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EDUCAÇÃO
Educadores culpam a progressão continuada
Pesquisa aponta altos índices de analfabetismo em Guará (SP)
ROGÉRIO PAGNAN
DA FOLHA RIBEIRÃO
C.A.F.S., 13, está na sétima série,
mas não sabe ler. Não é capaz de
decifrar uma simples frase escrita
na lousa pela professora de uma
escola pública de Guará (a 400 km
ao norte de São Paulo). Por isso,
diz que tem vergonha. "Acabo
sempre chorando. Todos os dias",
explica, ao contar que seus colegas de classe riem dela por causa
da deficiência.
Ela é apenas um dos mais de
1.300 alunos da rede oficial de ensino da cidade que têm dificuldade de leitura. Pesquisa da Secretaria da Educação de Guará mostrou que 63% dos 2.068 alunos de
1ª a 8ª série do ensino fundamental público quase não sabem ler.
A secretaria fez um prova, no
mês passado, com os alunos de
cinco escolas estaduais herdadas
pela prefeitura no final de 2001.
Questionários com perguntas de
português e matemática, semelhantes ao que o governo aplica
com o Saresp (Sistema de Avaliação de Rendimento Escolar do
Estado de São Paulo), foram distribuídos para os estudantes.
Dos 2.068, cerca de 1.300 tiveram notas inferiores a quatro. Dos
restantes, 28% conseguiram avaliações entre cinco e sete e apenas
9%, acima de oito.
As respostas assustaram os professores: muitos estudantes, além
de não saberem ler, ignoram a capital do país. Nem à famosa pergunta -"quem descobriu o Brasil?"- souberam responder.
O pior: a conclusão dos educadores de Guará é que essa realidade não se restringe apenas à cidade, mas está presente em todo o
Estado de São Paulo.
É que eles avaliam que o problema de Guará é fruto da progressão continuada. Para os educadores, esse sistema retirou dos alunos o estímulo de estudar.
"Isso [o fato de alunos não saberem ler" é consequência da progressão continuada. O mau aluno
sabe que não vão exigir nada dele,
que não vai ser reprovado", afirmou Walter Colombini, diretor
da Udemo (Sindicato de Especialistas de Educação do Magistério
Oficial do Estado de São Paulo) de
Ribeirão Preto.
A progressão continuada é o
sistema adotado pelo governo
Mário Covas (PSDB) em 1998,
que elimina a reprovação do aluno em todo o Estado. Ele recebe
reforço durante o ano das matérias que tiver dificuldade.
"Não ficamos surpresos com o
resultado. Isso já era esperado. Fizemos o levantamento apenas para dimensionar o problema e estudar medidas concretas para solucioná-lo", afirmou a secretária
da Educação de Guará, Dorcelina
Helena Nogueira Furtado, a Doce.
De acordo com ela, o levantamento deverá nortear um trabalho em
implantação que visa resolver o
problema.
Uma outra conclusão dos educadores é que a vergonha sentida
por C.A.F.S. só atrapalha.
Eles acreditam que as autoridades precisam arrumar uma maneira de incentivar alunos como
ela. Uma opção talvez seja o projeto de ensino em período integral, implantado em uma das escolas de Guará.
Doce disse que um novo levantamento, com algumas modificações, será feito com os alunos, como deixar o professor de cada
classe aplicar as provas.
"A presença da "tia" na sala de
aula, até o timbre de sua voz, traz
uma confiança para os alunos. Ela
não ajuda nas soluções, mas influencia", afirmou ela.
Para os professores, a secretaria
afirma que está realizando cursos
de capacitação. "Estamos também acompanhando de perto o
magistério para melhorar a qualidade do profissional."
A Secretaria de Estado da Educação afirmou que o secretário
Gabriel Chalita não comentaria o
assunto porque desconhecia a
pesquisa realizada em Guará.
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