transportados
até um acesso da comunidade
Roquete Pinto, dominada por
uma milícia, depois de detidos
no quartel.
"Soltaram eles [sic] na avenida Brasil e mandaram correr
em direção à favela", disse o
mototaxista Ricardo Afonso
Aída, 40. "Eles foram correndo,
e, quando viram que a viatura
tinha ido embora, deram meia
volta. Por sorte não foram pegos." Segundo o mototaxista, os
dois homens são conhecidos
pelos apelidos Noveleiro e Batata. A Folha não conseguiu localizá-los ontem.
Com ponto fixo na rua Santo
Cristo, ao lado de um dos portões de acesso ao quartel, os
mototaxistas disseram que era
comum os militares aparecerem no local com moradores da
Providência. "Eles vêm para cá,
dão um chá de cansaço [nos
moradores] e depois liberam",
disse Raimundo Luiz Nery da
Costa, 33, que trabalha no local
há pouco mais de quatro anos.
Costa e alguns colegas que
trabalhavam no último sábado
disseram ter visto a chegada do
jipe com os três jovens mortos
na Mineira, por volta das 10h.
"Nós vimos os rapazes tranqüilos dentro do carro. Quando
eles passaram, a gente ainda
brincou com eles, e eles acenaram para nós", disse. "Eles
achavam que iam ser liberados,
como geralmente acontece."
Aída disse que, logo que reconheceu Wellington Gonzaga da
Costa Ferreira, 19, o Negão, ligou para a mãe dele, que trabalha na Vila Olímpica da Gamboa, nas proximidades. Segundo ele, Lilian Gonzaga da Costa, conhecida como Teca, chegou ao local em cinco minutos.
"Os meninos estavam agachados no chão perto da entrada,
mas logo eles [os militares] colocaram um carro atravessado
tapando a nossa visão", disse.
Nery afirmou que, cerca de
meia hora depois, conseguiu
ver os jovens sendo colocados
em um caminhão do Exército.
Questionados pela mãe para
onde iriam levá-los, os militares teriam dito que iam para a
4ª DP. Segundo os mototaxistas, o veículo deixou o quartel
pela rua Cidade de Lima.
"Sempre que trazem alguém,
eles entram e saem por aqui
[pela rua Santo Cristo]. Dessa
vez, saíram lá por trás", disse
Nery. "Se a intenção era liberar
os garotos, por que não deram
na mão da mãe dele, que estava
aqui?", questionou.
Enquanto Lilian se dirigia
para a delegacia, o caminhão
foi para o morro da Mineira,
dominado pela facção ADA
(Amigo dos Amigos), rival do
Comando Vermelho, que controla a Providência. Moradores
da favela confirmaram ter visto
a chegada do caminhão do
Exército na manhã de sábado.
"Vi seis militares carregando
os moleques", contou um morador que pediu anonimato.
Segundo ele, cerca de 30 bandidos receberam os jovens, que
foram agredidos com socos,
chutes e pauladas. "Foi uma covardia o que fizeram com eles."
A entrega ocorreu na área conhecida como Chácara, perto
da base do morro. Um dos jovens teria tentado fugir, mas
foi capturado. Os bandidos deram um tiro para o alto antes
de levá-los para o alto do morro, onde estava o chefe do tráfico, dizem testemunhas.
"O comentário é que o chefe
não ficou satisfeito com o que
aconteceu", disse um morador,
que também não se identificou.
"Quando o patrão chegou, um
já estava morto", afirmou.
O Exército não se manifestou a respeito das acusações
dos mototaxistas.
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